terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Retrospectiva teatral 2016: os melhores do ano no Rio de Janeiro



Os melhores de 2016 no teatro carioca

Ao fim do ano, valorizam-se momentos de revisão. Abaixo, uma avaliação das melhores interpretações femininas, masculinas, das melhores direções e dos melhores espetáculos de 2016 na programação teatral carioca.

As melhores atrizes
Nesse ano, pelas melhores interpretações femininas, receberam destaque por suas colaborações em papeis protagonistas as atrizes: Adassa Martins, por “Se eu fosse Iracema”; Aline Fanju, por “Decadência”; Bárbara Paz, por “Gata em telhado de zinco quente”; Bianca Byinton, por “A reunificação das duas Coreias”; Bianca Tadini, por “Cinderella”; Bruna Scavuzzi, por “Curral Grande”; Carolina Ferman, por “um nome para romeu e julieta”; Christiane Torloni, por “Master Class”; Claudia Mauro, por “A vida passou por aqui”; Débora Lamm, por “Fatal”; Denise Fraga, por “Galileu Galilei”; Eliane Costa, por “Lucrécia”; Ester Jablonski, por “O campo da mulher como corpo de batalha”; Fernanda Gabriela, por “Ordinary Days”; Grace Passô, por “Vaga carne”; Helena Varvaki, por “A outra casa”; Julia Lund, por “Amor em dois atos”; Kakau Gomes, por “Love Story – O musical”; Laila Garin, por “Gota d’água – [a seco]”; Leila Savary, por “Tudo o que há flora”; Letícia Spiller, por "Dorotéia"; Letícia Persiles, por “Garota de Ipanema - O amor é bossa”; Miriam Freeland, por “Casa de Bonecas”; Nadia Bambirra, por “Antes do café”; Nara Keiserman, por “Como era bonito lá”; Nathália Timberg, por “33 Variações”; Patrícia Selonk, por “Inútil a chuva”; Rita Elmôr, por “Clarice Lispector & eu – o mundo não é chato”; Rita Fischer, por “Imagina esse palco que se mexe”; Rosamaria Murtinho, por “Dorotéia”; Suzana Nascimento, por “Alice mandou um beijo”; Suzana Faini, por “O como e o porquê”; Teuda Bara, por “Nós”; Totia Meirelles, por “Cinderella”; Vilma Melo, por “Chica da Silva – O musical”; e Virgínia Cavendish, por “Nós não vamos pagar”.

Por suas colaborações em papeis coadjuvantes, receberam destaques as seguintes atrizes: Andressa Lameu, por “Inútil a chuva”; Anna Machado, por “Dorotéia”; Carol Loback, por “O último lutador”; Claudia Ventura, por “A cuíca do Laurindo”; Debora Bloch, por “Os realistas”; Dida Camero, por “Dorotéia”; Elisa Pinheiro, por “Nós não vamos pagar”; Isabel Chavarri, por “Rival Rebolado”; Jojo Rodrigues, por “Quatro janelas para o paraíso”; Lu Grimaldi, por “33 variações”; Luciana Bollina, por “Garota de Ipanema - O amor é bossa”; Morena Cattoni, por “um nome para romeu e julieta”; Noemi Marinho, por “Gata em telhado de zinco quente”; Rebecca Leão, por “Shopping and Fucking”; Sabrina Korgut, por “Meu amigo, Charlie Brown”; e Vivian Sobrino, por "Alice mandou um beijo".

Os melhores atores
As interpretações masculinas, em papeis protagonistas, tiveram grande destaque nos trabalhos dos seguintes atores: Anderson Cunha, por “Sucesso”; André Rosa, por “Terra Papagalli”; Bruno Narchi, por “Cinderella”; Daniel Archangelo, por "Papai está na Atlântida"; Daniel Dias da Silva, por “Esse vazio”; Diogo Liberano, por “um nome para romeu e julieta”; Édio Nunes, por “A vida passou por aqui”, Eduardo Mossri, por ”Cartas libanesas”; Erom Cordeiro, por “Decadência”; Felipe de Carolis, por “Céus”; Felipe Frazão, por “Terra Papagalli”; Gustavo Falcão, por “Esse vazio”; Isio Ghelman, por “Até o final da noite”; João Pedro Zappa, por “Guia afetivo da periferia”; Kiko Mascarenhas, por “O camareiro”; Leonardo Hinckel, por “Inútil a chuva”; Lucas Drumond, por “Tudo o que há Flora”; Luciano Chirolli, por “Memórias de Adriano”; Marcelo Valle, por “A reunificação das duas Coreias”; Marcos Caruso, por “O escândalo Philippe Dussaert”; Marcos Veras, por “Acorda pra cuspir”; Nilton Bicudo, por “Myrna sou eu”; Otávio Augusto, por “A tropa”; Otto Jr., por “Amor em dois atos”; Ricardo Gonçalves, por "Papai está na Atlântida"; Ricardo Kosovksi, por “Boa noite, professor”; Roberto Bomtempo, por “Casa de Bonecas”; Roberto Rodrigues, por “Se vivêssemos em um lugar normal”; Rodolfo Vaz, por “O capote”; Ruy Brissac, por “O musical Mamonas; Stênio Garcia, por “O último lutador”; Tarcísio Meira, por “O camareiro”; Thiago Marinho, por “Tudo o que há Flora”; e Zécarlos Machado, por “Gata em telhado de zinco quente”.

Por suas ótimas colaborações em papeis coadjuvantes, vale os destaques também a Ary França, por “Galileu Galilei”; Bernando Berro, por “O musical Mamonas; Bruno Sigrist, por “Cinderella”; Charles Fricks, por “Céus”; Cláudio Galvan, por "Garota de Ipanema - O amor é bossa"; Felipe Ávlis, por “Shopping and fucking”; Felipe Porto, por “Quatro janelas para o paraíso”, Fernando Eiras, por ”Os realistas”; Hugo Germano, por “A cuíca do Laurindo”; Lucas Lacerda, por “Curral Grande”; Lourival Prudêncio, por “Medida por medida”; Marcelo Magano, por “Cidade Correria”; Marcos Nauer, por “O último lutador”; Marcos Suchara, por “Medida por medida”; Mario Terra, por “Sobra”; Mateus Ribeiro, por “Meu amigo, Charlie Brown”; Tomás Braune, por “Inútil a chuva”; Patrick Amstalden, por “O musical Mamonas; Pedro Monteiro, por “Sucesso”; Rodrigo Pandolfo, por “Céus”; e a Wolf Maya, por "33 variações".

Todo o elenco de “Auê” e de “Gilberto Gil, Aquele abraço – O musical” apresentaram excelentes trabalhos!

