quinta-feira, 31 de maio de 2012

Alguém acaba de morrer lá fora (RJ)


Foto: Paula Kossatz

Uma comédia que faz rir e faz pensar

            “Alguém acaba de morrer” é o novo texto de Jô Bilac, encenado sob a direção de Pedro Neschling que, pela primeira vez, dirige a própria mãe, a atriz Lucélia Santos (mesmo quem não viu sabe que ela interpretou a personagem título na novela “A Escrava Isaura”, o maior fenômeno da teledramaturgia brasileira em contexto mundial). O texto e o espetáculo ganham o espectador por dois motivos: a forma como o texto se estrutura a partir do encadeamento das cenas e a valorização da superficialidade das relações que, por fim, acaba por indicar a presença de uma profundidade latente e perigosa. Em cartaz no Teatro do Sesi, no Rio de Janeiro, uma comédia que faz rir no momento em que é apresentada, oferecendo uma reflexão a quem sai dela. No caso, apenas méritos.
            Dizer que um texto vale porque é encadeado é quase uma redundância visto que está no significado tradicional da palavra texto a autorreferenciação. Aqui o termo tem função comparativa. Em “Os Mamutes”, a relação entre o texto e o fora dele é essencial. Em “O matador de santas”, a evolução narrativa, que leva para a descoberta do assassino, é fundamental. Em “Rebu”, a relação entre os personagens importa. Em “Dois para viagem”, a relação entre as histórias é o aspecto mais marcante. Em “Alguém acaba de morrer lá fora”, a forma como as cenas estão encadeadas é um dos dois aspectos principais a ser observado. Na rua, no lado de fora de um Café, um acidente acontece, matando alguém. Dentro do estabelecimento, três clientes e um funcionário sofrem as conseqüências do ato. No total, são, assim, quatro possibilidades mínimas: o crime une os quatro desconhecidos nas diferentes reações ao fato a partir das quatro alternativas de quem morreu. Claudio espera uma mulher com quem combinou um encontro às escuras. Laura espera alguém que venha usando muletas. Marcela espera a irmã gêmea. O garçom pode, ele mesmo, morrer quando sai para conseguir troco. Longe da divisão em quadros estanques, o texto de Jô Bilac se autorreferencia e se viabiliza como único ao leitor a partir da repetição de diálogos, da renovação de situações, do novo olhar para cenas que já aconteceram. A direção de Pedro Neschling ganha valores positivos quanto ratifica essas indicações do autor, fornece marcas visíveis e garante um ritmo que providencia uma fruição cênica que tem, ao seu dispor, instrumentos de reconhecer essas bases. O ritmo é crescente na medida em que as cenas iniciais são mais longas que as finais, os personagens são menos tímidos no encerramento, as reações são mais visíveis nos últimos momentos. Os movimentos são bem marcados, as gestos são claros, as intenções são desenhadas, o que, no contexto das figuras, deixa ver uma superficialidade bastante rica ao todo. Quanto mais se assume a superficialidade, mais se exibe a profundidade.
            Ricardo Santos (Claudio) é a melhor participação da peça. Seus gestos são absolutamente detalhados, seus movimentos são bem cuidados, planejados, limpos. Sua voz é pausada, medida, equilibrada. Em cena, o resultado é vibrante, nobre, rico, positivo. Vitória Frate (Marcela) e Pedro Nercessian (Garçon) exibem figuras ricas, entonações engraçadas, intenções visíveis, enriquecendo a obra no que diz respeito às interpretações. Sobre Lucélia Santos, o grande nome do elenco, recaem as maiores responsabilidades e é por isso que, nela, há que se reconhecer o maior valor. Sob os olhos atentos de plateias sedentas pelo grande sucesso no teatro como o que houve na TV, a atriz sofre as conseqüências de grandes expectativas. Não perde, pois, quem vá vê-la. A eterna “Isaura” está inteira, viva, presente nas cenas dirigidas por seu filho. Embora sua voz sofra nos momentos em que se requer tons mais agudos ou expressões mais fortes, seu corpo inteligente equilibra o resultado propiciando momentos em que as marcas são específicas.
            Nello Marrese constrói, mais uma vez de forma positiva, um cenário bastante interessante. O Café se dá a ver a partir de paredes vazadas em cercas de arame. Nas exceções fechadas, a iluminação de Adriana Ortiz identifica um lugar qualquer, sem perfeições, bastante próximo do real além da narrativa, o que é excelente. Jukebox, balcão com máquina de café e mesas aproximam o cenário do além da peça de forma que a história seja contada com menos entraves. Os figurinos de Antônio Medeiros, no mesmo sentido, apresentam personagens ricos em suas idiossincrasias, mas sem marcas que teorizem a narrativa a ponto de cansar o ritmo, o que é ótimo.
            Uma pessoa perde a vida do lado de fora de um Café. Qual é o valor de uma vida perdida? Aqui parece interessar a vida de cada um e é a forma como cada um lida com os próprios caminhos em encruzilhada com os demais que vemos em cena. Em “Alguém acaba de morrer lá fora”, vale a vida que acaba de acontecer lá dentro. Engraçado, inteligente, perspicaz, eis aí uma comédia que faz rir, pensar e aplaudir.

