Foto: Thaís Grechi
Um experimento de linguagem nada
vazio
“Vazio é o que não falta, Miranda” é uma experiência de linguagem teatral produzida
pelo Grupo Teatro Inominável que estreou em 2010. Dirigido por Diogo Liberano,
o espetáculo se apresenta como uma “tentativa”, o que reforça positivamente o
seu caráter de experimento. Em cena, Adassa Martins, Carolina Helena, Flávia
Naves e Natássia Vello apresentam o resultado de um trabalho visível e
propositalmente em processo e que só pode ser julgado como tal.
A
ideia do processo surgiu como uma representação de um outro processo: o de
construção do espetáculo “Esperando Godot”, de Samuel Beckett. O resultado
parece querer ser uma obra paralela não apenas no aspecto formal, mas também na
ordem do seu conteúdo (Miranda sendo uma versão de Godot), o que não acontece. Beckett atualiza a tragédia, uma vez
grega e outra vez clássica, para o drama contemporâneo do pós-segunda guerra. Há
quem diga que ele escreve uma versão própria do teatro do absurdo, há quem escreva
que ele cria o teatro adramático. O fato é que o contexto do dramaturgo irlandês
mais celebrado do século XX é a tragédia, ou seja, a prisão. Na Grécia, presos
ao destino divino; no classicismo, presos aos padrões burgueses, os personagens
de Beckett, no século passado, sobretudo em “Esperando Godot”, estão presos ao
tempo que insiste em passar. É dessa incapacidade de lutar contra isso que vêm
os diálogos quase dissociáveis, o superficial esvaziamento do sentido, a
fluidez plena da narrativa que, para alguns, é a marca de uma não-narrativa. Para
quem não leu o programa de “Vazio é o que não falta, Miranda”, as cenas
iniciais do espetáculo aqui em questão se aproximam desse universo nonsense. A
intenção, no entanto, não tem continuidade na evolução das cenas (e a palavra “evolução”,
em relação a Beckett, já prenuncia um distanciamento). Quando, para o
espectador, começa a ficar claro que tratam-se de atrizes em processo de ensaio
e que há um diretor a fazer anotações (quase um espetáculo a parte, como em Tadeusz Kantor ), controlar
o desenho de luz e as entradas das trilhas sonoras, além de fazer alterações no
roteiro, ou seja, que tudo tem uma lógica que consiste justamente na busca/fuga
de sentido, então, cai por terra o interesse sobre o experimento de produzir
algo naturalmente sem sentido. Em cena, estamos assistindo a um ensaio marcado,
ou melhor, a uma apresentação que tem como resultado de opções estéticas marcas
que o fazem parecer um ensaio.
A
cena em que conflitos surgem entre as atrizes levanta a curva dramática
e aponta para um clímax. Depois, uma sequência em que os atores participam de
uma entrevista sobre “Esperando Godot”, novamente, mexe na narrativa e prepara
para um fim. No entanto, de forma negativa, o encerramento demora mais tempo do
que deveria para chegar sem perder o ritmo. 90 minutos de inconstância é
fatalmente tempo demais para um exercício de linguagem, apesar das ótimas participações
das quatro atrizes e também do diretor, um ator em cena.
Toda
“peça contemporânea” tem: a) um microfone no pedestal que será usado para os
atores se dirigirem diretamente ao público; b) um ou mais momentos em que os
atores se dirigem diretamente ao público; c) personagens cujos nomes são idênticos
aos nomes dos atores que os interpretam; d) um violão, uma flauta, um piano ou
um instrumento musical qualquer e um ou mais momentos em que um ou mais atores
tocam uma canção em outra língua que não a vernácula; e e) projeções em vídeo. O mérito estético
claramente observável de “Vazio é o que não falta, Miranda” é o fato de não ter
todas essas marcas negativamente fortes no teatro que se diz contemporâneo,
apesar das atrizes se chamarem pelos seus segundos nomes ou sobrenomes, o que
poderia ser qualificado como uma variação do vício, e ter, sim, momentos em que as atrizes compartilham da participação do público. Fica, por fim, o louvável
interesse em apresentar uma pesquisa, em mostrar o trabalho que vem à cena, com
os devidos aplausos, de forma digna e, principalmente, mais séria do que
parece.
*
Ficha técnica:
Direção e Dramaturgia: Diogo Liberano
Elenco: Adassa
Martins, Caroline Helena, Flávia Naves e Natássia Vello
Assistência de direção: Thaís Barros
Cenário: Rafael Medeiros
Figurinos e visagismo: Adassa Martins e Natássia Vello
Iluminação: Diogo Liberano e Flávia Naves
Direção musical: Philippe Baptiste
Direção de movimento: Dan Marins
Preparação vocal: Verônica Machado
Registro audiovisual e fotográfico: Thaís Grechi
Design: Diogo Liberano
Assessoria de imprensa: Carolina Calcavecchia
Marketing cultural: Davi Palmeira
Produção executiva: Dan Marins
Direção de produção: Caroline Helena e Diogo Liberano
Assistência de direção: Thaís Barros
Cenário: Rafael Medeiros
Figurinos e visagismo: Adassa Martins e Natássia Vello
Iluminação: Diogo Liberano e Flávia Naves
Direção musical: Philippe Baptiste
Direção de movimento: Dan Marins
Preparação vocal: Verônica Machado
Registro audiovisual e fotográfico: Thaís Grechi
Design: Diogo Liberano
Assessoria de imprensa: Carolina Calcavecchia
Marketing cultural: Davi Palmeira
Produção executiva: Dan Marins
Direção de produção: Caroline Helena e Diogo Liberano
Realização:
Teatro Inominável e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
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