Os melhores diretores
Como melhores diretores do ano, valem citar: Adriana Schneider e Lucas Oradovschi, por “Cidade correria”; Alice Borges, por “A vida passou por aqui”; César Baptista, por “Roleta-russa”; Charles Moeller, por “Cinderella”; Cibele Forjaz, por “Galileu Galilei”; Cristina Moura, por “Nu de botas”; Dani Lossant, por “um nome para romeu e julieta”; Daniel Herz, por “Tudo o que há Flora”; Demétrio Nicolou, por “Como era bonito lá”; Diana Herzog, por “Nora”; Duda Maia, por “Auê”; Eduardo Machado, por “Curral Grande”; Eduardo Tolentino de Araujo, por “Gata em telhado de zinco quente”; Fernando Philbert, por “O escândalo Philippe Dussaert”; Fernando Nicolau, por “Se eu fosse Iracema”; Grace Passô, por “Vaga carne”; Guilherme Leme Garcia, por “Fatal”; Guilherme Delgado, por "Papai está na Atlântida"; Guilherme Weber, por “Os realistas”; Gustavo Gasparani, por “Gilberto Gil, Aquele abraço – O musical”; Inez Viana, por “Nós não vamos pagar” e por “Os inadequados”; João Fonseca, por “A reunificação das duas Coreias”; Jopa Moraes, por “Shopping and fucking”; Jorge Farjalla, por “Doroteia” e por “Antes do café”; Luiz Felipe Reis, por “Amor em dois atos”; Márcio Abreu, por “Nós”; Marcus Faustini, por “Guia afetivo da periferia”; Moacir Chaves, por Imagina esse palco que se mexe”; Paulo de Moraes, por “Inútil a chuva” e por “O como e o porquê”; Rafael Gomes, por “Gota d’água – [a seco]”; Reiner Tenente, por “Ordinay days”; Roberto Bomtempo e Symone Strobel, por “Casa de bonecas”; Roberto Rodrigues, por “Se vivêssemos em um lugar normal”; Rodrigo Portella, por “Alice mandou um beijo”; Ron Daniels, por “Medida por Medida”; Ulisses Cruz, por “O camareiro”; Victor Garcia Peralta, por “Decadência”; Wolf Maia, por “33 variações”; e de Yara de Novaes, por “O capote”.

Os melhores espetáculos
Considerando todos os aspectos, além das interpretações e da direção citadas, dentre os melhores espetáculos do ano, estiveram as produções: “33 variações”, “A reunificação das duas Coreias”, “A vida passou por aqui”, “Antes do café”, “Auê”, “Casa de bonecas”, “Cidade correria”, “Decadência”, “Doroteia”, “Galileu Galilei”, “Gota d’água – [a seco]”, “Guia afetivo da periferia”, “Inútil a chuva”, “Nós”, “O camareiro”, “O escândalo Philippe Dussaert”, “Os realistas”, “Se vivêssemos em um lugar normal” e “Tudo o que há Flora”.

Um 2016 que respinga em 2017
Ouve-se falar muito bem de “60! Década de Arromba – Doc Musical”, de Frederico Reder; “Cabeça Dinossauro”, de Felipe Vidal; “Gritos”, da Companhia Dos à Deux; e de “Leite derramado”, de Roberto Alvim; que estrearam no fim do ano e devem voltar nesse início de janeiro de 2017.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

Eu, que estou à espera (RJ)

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Foto: divulgação





Performance cheia de afeto!

“Eu, que estou à espera” é uma interessantíssima performance que, durante as duas últimas semanas de novembro, aconteceu na Comuna, restaurante/bar que fica em Botafogo, na zona sul do Rio de Janeiro. Idealizado por Anna Costa e Silva, o projeto se deu através de um convite da Casamata, a galeria de arte que fica dentro do estabelecimento. Ele consistia no seguinte: ao entrar no local, o visitante encontra um entre vários bilhetes espalhados. Nele há um texto, uma pequena mensagem particular escrita (não assinada) por performer e que é dirigida ao desconhecido que encontrá-la sem querer. Depois de lê-la, conforme as instruções contidas nela, deve-se procurar por seu autor que estaria, em lugar marcado, à sua espera. Catharina Caiado, Flora Diegues, Luciana Novak e Zé Azul foram os performers nessa primeira edição. Essa análise diz respeito à participação da proposta com Zé Azul. Tomara que o projeto retorne logo para mais pessoas poderem curti-lo pela primeira ou por várias outras vezes.

Critérios para análise dessa performance
O primeiro critério de análise de uma performance diz respeito ao modo como ela pode fugir do estabelecimento dele. Por performance, entre vários conceitos cabeludos, se entende o tipo de proposta cênica (a palavra “espetáculo” não é boa aqui!) em que o espectador não consegue reconhecer exatamente o que é ator e o que é personagem. Essa dúvida perpassa vários outros níveis da relação, como o que está previsto e o que é improvisação, como quando começa e quando termina, quais os limites, quais os interesses, como quais possibilidades. Ela mantém o jogo e o que contorna toda a reflexão que está por trás do modo como o teatro se espalha por todas as dimensões sociais e humanas além das artísticas vivas e também como, por outro lado, pode ainda o teatr permanecer essencial. 

Outro critério diz respeito ao jeito como a proposta se abre (ou pode se abrir) para todos os participantes. Há performances que só atendem ao interesse do seu realizador e ao seu ego (ou problemas com ele), permanecendo na reprodução da relação entre quem fala e quem escuta (quem manda e quem obedece) que o teatro tradicional faz muito bem. Há que se valorizar, porém, a performance em que não só o público não reconheça o limite entre o que é personagem e o que não é, mas aquela em que o performer também veja no público sua possibilidade de se tornar, ele próprio, o performer. Ou seja, são melhores, porque mais raras, as propostas em que a autoria seja compartilhada em um processo de alternância de papeis tal como acontece na vida.

Um outro terceiro critério, para se ficar em três, pode ser a conexão da proposta com seu entorno. De que modo ela se serve das contribuições semânticas do lugar onde ela acontece, do tempo em que ela se dá, da época em que é feita? De que maneira o projeto dialoga com as interrogações de sua contemporaneidade, essa um conceito subjetivo compartilhado por realizadores e por fruidores, ambos, como se disse no parágrafo anterior, misturados no meio do seu processo? As respostas a essas perguntas podem bem servir para analisar criticamente “Eu, que estou à espera”.

Zé Azul em excelente trabalho
Assim como o teatro não acabou com a chegada do cinema, o rádio com a chegada da televisão, o livro com a internet, os encontros reais continuarão existindo em tempos de “Black Mirror”. No entanto, talvez porque essas questões do mundo virtual e do outro andam muito acesas, é possível identificar que um bate papo cordial tem valores mais altos hoje em dia. Zé Azul manteve-se interessado, durante a proposta, em descobrir, em ouvir e em compartilhar histórias na troca de reflexões e de memórias que foram surgindo ora por seu próprio estímulo, ora por quem com ele conversava (no caso, eu). Essa disponibilidade teve a capacidade de preencher com afeto os males da sociedade brutal. Ela abre o coração, ressignifica os acontecimentos, estabelece novos pontos de vista e calibra a esperança. Ao longo do acontecimento, o encontro pareceu ser mais importante do que qualquer outra coisa, afastando a racionalidade do compromisso de modo que, por causa disso, talvez, os objetivos da proposta artística que aqui se analisa tenham sido plena e ricamente atingidos.