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Ficha técnica:

Texto: Jô Bilac
Direção: Pedro Neschling
Elenco: Lucélia Santos, Ricardo Santos, Vitória Frate e Pedro Nercessian
Cenário: Nello Marrese
Figurino: Antônio Medeiros
Luz: Adriana Ortiz
Direção de Movimento: Toni Rodrigues
Trilha Sonora: Pedro Neschling e Rodrigo Marçal
Programação Visual: Roberta de Freitas
Fotografia: Paula Kossatz
Assessoria de Imprensa: JSPontes Comunicação, João Pontes e Stella Stephany
Assistente de direção: Karla Dalvi
Cenógrafa Assistente: Lorena Lima
Designer Assistente: Thiago Paiva
Assistente de Produção: Ana Terra e Jenny Mezencio
Produção Executiva: Letícia Nápole
Coordenação de Produção: Beto Bk
Direção de Produção: Giba Ka
Idealização: Breno Sanches e Lucélia Santos
Realização Nhock Produções

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Quebra-Ossos (RJ)


Foto: divulgação


O teatro do absurdo em uma bela produção contemporânea

            “Quebra-Ossos” é uma comédia escrita por Julia Spadaccini e dirigida por Alexandre Mello com vários méritos. A começar pelo texto, conhecem-se três personagens: João, Augusto e Maria. O primeiro foi deixado pela namorada e recebe a visita surpresa de um casal de amigos. O segundo conversa com o entregador de pizza enquanto sua esposa não chega. A terceira chamou dois amigos que não vê há doze anos para um reencontro na casa da avó. Se a dramaturgia é uma comédia de costumes, a encenação é absurda. Não há lógica em boa parte de “Quebra-Ossos”: os personagens são cheios de marcas, mas não farsescos; os diálogos se repetem; a movimentação é desenhada; o ritmo é crescente na evolução de cenas cada vez menores. Tudo é arranjado numa atmosfera estranha, inusitada, improvável e esse é o maior mérito da produção realizada pela Múltipla Companhia Teatral, embora a proposta não se confirme até o fim.
            Rodrigo Turazzi, Patrícia Elizardo e Cirillo Luna estão excelentes nas suas interpretações de João, Maria e Augusto respectivamente, executando as marcas previstas com perfeição: detalhes minuciosos na expressão gestual, intenções bem postas, corpos precisos, sobretudo em Turazzi, em destacável performance. Alexandre Mello dirige o elenco, produzindo uma narrativa carregada de traços, de forma que não há qualquer desperdício, havendo até alguns excessos. Dada aí a distância do real além da narrativa, os personagens e os movimentos da narrativa se apresentam a partir de lentes de aumento, vindo daí a comédia refinada e elegante que tanto faz valorizar o teatro nessa peça. Nas cenas finais, a relação entre as três histórias vai ficando mais clara, mais justificada, e é quando o absurdo perde força, o que não é, nesse caso, ruim, já que a comédia já está estabelecida.
            O cenário de Dani Geammal confere suavidade à carga pesada de signos cênicos positivamente. O figurino de Flavio Souza, além de valorizar os atores, age em igual sentido na narrativa, como também faz a trilha sonora de Leandro Baumgratz e a iluminação de Renato Machado, essa última com detalhes meritosos em luminárias, cordas e pequenos focos. Nos elementos plásticos, vale ainda destacar a projeção do filme “Quebra-Ossos”, um dos pontos altos da comédia.
            Com atualizações no século XIX, na obra de Qorpo Santo, e, principalmente, nos anos 50, com Ionesco, é muito interessante observar como o Teatro do Absurdo vai aparecendo, mesmo que de forma sutil, em produções mais contemporâneas. “Quebra-Ossos” atualiza o gênero sobretudo na encenação, possibilitando um espetáculo que enriquece à programação teatral da capital fluminense.

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Ficha técnica:

Texto: Julia Spadaccini
Direção: Alexandre Mello
Elenco: Cirillo Luna, Patrícia Elizardo e Rodrigo Turazzi
Cenário: Dani Geammal
Iluminação: Renato Machado
Figurino: Flávio Souza
Trilha Sonora: Leandro Baumgratz
Visagismo: Sandra Moscatelly
Direção de Produção: Rodrigo Turazzi
Produção Executiva: Rogério Garcia
Assistente de Produção: Larissa Sarmento
Assessoria de Imprensa: Ana Paula Sant’Anna
Programação Visual: Paula Sattamini
Áudio Visual: Multiphocus Arte & Comunicação
Fotografia: Claudio Senra
Operação de Luz: Eduardo Hoffmann
Operação de som e de imagem: Ricardo Lacerda
Idealização: Cirillo Luna
Produção: Turazzi Produções
Realização: Múltipla Companhia Teatral

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Sopro de vida (RJ)


Foto: divulgação

Uma história monótona contada dignamente

            Escrito há dez anos pelo inglês Sir David Hares (1947), “Sopro de vida” (The Breath of Life) estreou em Londres tendo Dame Judy Dench e Dame Maggie Smith nos papéis de Francês Beagle e Madeleine Palmer respectivamente. Na produção dirigida por Naum Alves de Souza, é Rosamaria Murtinho e Natália Timberg quem estão no palco. Na história, vemos Frances visitando Madeleine com o objetivo de escrever um romance. Aos poucos, o diálogo deixa ver o que as une: Martin, o ex-marido de Frances, foi amante de Madeleine. A partir daí, esse é o aspecto negativo da dramaturgia, todos já sabem o que vai acontecer: as duas vão conversar até que os detalhes das relações estejam revelados uma para a outra. Porque paira a possibilidade (remota) de surpresas, é preciso assistir ao espetáculo para averiguar se elas acontecem ou não. Aqui vale dizer que Natália Timberg, Rosamaria Murtinho e Naum Alves de Souza têm suas marcas suficientemente postas na história do teatro brasileiro para que seus trabalhos sejam vistos por multidões.
            Traduzido por Naum Alves de Souza e Nathalia Timberg, o texto deixa ver muitas frases profundas e pouco movimento. Lento do início ao fim, o ritmo avança quando detalhes na relação entre Martin e Madeleine (Timberg) são expostos por Frances (Murtinho), mas, mesmo aí, a curva dramática é sutil demais, fazendo com que os méritos, não muitos, não estejam na dramaturgia, mas nos signos visuais.
            O cenário de Celina Richers e a iluminação de Wilson Reiz garantem à plateia a chance de encontrar no palco algo que se aproxime do real além da narrativa. Rico em detalhes, os trabalhos de Richers e Reiz são valorosos à fruição que não encontra entraves no estabelecimento da verossimilhança, fator indispensável num drama realista como é o caso aqui. Apesar de agir nesse sentido, os figurinos de Beth Filipecki e de Renaldo Machado não colaboram com o resultado visual porque não oferecem nenhum movimento à história já parada. Do verde ao bege, passando pelo marrom e pelo mostarda, os figurinos concordam com o verde musgo das paredes de forma monótona porque obediente.
            Natália Timberg e Rosamaria Murtinho são grandes damas do teatro brasileiro assim como Dench e Smith são no teatro inglês. Em uma direção cujos traços são invisíveis, encontra-se em cena um jeito positivamente realista de dizer o texto, sendo que o volume é auxiliado pelo uso de microfones. As intenções e as entonações são bem postas, apesar de não garantirem a evolução tradicional que caracteriza as boas histórias. Bem interpretada e bem produzida, “Sopro de vida” é uma história monótona contada dignamente que embeleza a riquíssima programação do Theatro Net Rio, a nova pérola do teatro carioca, certamente aí mais um motivo para as boas multidões.