A lembrança de que se tratava de um arranjo estético previamente pensado não retirou do momento sua capacidade dela se redefinir ao longo da realização. Em outras palavras, apesar de contornos previstos, o andamento da proposta se manteve livre como uma zona rica de potencialidades. Sem hora para terminar, o contexto se estruturou a partir de si próprio, o que, em reflexão posterior, alerta para os méritos do conjunto. Enquanto público e performer se misturam, e se atravessam, a obra acontece mais do que propriamente se dá a ver. E isso é muito positivo em termos de análise.

Por fim, “Eu, que estou à espera” parece ter nascido de questionamentos contemporâneos, mas também visivelmente se volta para eles: o aqui, o agora e o hoje no todo de sua complexidade. A performance acontece em um bar, ou na rua em frente a ele, em lugar não propriamente teatral e que está impregnado por um sentido de relaxamento, de conforto e de prazer que é livre e despreocupado. Ela surge no fim da tarde, início da noite, quando a abertura para a alegria talvez seja maior entre os frequentadores. E se dá em um momento de vozes turvas, essas ofuscadas muitas vezes pela necessidade de se auto-afirmar através de um avatar em redes sociais virtuais, de se justificar e de se manter relações diferentes através delas nas quais o encontro atual ainda vale a pena. Tudo isso, mais uma vez, chama a atenção para os méritos do trabalho.

Foi ótimo encontrar uma proposta assim na agenda carioca! Que venham novas oportunidades!

*

Ficha técnica:
Idealização: Anna Costa e Silva
Performers: Catharina Caiado, Flora Diegues, Luciana Novak e Zé Azul

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

Meu amigo, Charlie Brown (SP)

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Foto: divulgação



Douglas Tholedo, Ester Elias, Leandro Luna, Tiago Abravanel, Sabrina Korgut e Mateus Ribeiro

Possíveis motivos para o bom não ser excelente


O bom “Meu amigo, Charlie Brown – Um musical da Broadway” podia ser excelente, mas não é. Ele estreou em março de 2016 em São Paulo e, durante outubro e novembro, cumpriu temporada no Teatro Bradesco, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro. Trata-se da versão brasileira do original de Clark Gesner com colaboração de Andrew Lippa aqui assinada por Mariana Elisabetsky. A história traz os personagens da turma de Charlie Brown (“Peanuts”, que no Brasil foi traduzido como “Minduim”), célebre personagem de quadrinhos do chargista americano Charles M. Schulz (1922-2000). Leandro Luna (no papel título), Tiago Abravanel (Snoopy), Ester Elias (Sally Brown) e Guilherme Magon (Schroeder) estão no elenco ao lado de Sabrina Korgut (Lucy) e Mateus Ribeiro (Linos), esses últimos em vibrantes destaques. Dirigido por Alonso Barros, o espetáculo parece não lidar bem com um palco muito grande e, se eximindo de mais largos investimentos em cenários e em figurinos, joga muita responsabilidade para cima do texto, das interpretações e do que o público pode saber do contexto original. Isso resulta em perigosos desequilíbrios que prejudicam o todo infelizmente. Uma nova montagem com elenco todo constituído por crianças está por vir em 2017. Vale a pena esperar por ela.

Ótima versão de Mariana Elisabetsky
“You`re a good man, Charlie Brown” foi um enorme sucesso na Off-Broadway no fim dos anos 60. Com texto, letras e músicas de Clark Gesner (1938-2002), a peça estreou em 1967 e ficou em cartaz por quatro anos até 1971, quando, em nova produção, foi levada com pompa e circunstância para a Broadway. Lá, porém, foi um grandioso fracasso, se mantendo em cartaz por apenas 32 apresentações. Em 1999, com algumas músicas e arranjos novos de Andrew Lippa, houve uma remontagem na Broadway com péssimo resultado também. Naquele ano, a produção recebeu indicações ao Tony de Melhor Remontagem e de Melhor Direção (Michael Mayer) e os troféus de Melhor Ator Coadjuvante (Roger Bart/Snoopy) e de Melhor Atriz Coadjuvante para Kristin Chenoweth (Sally Brown), mas o público não deu a menor bola pra isso e a peça saiu de cartaz depois de 149 apresentações, não mais que seis meses desde a estreia. O que a crítica disse dessa versão pode também valer para a produção nacional da peça que aqui se analisa. “You`re a good man, Charlie Brown” foi feito para palco pequeno e para público reduzido e, se quiser ter sucesso hoje em dia, precisa entender que os personagens hoje têm que estabelecer novas relações com a plateia.

De 1950, quando Charlie Brown apareceu, até agora, os personagens da série já viraram livros, músicas, peças de teatro, filmes, programas de televisão, parques de diversões, roupas, etc. Com traços simples, limpos e fáceis de ver, ela trazia diálogos curtos, mas com alguma profundidade, inspirando gerações em todos os cantos do mundo desde então. Seus personagens são crianças muito pequenas, descobrindo a vida e fazendo reflexões sobre o que veem, o que sentem, seus sonhos, frustrações, tristezas e alegrias. Tudo isso revelava um ponto de vista sobre a infância que não tinha nada a ver com o ideal colorido e imaculado que correntemente se espalhava da primeira idade. Entre outras coisas, a obra de Charles M. Schulz fazia ver (e faz!) que, em todo adulto, ainda há crianças e que, em toda a criança, há uma guerra contra diversas dificuldades que é similar a que há nos adultos.

O problema está na transformação disso para uma narrativa longa. A dramaturgia de “Meu amigo, Charlie Brown” se constrói a partir de uma justaposição de pequenos quadros, que remetem, em termos de ritmo, às tirinhas originais. No todo de noventa minutos, ela não tem uma curva dramática tradicional que narre uma história completa com início, meio e fim. Seus quadros funcionam em separado, cada um procurando atingir a máxima potência, deixando para o público o mérito pela sensação de unidade. O sentimento de fracasso de Charlie Brown (Leandro Luna), a grossura de sua irmã Sally Brown (Ester Elias), o autoritarismo de sua amiga Lucy (Sabrina Korgut), a determinação do irmão dela Linus (Mateus Ribeiro), a introspecção do amigo pianista Schoroeder (Guilherme Magon) e a falta de conexão com a realidade do cachorro Snoopy (Tiago Abravanel) são vistos como positivos e como negativos ao mesmo tempo em uma bela abordagem complexa da vida, do mundo e das relações. Todos esses personagens, em determinado momento, assumem o protagonismo das histórias de maneira que, no geral, eles se tornam símbolos de diversas dimensões do mundo.

Nesse sentido, o problema da montagem não está na dramaturgia, mas no modo como a encenação se apresenta hoje. No Brasil, a versão brasileira de Mariana Elisabetsky (mesma responsável pelo maxi mega ultra excelente “Wicked”) é ótima porque as palavras originais aterrissam no nosso idioma com aparente fluidez e com muita beleza. A primeira montagem de 2010, que venceu o Prêmio Coca Cola, além de Luna no papel título, tinha Elisabetsky interpretando Sally Brown, Paula Capovilla como Lucy, Felipe Caczan era Schroeder, Thiago Machado como Lino e Frederico Silveira era Snoopy.

Quais, então, são as questões que não tornam “Meu amigo, Charlie Brown” de bom para excelente?

Os problemas na encenação dirigida por Alonso Barros
Quando o musical reestreou na Broadway no fim dos anos 90, o mundo já estava tomado de imagens muito mais interessantes que Charlie Brown. De “Mary Poppins” (1964) para “O Rei Leão” (1997) foi um grande caminho percorrido. Assim, os desafios mudaram de lugar, talvez aumentaram. Não se pode mais ver a tosquice de Shulz como um efeito da tirinha jornalística, essa feita para ser consumida diariamente, mas é preciso entendê-la como uma imposição. É como se seus desenhos dissessem: “Pare, respire, olhe para mim!” E, nesse intervalo de reflexão, o mundo se modifica. Em termos de tecnologia visual, as videoportraits de Bob Wilson, bem como toda a sua obra, têm essa proposta, para citar um exemplo.

Em segundo lugar, “Meu amigo, Charlie Brown” é um espetáculo para dois públicos simultâneos. As crianças olharão para as cores, os adultos são convidados à reflexão. Se se investe só no primeiro público, metade das possibilidades da proposta morrem e o que sobra fica debilitado.

Por fim, não é apenas no modo como a dramaturgia se constrói (por episódios independentes) que o conceito de musical se modifica, mas também pelos modos de sua produção. São apenas seis pessoas no elenco sem grandes trocas de cenário e de figurino e sem corpo de baile para encher os olhos daquele mesmo público que vai ver “Wicked” e “O fantasma da Ópera”. Ou seja, aquele não é um musical como esses: um palco menor e uma relação mais íntima com a plateia lhe faria melhor.

Dito isso, é possível encontrar os problemas na encenação de Alonso Barros. Os cenários de Chris Aizner e os figurinos de Jô Resende (a luz de Paulo César Medeiros quase não tem o que fazer nesse quadro.) meramente se preocupam em espantar o negro das cortinas, substituindo ele por adesivos coloridos. O palco, parecendo um enorme stand de feira comercial, abre inúmeros espaços vazios, exigindo que os atores e as músicas preencham o ambiente. A Broadway já fez isso duas vezes e não deu certo lá. Por que aqui daria? Nessa como naquelas versões (1971 e 1999), faltou preciosismo, faltou coragem em investigar novas possibilidades de apresentação desse contexto. 

Além disso, toda a reflexão de Shulz se pasteuriza no esforço da produção em vender o espetáculo apenas às crianças. A começar pelo horário em que ele se apresenta (15horas), mas indo principalmente ao como isso se dá, vê-se um empenho em fazer graça na tentativa desastrosa de chamar a atenção das crianças para que elas não conversem muito e prestem a atenção. É claro que peças como “João e Maria” e “Cinderella” também têm níveis de sentido mais complexos, mas “Meu amigo, Charlie Brown” é inteiramente constituído por esses nas palavras, nas letras e nas melodias, sobrando apenas ao colorido do cenário e do figurino os elos de ligação às crianças. Ou seja, a montagem se equivoca no estabelecimento de relações, priorizando as menos vantajosas.

Eis grandes trabalhos: Sabrina Korgut e Mateus Ribeiro
Por fim, na análises das possíveis problemáticas de “Meu amigo, Charlie Brown”, vale considerar as colaborações do elenco. Isolados dos demais elementos em que suas construções surgem, todos os trabalhos são positivos. Tiago Abravanel (Snoopy), cujo carisma natural já foi tantas vezes elogiado, se serve da enorme popularidade do seu personagem aqui para elevar os méritos da obra como um todo positivamente. Disciplinado, responsável e generoso, ele não puxa o foco quando teria possibilidade de, melhorando o equilíbrio da produção. Leandro Luna (Charlie Brown) e Ester Elias (Sally Brown) têm participações interessantes, com ela enfrentando o desafio atroz de defender bem aqui o personagem que levou Kristin Chenoweth ao estrelato dezessete anos atrás. Guilherme Magon (Schroeder) está tão apagado no grupo quanto seu personagem é no dele.

Os grandes destaques dessa montagem são Sabrina Korgut (Lucy Van Pelt) e Mateus Ribeiro (Linus Van Pelt). Nas excelentes interpretações deles, veem-se nela vibrante defesa das canções e nele da dança, ambos se tornando o grande motivo pelo qual valeu a pena assistir à essa montagem. Eis grandes trabalhos! O elenco, de um modo geral, luta contra várias questões outras do espetáculo já levantadas aqui com galhardia. A ele, os aplausos.

No Brasil, “Meu amigo, Charlie Brown” vai receber uma nova montagem com elenco inteiramente constituído por crianças. Na Off-Broadway, houve produção assim também no meio desse ano e as críticas publicadas alertam para, apesar da oportunidade de se conhecer novos atores, é a peça prejudicada por causa da dificuldade das canções. Vale a pena esperar para conferir como ela se sairá por aqui em 2017, ano em que “You`re a good man, Charlie Brown” comemorará 50 anos desde sua primeira estreia. 

*

Ficha Técnica:
Baseado nas Tirinhas de Charles Schulz
Um Musical de Clark Gesner
Versão Brasileira – Mariana Elisabetsky

Elenco:
Tiago Abravanel - Snoopy
Leandro Luna - Charlie Brown
Sabrina Korgut - Lucy Van Pelt
Ester Elias - Sally Brown
Guilherme Magon - Schroeder
Mateus Ribeiro - Linus Van Pelt
Tecca Ferreira - Swing feminino
Douglas Tholedo - Swing masculino

Direção e Coreografia – Alonso Barros
Diretor Musical e Maestro Regente – Alexandre Queiroz
Direção Vocal – Rafael Villar
Direção de Produção – Néctar Cultural
Cenários – Chris Aizner
Figurinos – Jô Resende
Iluminação – Paulo César Medeiros
Stage Manager – Cris Fraga
Assessoria Jurídica – Marcelo Takeyama
Fotógrafo – Caio Gallucci
Comunicação e Filmes – Ponto Case
Assessoria de imprensa – Casé Assessoria
Realização – Néctar Cultural

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Nefelibato (RJ)

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Foto: Renata Maria


Luiz Machado

A poesia fica pobre quando precisa de justificativa

“Nefelibato” é o monólogo em que Luiz Machado celebra seus 20 anos de carreira como ator. A peça foi escrita por Regiana Antonini e dirigida por Fernando Philbert com supervisão de Amir Haddad. O ótimo trabalho de interpretação, a direção pontual e a visualidade interessante não são o suficiente para dar conta dos inúmeros problemas de dramaturgia infelizmente. A peça está em cartaz, na Sala Rogério Cardoso, na Casa de Cultura Laura Alvim, até o dia 18 de dezembro.