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Ficha Técnica
Autor: David Hare
Tradutor: Naum Alves de Souza e Nathalia Timberg
Diretor: Naum Alves de Souza
Elenco: Nathalia Timbeg e Rosamaria Murtinho
Figurinos: Beth Filipecki e Renaldo Machado
Cenários: Celina Richers
Iluminação: Wilson Reiz
Produção Executiva: Carol Marques
Assessoria de Imprensa: Natasha SteinDireção de Produção: Montenegro e Raman
Co-produção: Hermes Frederico e Humberto Braga

segunda-feira, 21 de maio de 2012

De verdade (RJ)


Foto: Vicente de Mello

Requintado e incisivo

            O romance “De verdade” (Portraits of a Marriage) foi escrito pelo húngaro Sándor Márai (1900-1989) e publicado pela primeira vez em 1941. Lançado no Brasil em 2008, foi traduzido por Paulo Schiller e é considerado um dos melhores romances do autor. Adaptado para teatro por Isabel Muniz e Susana Schild, a peça “De verdade [ou A Mulher Certa]” apresenta um ponto de vista bastante rico acerca dos relacionamentos, sobretudo pela maneira como, com direção de Marcio Abreu, a dramaturgia cênica conta a história.
O livro se organiza em quatro depoimentos. Aqui valem três: em Budapeste, Ilonka conta a uma amiga a história de seu casamento desfeito, relembrando a inutilidade do esforço para decifrar a intimidade e para conquistar a alma do ex-marido, Peter, encantado, desde a juventude, por uma simples criada, Judit. Depois, em um café, Peter narra a um amigo a sua própria versão sobre a separação, evocando a dor da perda de um filho e reconhecendo o preço pago pela paixão inconfessável por Judit, a empregada que servia a rica mansão de seus pais. Mais de trinta anos depois, na cama de um quarto de hotel em Roma, Judit fala ao novo namorado sobre a infância miserável, sobre os dissabores vividos na casa dos patrões e sobre a união fracassada com Peter, condenada de início pelo abismo existente entre eles.
Em cena, na peça teatral, vemos dois atores, Guilherme Piva e Kika Kalache, a interpretar dois personagens cada um: ele interpreta O Marido e Lazar (o amigo escritor do Marido) e ela interpreta A Primeira Esposa e Judit. Em termos actanciais, nota-se que os personagens ocupam lugares diferenciados na narrativa: O Marido e A Primeira Esposa têm lugares de destaque enquanto os personagens nominados, Lazar e Judit, são coadjuvantes. A sutileza excessiva com que Kalache dá vida às duas figuras apresenta um ponto de vista sobre a história: de um casamento ao outro, O Marido encontra as mesmas dificuldades nos diferentes relacionamentos. A mulher certa não existe. Nesse sentido, o maior mérito da peça “De Verdade”, em termos estéticos, é produzir sentido a partir de significantes tão simples como a escolha do elenco, a tonalidade das interpretações, as nuances discretas do signo cênico. É verdade que tudo poderia ser de outra forma. Interpretados por Piva, O Marido e Lazar estão visivelmente caracterizados de forma diferentes, o que não acontece, como se disse, no trabalho de Kalache. O Marido e A Primeira Esposa poderiam ter nomes na peça como o têm no livro (Peter e Ilonka). Mas eis aí significados que se desdobram: a produção vê os relacionamentos com contornos sutis, com marcas discretas, a partir de meio tons. Nada em cena, nessa cena, é por acaso, o que caracteriza, sem dúvida, uma obra com diferentes níveis de compreensão e, por isso, inteligente.
Os meio tons se vêem desde as interpretações aos signos visuais. Os gestos são moderados, as vozes são macias e quase não há exageros. Pretos, brancos e vermelhos quase não são vistos, mas pairam o cinza e os tons pastéis. Uma saia cheia de rosas e uma cena de sapateado ajudam a construir o clímax melodramático um tanto quanto destoante que passa rápido felizmente. O olhar confessional aproxima, a música interpretada por Antônio Saraiva suavisa, os espelhos devolvem: sem sobressaltos emocionais, o público se sente convidado a se identificar delicadamente.
Com cenário de Fernando Marés de Castilho, figurinos de Cao Albuquerque, iluminação de Nadja Naira e preparação de Márcia Rubin, “De Verdade” toca numa questão fundamental nos relacionamentos de uma forma requintada, mas incisiva. Se buscamos nos outros o que não há em nós, precisaremos de vários outros porque ninguém tem tudo de que precisamos.