Inúmeros problemas nessa dramaturgia de Regiana Antonini
O texto tem uma contradição muito fácil de identificar e que lhe prejudica muito. Anderson é um morador de rua que se orgulha da vida que leva, porque nela está livre das muitas prisões do mundo do dinheiro. Ao começar a contar sua história, porém, vê-se o quanto ele está amargurado. Em 1990, ele era um homem bem estabelecido que herdou uma agência de turismo. O Plano Collor, lançado um dia após a posse do primeiro presidente eleito pelo voto direto no país depois de 29 anos, entre outras coisas, aprisionou o dinheiro da população nos bancos. O fato levou o país ao caos, multiplicando o sentimento de instabilidade para níveis inimagináveis. Na peça de Antonini, Anderson foi uma das vítimas desse acontecimento que o levou à bancarrota (como, na vida real, a muitas pessoas). 

A tragédia de Anderson é contada por ele com muita dor. Por causa disso, no espectador, ficam perguntas como: se ele está feliz vivendo na rua, qual o problema de ter perdido todo o seu dinheiro? Collor é o algoz ou o salvador de sua alma? Afinal de contas, sua falência lhe fez bem ou mal? E, por fim, se tudo está bem com Anderson, o que move a história? Apenas uma descrição do estado de sua alma?

Sem resolver os problemas que a própria dramaturgia apresenta para si e sem oferecer qualquer chance de curva dramática ao personagem que seja capaz de fazer a história atravessar o tempo da narrativa, o texto falece raquítico. Sobram frases belas, mas sem contexto, reflexões desamparadas de movimentos e lamentações sem fim que acabam por interpor inúmeros desafios à encenação.

Fernando Philbert e Luiz Machado de mãos atadas
A direção de Fernando Philbert não consegue vencer os desafios da dramaturgia. Preso em um mar de lixo e sucata, o contexto da encenação pode fazer referência a “Grey Gardens”, mas ela para no visual dessa e não avança para sua poética infelizmente. Um pensamento lúcido invade as falas mais emotivas de maneira que a peça não vai nem lá, nem fica bem cá, pesando o ritmo. Comportado ao texto, Philbert está de mãos amarradas e Luiz Machado patina no pântano onde ele se jogou para comemorar o aniversário de sua carreira.

Luiz Machado exibe ótimo repertório de expressões, mas não há uma concepção que bem amarre o conjunto de seu trabalho em um todo coerente em termos de sentido. O personagem não faz das contradições uma marca de complexidade de sua alma, o que seria interessante. Ao contrário, a lógica invade a loucura para dar-lhe razão, tornando-a um defeito e não uma beleza. Por causa disso, o trabalho do ator pode ser bem avaliado como elemento em separado, mas não traz efeito significativo à abordagem na plenitude da obra.

O cenário e o figurino de Teca Fichinski apenas oferecem lugar para a narrativa surgir, perdidos pela falta de direcionamento do projeto estético. A iluminação de Vilmor Olos meramente dá a ver o contexto provavelmente pelos mesmos motivos.

Feliz aniversário!
“Nefelibato”, cujo título remete à “pessoa que anda nas nuvens”, se perde nas justificativas. A poesia fica muito pobre quando precisa de motivo para acontecer. Que a carreira de Luiz Machado tenha vida longa e que muitos novos aniversários aconteçam!

*

Ficha técnica:

Texto: Regiana Antonini

Interpretação: Luiz Machado

Supervisão artística: Amir Haddad

Direção: Fernando Philbert

Cenografia e figurino: Teca Fichinski

Iluminação: Vilmar Olos

Direção de movimento: Marina Salomon

Preparação vocal: Edi Montechi

Assistência de direção: Alexandre David

Assessoria de imprensa: Christovam de Chevalier

Design gráfico: Claudio Sales

Direção de produção: Joaquim Vidal



Realização: LM Produções Artísticas e Melhor a Doi2

Rival Rebolado (RJ)

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Foto: Eduardo Moraes/ Maurício Code

Isabel Chavarri


Quando o Teatro de Revista não sai do armário

O “Rival Rebolado – 2a temporada” é um espetáculo que está acontecendo no Teatro Rival, na Cinelândia, desde 15 de novembro e vai até 20 de dezembro próximo, sempre às terças. Pra quem espera ver uma atualização do gênero Teatro de Revista e principalmente pra quem já assistiu, dos mesmos realizadores, ao “Cabaret On Ice” do Buraco da Lacraia, essa é uma grande decepção. Mas pode ser interessante ir lá para curtir os shows de drag queens, duelando entre si pelo troféu de a “Rainha da Cinelândia”, concurso esse que a produção promove com candidatas sempre diferentes. E, em especial, a performance de Isabel Chavarri como Delirious Fenix. A análise a seguir diz respeito à sessão de 29 de novembro, mas vale lembrar de que, a princípio, são roteiros parcialmente diferentes toda semana. O projeto foi idealizado por Alê Youssef, Leandra Leal e por Luis Lobianco. Chayenne Furtado, Eber Inácio, Fabiano de Freitas, Iara Niixe, Isabel Chavarri, Letícia Guimarães e Sidnei Oliveira, além de Leal e de Lobianco, estão no elenco. A direção é de Freitas e de Chavarri.

Com uma dramaturgia enrijecida, o Teatro de Revista não se aproxima
O espetáculo é dividido em dois blocos. Na primeira parte, há vários números da dramaturgia principal e, na segunda, as apresentações das drags queens concorrentes entretêm. 

A noite começou bem com uma dublagem, por Luis Lobianco, da canção “Vaca Profana” (de Caetano Veloso) a partir da gravação de Gal Costa. Em uma referência à Laura de Vison (1939-2007) em “O fantasma da Ópera”, o personagem come o cérebro de Sérgio Cabral ao longo da cena, estando vestido com uma roupa que remete à obra de Romero Britto. O refrão – “vacas de divinas tetas” – talvez sirva para brincar com o fato de terem sido encontrados quadros desse pintor na casa do ex-governador, esse preso na penitenciária de Bangu recentemente por, entre outras coisas, “mamar nas tetas do governo”. A letra da música, uma ode à Espanha, país por onde o compositor passou nos anos 80, não é aproveitada de qualquer outro modo, o que reduz em parte os méritos da proposta por desperdiçá-la. A cena termina com a apresentação dos atores que fazem parte do elenco através de uma narrativa (ficcional) engraçada de cada um.

“Rival Rebolado” avança para o quadro “O mundo do carão”. Trata-se de uma novela em que os personagens têm nomes de marcas de cosméticos mais populares como Christian Grey e Avon, por exemplo. Há uma enorme “forçação de barra” nesse momento, em uma tentativa desesperada de fazer graça, o que depõe contra o trabalho. Marcações fixas e dramaturgia complicada, com vários atores interpretando vários personagens, eliminam as chances de fluidez no pior número da noite. Aquilo que era pra ser vivo fica frio, pesado e morto apesar das colaborações de Éber Inácio e de Sidnei de Oliveira, que visivelmente se esforçam positivamente.

O quadro é interrompido por outro que faz referência a uma apresentação do Oscar por dois apresentadores falando portunhol (Leandro Leal e Fabiano de Freitas). É uma oportunidade bonita de homenagear Milton Cunha, personalidade do carnaval conhecida e respeitada no país. Em cada noite de “Rival Rebolado”, alguém recebe essa honra. Antes de Cunha, foram drag Suzi Brasil e o empresário Adão Arezo. Rogéria teve a sua vez na última semana. Segue um número de dança não muito valoroso e tampouco engraçado em mais uma gesto da dramaturgia de sair da própria proposta. A novela “O mundo do carão” termina com uma referência ao clipe de “Vogue”, de Madonna.

O melhor momento da noite é quando Isabel Chavarri surge dublando a canção “All about that bass” na voz de Meghan Trainor. Em uma estética burlesca, ela vem com a personagem Delirious Fenix, que faz um strip-tease lambendo uma lata de leite condensado. Éber Inácio entra dublando Tetê Espíndola na canção “Escrito nas estrelas”, com boa performance. E, assim, termina a primeira parte de “Rival Rebolado”.

A pequeníssima referência à política brasileira, um deboche da cultura pop até interessante e um ótimo número de burlesco são insuficientes para permitir uma leitura de Teatro de Revista à montagem, como sugere a divulgação. Falta muito mais ironia, muito mais crítica, muito mais leveza para dizer o mínimo. Com uma dramaturgia enrijecida, em que não há improvisações e sobram ratificações da quarta parede, a estética que marcou o teatro brasileiro o final do século XIX até a metade do XX não se aproxima. Carece-se uma leitura pontual das pesquisas de Neyde Veneziano e de Tânia Brandão sobre o tema.

O concurso de drag queens “A melhor de 4” domina a segunda parte de “Rival Rebolado”. O público presente é quem, a princípio, escolhe a vencedora entre quatro candidatas. No todo da temporada, elas vão ascendendo na disputa pelo troféu de “Rainha da Cinelândia”. Na noite do dia 29 de novembro, as candidatas foram: Sereia do Amazonas, que se apresentou com uma canção de Britney Spears; Xena Meneghel, com a canção “It`s raining man”, de The Weather Girls; Layla Riker com “I believe I can fly” na voz de Jennifer Holliday; e Babalu Vendraminy com “I`ll stand by you”. Leandra Leal, que apresentava o quadro, decidiu, em nome do público, premiar todas as quatro concorrentes de maneira que todo o grupo foi para a próxima etapa. A final do concurso acontecerá no dia 20 de dezembro. Destaca-se o figurino usado por todas as participantes e o modo especial com que cada uma delas, em especial as três últimas, cativou o público, usando bem vários referenciais da estética desse tipo de obra.

Direção mantém o Teatro de Revista dentro do armário
A direção de Fabiano de Freitas e de Isabel Chavarri deixa pouco espaço para brincadeira. O humor entra em “Rival Rebolado” de modo fixo, ensaiado e quase que inteiramente pautado nos figurinos e nos méritos das letras das canções. Assim, em alguns momentos, a peça é melhor lida como uma atualização do gênero besteirol, em outras da comédia burlesca e, na maior parte dela, como um show de drag queens. Mas, como já se disse, teatro de revista não serve como uma boa lente para o que se vê infelizmente. De posse do microfone, Leandra Leal conversa livremente com o público e com as candidatas participantes e esse é, em termos de interpretação, um dos momentos mais interessantes do espetáculo. Elogiam-se as Xena Meneghel, Layla Riker, Babalu Vendraminy, Éber Inácio, mas principalmente Isabel Chavarri pelo enorme carisma.

Quanto aos figurinos, as referências a Romero Britto, porque oferecem a peça a chance da crítica política, são ótimas, mas os pontos altos estão nos trajes usados por Leandra Leal, Isabel Chavarri e principalmente Layla Riker. Os vestidos de plástico bolha não colaboram em nada com a montagem.

“Rival Rebolado”, que parece viver uma crise de consciência estética, quer ser algo, mas não consegue se aproximar dele: o teatro de revista. Falta coragem talvez na hora de identificar a complexidade naquilo que aparentemente é superficial. Sucesso a todas as candidatas na disputa pelo troféu “Rainha da Cinelândia”. Vida longa ao seu trabalho.

*

Ficha Técnica:
Idealização: Alê Youssef, Leandra Leal e Luis Lobianco
Criação e Performances: Chayenne Furtado, Eber Inácio, Fabiano de Freitas, Iara Niixe, Isabel Chavarri, Leandra Leal, Letícia Guimarães, Luis Lobianco, Sidnei Oliveira
Direção Artística: Fabiano de Freitas e Isabel Chavarri
Produção Executiva: Thamires Trianon
Assistente de Produção: Camila Santana
Fotos: Eduardo Moraes e Maurício Code (EM Fotos) e Francio de Holanda 

sábado, 10 de dezembro de 2016

Antes do café (RJ)

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Foto: divulgação


Nadia Bambirra


Mais um ótimo espetáculo de Jorge Farjalla

“Antes do café” é o mais novo ótimo espetáculo dirigido por Jorge Farjalla, encenador que assinou a excelente última versão de “Dorotéia”, de Nelson Rodrigues, com Rosamaria Murtinho, Letícia Spiller e grande elenco no primeiro semestre. Esse monólogo, escrito pelo americano Eugene O`Neill (1888-1953) entre 1916 e 1917, surge agora na programação teatral do Rio de Janeiro com interpretação destacável de Nadia Bambirra. Sua primeira temporada na Sala Nathalinha, no Teatro Nathália Timberg, acabou no fim de novembro último, mas a montagem deve retornar em breve para novas apresentações. Vale a pena esperar por ela!

Expressionismo x neorrealismo no texto de O`Neill
Em mais um dia, a costureira Mrs. Rowland (Nadia Bambirra) acorda antes de seu marido para preparar o café do casal. O problema desse amanhecer é justamente o fato dele prenunciar um dia como todos os outros. Alfred Rowland, como de costume, chegou tarde em casa, bêbado e fedido na noite anterior e agora dorme lá dentro aparentemente sem preocupar com o sustento dele e de sua esposa. Objetos têm sido constantemente penhorados, a data para o pagamento do aluguel se aproxima, o pão vai ficando cada vez mais duro.

O tempo da narrativa é o mesmo tempo da diegese, isto é, a encenação da peça dura exatamente o tempo com que as coisas, na história, acontecem. O público está ou diante ou dentro da pequena casa na Christopher Street, na cidade de Nova Iorque, no início de um outono. Vemos a personagem andar pela casa, fazer suas orações, organizar o início do seu dia e principalmente deixar sair toda a sua mágoa. O poeta Alfred Rowland, com diploma em Harward, era o único filho de um homem milionário. Ela, filha de uma família simples, não teve dúvidas em se casar com ele, mas, na época, não vislumbrava o futuro que recairia sobre ela. Todo o dinheiro foi perdido, os sonhos se foram.