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Ficha técnica:
Direção: Márcio Abreu
Elenco: Kika Kalache e Guilherme Piva
Adaptação da obra de Sándor Márai: Isabel Muniz e Susana Schild, com colaboração de Guilherme Piva, Marcio Abreu, Mariana Lima e Kika Kalache
Direção Musical: Antônio Saraiva
Direção de Produção: Francisco França
Figurino: Cao Albuquerque
Preparação Corporal: Marcia Rubin
Preparação Vocal: Babaya
Cenografia de Fernando Marés de Castilho
Luz: Nadja Naira
Fotografia: Vicente de Mello
Design Visual: Sônia Barreto
Visagismo: Ricardo Moreno
Divulgação: Sidmir Sanches e Alan Diniz – Uns Comunicação
Produção Executiva: Alexandre Leandro
Adminstração: Marina Gama – Clan Design
Contrarregra: Roberto Prado
Assistente de Figurino: Kleyton Rigon
Assistente de Luz: Henrique Linhares e Lara Cunha
Operação de som: Anderlon Braga
Realização: Clan Design       
            

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Arte (RJ)


Foto: André Wanderley

O homem e os homens no debate sobre a racionalidade

            Dirigido por Emílio de Mello, o espetáculo “Arte” vem do texto mais aclamado da dramaturga francesa Yasmina Reza (1959). No Brasil, essa é a segunda vez que o texto é produzido, sucedendo a que Mauro Rasi dirigiu em 1999, com José Mayer, Luis Gustavo e Pedro Paulo Rangel no elenco. Dessa vez, os personagens Marcos, Sérgio e Ivan são interpretados por Marcelo Flores, Claudio Gabriel e Vladimir Brichta. Escrito em 1994, trata-se de uma comédia filosófica que investiga o lugar da valorização do homem e das relações em meio ao debate racionalista. De forma excepcional, Reza chama a peça de “Art”, um conceito tanto prático quanto teórico, tanto racional como emocional, tão cultural como mercadológico. Amigos há décadas, Marcos se espanta quando fica sabendo que Sérgio adquiriu um quadro completamente branco, pagando por ele uma quantia exorbitante. Os pontos de vista diferentes sobre a tela, sobre a arte, sobre a contemporaneidade são portas abertas para os três homens falarem de si, confessarem as suas desilusões, tratarem dos seus medos e, sobretudo, avaliar o sentimento que os une há tantos anos. “Arte” é a terceira incursão de Emílio de Mello no universo de Yasmina Reza, vindo depois de “O homem inesperado” (2006, com Nicette Bruno e Paulo Goulart no elenco), e de “Deus da Carnificina” (2010, com Paulo Betti, Orã Figueiredo, Júlia Lemmertz e Deborah Evelyn).
            A montagem atual traz três excelentes momentos: o texto esplêndido de Reza, a afinada interpretação dos atores e o perfeito casamento entre a trilha sonora de Marcelo Alonso Neves e a iluminação de Tomás Ribas. Inteligente e delicado, os diálogos de “Arte” se auto-referenciam, havendo repetição de frases em outros contextos e promovendo o riso a partir dessa experiência. Além disso, as situações apresentam os personagens ao mesmo tempo em que seus conflitos estão à mostra: a fúria de Marcos diante da compra de Sérgio, a preocupação de Ivan diante do próprio casamento e a alienação de Sérgio mergulhado na