“Antes do café” (“Before breakfast”) foi uma das primeiras peças escritas por Eugene O`Neill, que vinte anos depois ganharia o Nobel de Literatura além de muitos outros prêmios. Quando foi escrita, o país estava mergulhado em um sentimento de êxtase consumista e Nova Iorque era uma região onde, mais do que no resto dos Estados Unidos, tudo parecia ser brilhante. O metrô unia a cidade de ponta a ponta, a região da Broadway começava a ficar cheia de teatros, a mulher americana era celebrada nos espetáculos de Florenz Ziegfield e dalí para Hollywood.

Mas O`Neill, viajando de um lado para o outro pelo mundo (América do Sul e África inclusive) em pequenos trabalhos para sobreviver e também na companhia de teatro do pai pelo interior dos Estados Unidos, entrou em contato com uma outra realidade. Longe dos anúncios comerciais, havia muita pobreza, injustiça, situações indignas. Depois de uma tentativa de suicídio, foi internado em um sanatório e ali começou a escrever o que, depois da queda da bolsa de valores de Nova Iorque, em 1929, seria lido como a grande verdade dos fatos.

Quando lançado, “Antes do café” foi associado com o expressionismo de August Strindberg e de Frank Wedekind. Isso talvez porque se considerava a “sujeira” do texto como uma consequência do ponto de vista, esse tido como muito comprometido pelas emoções. Depois de 29, na grande depressão americana, no entanto, é muito mais fácil ler o texto a partir do neorrealismo, do qual Tennessee Williams e John Steinbeck são grandes referentes. Assim, talvez não sejam as emoções que tornam o contexto horrível, mas sim a realidade dele é que levam a personagem a estar assim. Eis um grande texto!

Excelente interpretação de Nadia Bambirra
A direção de Jorge Farjalla, assistida por Jaffar Bambirra e por por Vitor Losso, para além de assinar o espetáculo teatral, oferece uma obra plástica de alta grandeza. As palavras de O`Neill, além de ganharem corpo em Nadia Bambirra, assumem contretude no modo como as paredes da casa dos Rowland estão, bem como seus móveis, objetos, roupas e comida. O espectador mais atento passa, ao longo da sessão, os olhos por cada canto do que vê e se encontra com linda narrativa em cada milímetro do espaço, esse que permite com que a personagem possa nadar pelas questões mais profundas da dramaturgia sem medo.

Farjalla imprime ainda um ritmo na cena que oferece à audiência a chance de conviver com a personagem e com seu contexto cuidadosamente. Isso estrutura o discurso, qualifica as ações e exige do público que ele analise o que vê a partir de um olhar de dentro. Nesse sentido, esse “Antes do café” de Jorge Farjalla, negando-se a ir pelo mais fácil, faz a obra reassumir uma leitura expressionista, que é tão bela como seria uma realista, essa mais usual, como já disse.

Nadia Bambirra passeia por dentro da personagem, levando o público a conhecer diferentes ambientes de sua personalidade. Com maestria, a intérprete viabiliza momentos mais dramáticos, outros mais reflexivos e alguns até cômicos, sempre fazendo das oposições um meio rico de encarar o panorama sob a ótica da complexidade. Com excelente uso da voz, do corpo e das entonações à disposição, a audiência se sente tocada pela perspectiva de sua Mrs. Rowland e sai do teatro com a certeza de que um ponto de vista mais humano é sempre a melhor saída para enfrentar o mundo.

Elogiadíssimo!
Como acontece com todo bom espetáculo assinado por um bom encenador, todos os elementos sentem a concepção de seu diretor. Assim, o nome de Jorge Farjalla está em todos os itens da ficha técnica, o que seria óbvio se fosse também normal entre as produções cariocas (mas infelizmente não é). “Antes do café” tem , como já se destacou, excelentes contribuições do cenário co-assinado também por Camila Rodrigues e por Lua Haddad, do figurino co-assinado por Alex Brollo, da luz e da trilha sonora essa só de Farjalla. Em resumo, vê-se aqui a mão firme que raramente se vê, mas que é a melhor sempre, porque a única capaz de oferecer coerência para a obra como um todo. Elogiam-se, pois, todas as contribuições dos colaboradores da equipe de Farjalla.

“Antes do café”, elogiadíssimo também pela doutora Tânia Brandão, é mesmo um espetáculo essencial nesse fim de primavera de 2016. Que volte em breve e para muitas e longas temporadas.

*

Ficha Técnica
Autor – Eugene O´Neill
Direção e encenação – Jorge Farjalla
Elenco – Nadia Bambirra
Cenário e direção de arte – Camila Rodrigues
Supervisão de figurino – Alex Brollo
Concepção de luz – Jorge Farjalla
Produção executiva – Denam Pettmant e Lua Haddad
Realização – 5KFilms e Cia Guerreiro


quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Sobra (RJ)

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Foto: Aline Macedo

Mario Terra, Pedro Casarin e Bruno Quaresma

Com ótimo trabalho de elenco, “Sobra” é quinto espetáculo Cia em Obra

Quinto espetáculo da Cia em Obra, o ótimo “Sobra” comemora os quatro anos de formação desse grupo carioca. Com texto e direção assinados por Zeca Richa, a montagem cumpriu temporada durante o mês de novembro no Teatro do Centro Municipal do Parque das Ruínas, em Santa Teresa. Eduardo Parreira, Bruno Quaresma, Mário Terra e Pedro Casarin estão no elenco em ótimos trabalhos. A dramaturgia se organiza a partir de várias histórias que, pouco a pouco, vão se encontrando no trato de personagens marginalizados que são vistos de modo comicamente ácido. Vale a pena aguardar pela volta da produção à grade teatral carioca.

Ótimo conjunto de elenco
Cansado de sua vida, um homem torce pelo fim dela, tentando chegar à morte de várias maneiras, mas sem sucesso. Uma prostituta e um batedor de carteiras vivem uma relação cheia de altos e baixos. Dois homens estão presos no trânsito, outros dois esperam uma encomenda que não chega. Uma filha procura um homem desaparecido que talvez seja seu pai. Todas essas histórias se misturam em “Sobra”, cuja dramaturgia foi escrita por Zeca Richa a partir da união entre textos de Pedro Emanuel e do trabalho dos atores na sala de ensaios. O jogo estabelecido pela narrativa vai sendo proposto como um quebra-cabeças. Contemplar seu panorama na totalidade é o desafio do espectador na medida em que a narrativa vai se aproximando do fim.

Há que se destacar na dramaturgia o jeito veloz com que os quadros surgem na cena ao longo da peça. A concisão dos diálogos e os ganchos que permitem com que eles se unam em episódios vai mantendo a atenção da assistência que, em primeiro lugar, se vê com a tarefa de entender o que está vendo para depois, afeiçoado aos personagens, se divertir.

Na multiplicidade de personagens, Eduardo Parreira, Bruno Quaresma e Pedro Casarin apresentam ótimos trabalhos de interpretação, exibindo rico repertório de expressões na construção dos enredos. Mário Terra, por outro lado, exilado em uma só figura, tem mais tempo para conquistar o público em papel delicioso que ele torna ainda melhor pela qualidade de sua defesa. Na regularidade com que se veem bons trabalhos no conjunto de elenco, há que se elogiar a direção de Zeca Richa. O modo como as cenas se articulam e o jogo é proposto são outros níveis de sua qualificada contribuição aqui.