própria aquisição. Os silêncios são vivos, as cenas são ricas e a evolução é natural, sem a presença de qualquer estrutura dramática clássica, o que deixa o todo bem mais próximo do real além da narrativa. Acertadíssimo está o tom da interpretação dos atores: simples, com marcas apagadas de interpretações, movimentações discretas, sobretudo, em Flores e em Gabriel. Vladimir Brichta apresenta uma interpretação por vezes muito carregada, com expressões partiturizadas (feições planejadas, gestos desenhados) que exageram, em alguns momentos, a visão clownesca já disposta no texto de Reza. Por outro lado, o ator deixa ver uma sensibilidade tocante na sua atuação, o que equilibra positivamente o modo como é visto. Sutil como o texto, a direção musical acontece de forma totalmente integrada à obra cênica enquanto a iluminação está presente de forma tão nobre como é o tema da história. Pontuais e harmônicas, música e luz trazem ganhos estéticos valorosos à peça.
            “Arte” apresenta-se de forma negativa na relação íntima entre ritmo e cenário/figurino. A concepção de Mello apresenta Marcos como o antagonista da história, isto é, desde o início, seu discurso mostra-se como tolo, quase infantil. Faltam cores no cenário de Aurora de Campos e nos figurinos de Marcelo Olinto para que o quadro em questão possa ser desvalorizado e, assim, a posição de Marcos em relação a ele ter maior importância. Brancos, os fundos quase infinitos e as roupas essencialmente azuis, a tela fica harmônica, situando o espectador ao lado de Sérgio, aquele que adquiriu a obra, o que exibe um desequilíbrio. A discussão que cresce e decresce partindo dos diferentes olhares por sobre a tela branca perde força e é na voz que os atores sustentam os clímaxes e os anti-climaxes negativamente, o que causa inevitável cansaço em uma produção tão valorosa.
            A produção encerra a apresentação de “Arte” voltando-se para a proposta de Reza. De forma tocante, o final, expressivamente contemporâneo, apresenta um homem cruzando o espaço. O mais é assistir ao espetáculo para saber, se divertir, comover-se e aplaudir.

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Ficha técnica:

Texto: Yasmina Reza
Tradução e Direção: Emílio de Mello
Elenco: Vladimir Brichta, Marcelo Flores e Claudio Gabriel
Cenário: Aurora de Campos
Figurinos: Marcelo Olinto
Iluminação: Tomás Ribas
Criação Musical: Marcelo Alonso Neves
Preparação dos atores: Valéria Campos
Assistente de direção: Daniele do Rosário
Assistente de cenografia: Ana Machado
Diretor de palco: Marcos Lesqueves
Técnico de luz: Marcos Bile
Identidade visual: Olívia Ferreira e Pedro Garavaglia / Radiográfico
Assessoria de imprensa: Daniella Cavalcanti
Assistente de assessoria de imprensa: Bruna Amorim
Direção de produção: Dadá Maia e José Luiz Coutinho
Produção executiva: Wagner Pacheco
Assistente de produção: Michele Raja
Realização: M Brichta Produções
Produtores: Emílio de Mello, Marcelo Flores e Vladimir Brichta

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Isto é Brasil (RJ)