O quarto aniversário da Cia em Obra
A luz de João Gioia e de Ana Luzia de Simoni, assim como figurino de Tiago Ribeiro, mas principalmente o cenário de Rubi Schumacher e do diretor perdem algumas chances valiosas de melhorar o ritmo da comédia. Sem investir na fluidez, mas privilegiando comentários mais herméticos nessas colaborações, eles perdem quando não agregam beleza em favor da praticidade. Por vezes, o quadro é escuro, o guarda-roupa traz problemas e o cenário parece inútil. Em todas elas, o ritmo cai negativamente precisando ser novamente levantado pelo texto e pelas interpretações. Felizmente, esses últimos conseguem nesses momentos e também nos demais.

É bonito acompanhar a história de um grupo como a Cia. em Obra. “Não há melhor lugar que a nossa casa”, “O confuso e misterioso roubo das vírgulas”, “Febril” e “Bolo de carne”, que vieram antes de “Sobra”, já revelavam a disposição do coletivo em experimentar, em investigar e em oferecer reflexões e entretenimento. Que venham novos aniversários e muitos outros espetáculos! Parabéns!

*

“Sobra”

Texto original e Direção: Zeca Richa

Interlocução dramatúrgica: Pedro Emanuel

Elenco: Bruno Quaresma, Eduardo Parreira, Mário Terra e Pedro Casarin

Iluminação: Ana Luzia de Simoni e João Gioia

Cenografia: Rubi Schumacher e Zeca Richa

Cenotécnico: Dodô Giovanetti

Figurino e Adereços: Tiago Ribeiro

Trilha Original: Mário Terra e Eduardo Parreira

Produção e Realização: Cia em Obra

Imagina esse palco que se mexe (RJ)

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Foto: divulgação

Rita Fischer

Mais um ótimo espetáculo de Moacir Chaves


A primeira temporada do ótimo “Imagina esse palco que se mexe” terminou ontem na Sala Multiuso do Espaço SESC de Copacabana infelizmente. A peça é dirigida por Moacir Chaves e tem no elenco as atrizes Karen Coelho, Luísa Pitta, Mônica Biel e, em destaque, Rita Fischer, essa última substituindo Elisa Pinheiro. A dramaturgia, que é estruturada pela justaposição de vários pequenos monólogos, foi construída pelo grupo a partir de encontros com o astrofísico João Ramos Torres de Mello Neto, professor titular da UFRJ. Ela versa sobre temas relacionados à física: o homem tentando entender a si mesmo e ao universo bem como sua relação com os outros e com o que lhes circunda. Com um humor inteligente viabilizado principalmente por ótimos trabalhos de interpretação, a montagem sugere diversas reflexões, tornando sua assistência um momento especial nesse final de primavera de 2016. Que volte mais vezes à programação carioca!

Pequenos monólogos compõem a dramaturgia
Como já foi dito, a dramaturgia de “Imagina esse palco que se mexe” se constitui a partir da justaposição de pequenos monólogos. Alternadamente, cada uma das quatro atrizes entra no palco e, depois de se situar no centro dele, inicia sua apresentação. Há textos em que se vê uma narrativa, como a de um menino que veio do Acre para o Rio de Janeiro e se impressiona com as diferenças e as similaridades entre as duas cidades. Há outros que tratam das descobertas da ciência: a invenção do raio-x, pesquisas sobre o buraco negro, as reflexões sobre o que é sólido e o que não é entre as coisas do universo, por exemplo. Por fim, há ensaios sobre o homem no espaço e sobre as relações que ele estabelece com outros de sua espécie e com seu entorno.

Na plateia, a cada nova oportunidade, o público vai sendo levado a construir o mapa semântico do espetáculo. Ele identifica o lugar de onde a obra fala e qual o contexto das propostas que a peça oferece. É sempre uma reflexão científica, por vezes dura e difícil, mas constantemente disposta a fazer pensar para além de entreter. O modo como a dramaturgia se organiza nesses discursos é o primeiro ponto positivo da produção a ser destacado. Apesar de se pautar sobre conceitos “cabeçudos”, muitos deles exigentes, é brilhante o modo como uma aparente leveza consegue transparecer. Isso acolhe a recepção, mantém viva a atenção e diverte!

A delicadeza na direção de Moacir Chaves
Entrando na análise dos aspectos que dizem respeito à encenação, é preciso destacar o jeito como as atrizes – codramaturgas do espetáculo ao lado do diretor Moacir Chaves – agarram cada oportunidade de transformar as sentenças do texto em teatro. Todas elas nutrem o discurso verbal de corporalidade através de largo investimento sobre o seu som, sobre o ritmo de sua verbalização e sobre curvas nas entonações, produzindo um movimento colorido para o que é dito. Com quase nenhum momento corporal, quase toda a encenação se dá no campo da oralidade, o que é um enorme desafio. Porque vencido, fica fácil perceber o grande mérito do conjunto. Rita Fischer se destaca talvez porque consiga emprestar ao trabalho seu talento natural para a comédia, mas ratifica-se os elogios à Karen Coelho, Luísa Pitta e à Mônica Biel igualmente.

A direção de Moacir Chaves nesse trabalho, lembrando os grandes tempos do saudoso Alfândega88, é delicadíssima. Arregimentando sutilizas, ele obtém na montagem altíssimos níveis estéticos. A iluminação de Paulo César de Medeiros preenche o fundo do palco com pequenas luzes sobre o negro, sugerindo um infinito diante do qual o homem é um mero desafio. Os discretos figurinos de Inês Salgado positivamente valorizam as vozes das atrizes e o texto, isto é, não chamam a atenção para suas aparências positivamente. A direção musical de Tato Taborda, como a luz, age em favor da sonoridade da dramaturgia, qualificando a reverberação possível capaz de aprofundar a construção do sentido. Assistida por Francisco Ohana, a direção de Chaves, por tudo isso, é outro destaque da montagem.

Uma ótima surpresa!
Considerado o movimento invisível da Terra e consequentemente de tudo o que há nela, a peça faz um convite para a reflexão a respeito de tudo aquilo que aparentemente é fixo em nosso entorno. Esse ponto de vista é capaz de fazer ver novas relações possíveis entre nós e de nós com nosso entorno. A complexidade da existência, longe de ser apenas um desafio, pode ser uma aventura deliciosa. “Imagina esse palco que se mexe” é uma ótima surpresa nesse segundo semestre.

*

Ficha técnica

Direção: Moacir Chaves

Elenco: Elisa Pinheiro, Karen Coelho, Luísa Pitta e Monica Biel

Texto: Dramaturgia coletiva a partir de relatos do astrofísico João Ramos Torres de Mello Neto

Iluminação: Paulo César Medeiros

Figurinos: Inês Salgado

Direção Musical: Tato Taborda

Direção de Produção: Luísa Pitta e Monica Biel

Assistência de Direção: Francisco Ohana

Fotos de Divulgação: Bruna Thimotheo

Assessoria de Imprensa: Ney Motta