Foto: divulgação

Orgulho carioca

                “Isto é Brasil” é um belo espetáculo de dança dirigido e protagonizado por Carlinhos de Jesus, um dos maiores dançarinos do país. Com ele, em cena, estão dezessete bailarinos da sua Cia de Dança, dividindo o palco com Ana Botafogo, primeira bailarina do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, outro grande expoente da dança no Brasil. Estreado em 2004, o espetáculo faz parte hoje da programação de abertura do Theatro Net Rio, antigo Teatro Tereza Raquel, em Copacabana, Rio de Janeiro.
                Embora o título faça sugestão a uma galeria de danças que compõem o universo da cultura brasileira, pelo menos, representativamente, não é isso que se vê em cena. Número após número, assiste-se a diferentes evoluções da dança de salão, havendo menções ao frevo e ao ballet clássico. Na sua riqueza, “Isto é Brasil” apresenta uma parte do Brasil, talvez a mais conhecida, de forma rica na suas diversas possibilidades. Figurinos e iluminação engrandecem visualmente a obra, elevando os ganhos estéticos da produção já rica em detalhes. Thiago Fortunado e Vanessa Nascimento se destacam positivamente no ótimo grupo de intérpretes pela forma viva com que executam as belas coreografias.
                “Garota de Ipanema” e “Aquarela do Brasil” dividem os grandes momentos com a cena de abertura, em que se vê Carlinhos de Jesus, em ótima forma física, sozinho em cena. Sem que haja um só momento negativo, “Isto é Brasil” é um espetáculo que faz os brasileiros terem orgulho de serem cariocas.

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FICHA TÉCNICA 
Concepção, Roteiro e Direção Geral: Carlinhos de Jesus
Coreografias : Carlinhos de Jesus, Marcello Moragas, Hélio Bejani , Heron Nobre e Ana Paula Diniz
Direção de Palco: Carlinhos de Jesus
Direção de  ensaio: Rodrigo Marques da Silva
Texto e Rezas Angorossi: Zezé Motta
Sonorização e Iluminação: Daniel Ragi Eis e Wellington M. da Costa
Camareira: Andréia  Figueiredo e Rosemary Rodrigues
Assessoria de Imprensa: Natasha Stein e Renata Daflon 
Produção Executiva: Karina Alaor
Direção de Produção: Montenegro & Raman e Casa de Dança Carlinhos de Jesus
Elenco da Cia Carlinhos de Jesus: Alex Silva de Assis, Amanda Mendes Fonseca, Ana Carolina Silva Vila Nova, Ana Larissa Oliveira da Silva, Arthur Mendes Fernandes, Caroline Nascimento, Charles Fernandes, Dyogo Hortega, Michelle Barreto de Castro, Natália Andrade, Paloma Loretto, Rafael Silveira Fagundes, Raphael Rocha, Rodrigo Marques da Silva, Ronald Rosário Silva Passos, Thiago Fortunato e Vanessa da Silva Nascimento
Participação Especial: Ana Botafogo

sexta-feira, 11 de maio de 2012

À sua imagem e semelhança (RJ)


Foto: divulgação

História ruim contada de uma forma interessante

                “À sua imagem e semelhança” é um espetáculo produzido pelo grupo ComunidadeTeatral de Irajá (CTI) escrito e dirigido por Ribamar Ribeiro. A produção é amadora e aqui há que se fazer um esclarecimento sobre o termo. As produções teatrais se dividem em profissionais (quando há o objetivo de lucro e os profissionais envolvidos têm seus devidos registros nos das divisões regionais do trabalho após terem comprovado formação técnica ou acadêmica além de inúmeros trabalhos no mercado artístico), amadoras (quando os envolvidos têm suas atividades profissionais outras, dedicando-se à arte nas horas livres) e estudantis (quando os envolvidos apresentam trabalhos fruto ou parte de sua formação artística). Nos três níveis, há produções de alta ou de baixa qualidade e antever um resultado antes da obra ter sido vista não é outra coisa senão preconceito, o qual devemos sempre evitar. Participante do 33°Festival de Teatro da FETAERJ, Federação de Teatro Associativo do Estado do Rio de Janeiro, o espetáculo recebeu sete troféus (Prêmio Paschoalino) em diversas categorias. Agora está em cartaz no Teatro Municipal Ziembinski e ocupa, assim, uma janela de igual importância a dezenas de outras produções que se apresentam na cidade.
                O problema mais significativo de “À sua imagem e semelhança” é o texto. Com frases que se repetem num jogo até interessante, demora muito tempo para o espectador encontrar na obra resposta para o que exatamente está vendo. Então, a família (Pai, Mãe, Filho, Filha e Cachorro) apresentada no início ganha uma cena longa e há indícios de que a história está para começar. O conflito finalmente aparece: o filho morreu, mas a família não pode cuidar do seu enterro no momento porque a novela está para começar. Todo o cansativo jogo dramatúrgico que se viu até ali parece, enfim, fazer algum sentido. No entanto, a evolução desse conflito não se estabelece a contento. O tempo se perde, o espaço não se firma, a história não consegue se estabelecer. Sem tratar do tema de forma rica através de argumentos dissertativos, “À sua imagem e semelhança” é uma história mal escrita, ainda que contada, como será tratado a seguir, de forma interessante.
                A peça apresenta-se formalmente através do jogo de construção e de manutenção de uma linguagem cheia de códigos. As interpretações se dão a ver, nesse sentido, através de muitas marcas que escondem a espontaneidade, afastando-se do real além da narrativa. O efeito apresenta resultados interessantes do ponto de vista da narrativa, da estética e da produção. Primeiro, porque o espetáculo consiste em uma crítica à importância da televisão na vida do homem comum e, sendo assim, o trato com os seus códigos, muitos deles cristalizados pelo tempo e pela audiência constante, é positivo. Segundo, porque o excesso de marcas dá unidade estética ao todo e pode, do jeito como estão dispostos, divertir. Por fim, em se tratando de atores inexperientes, asseguram à produção ganhos de qualidade esperados, de forma que não há destaques no elenco, nem positivos e nem negativos.
                                Ficam, por fim, os figurinos de Cris Silva, que propõem uma estética potente, e um cenário ilustrativo de Rafael Balthazar e Ribamar Ribeiro, que é pouco utilizado além de um jogo cênico vivo embora superficial. Felizmente, acima de tudo, a graça de um elenco grande e jovem, unido em um só grupo, tratando com seriedade o teatro que apresenta ao público.

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FICHA TÉCNICA:
Texto e Direção: Ribamar Ribeiro
Elenco: Carola Prado, Cris Ventura, Fagner Falcão, Felipe Ferraz, Gustavo Araujo, Juliana Amorim, Leo Morais, Márcia Maia, Rafael Balthazar, Rodrigo Villas Boas, Talita Fusco e Zia Fatah.
Cenografia: Rafael Balthazar e Ribamar Ribeiro
Maquiagem: Getulio Nascimento
Figurinos: Cris Silva
Sonoplastia: Ribamar Ribeiro
Operação de som: Iamonã Vilhena
Iluminação: Bruno Caverninha
Produção: Cris Silva
Realização: Comunidade Teatral de Irajá - CTI

quarta-feira, 9 de maio de 2012

O que você gostaria que ficasse? (RJ)


Foto: divulgação

A celebração da humanidade

                “O que você gostaria que ficasse” é um espetáculo teatral que surge a partir de uma pesquisa coletiva sobre o universo significativo sugerido no livro “O mundo sem nós”, de Alan Weisman, em que o autor imagina o processo de desaparecimento da humanidade já que nenhum dos meios de preservação existentes perduraria sem que o homem estivesse presente. Em termos estéticos, o mérito maior de “O que você gostaria que ficasse” está em unir o conteúdo à forma, a mensagem ao canal, o emissor ao receptor. A interatividade é usada de forma que o público participa da construção da história efetivamente. Quem assiste à peça é convidado a voltar no tempo. Lado a lado, a plateia se identifica entre si enquanto constrói um momento de rara beleza.

                Com texto e direção assinados por Miguel Thiré, que outrora dirigiu os meritosos “Superiores” e “Dois para viagem” (esse em conjunto com Jô Bilac), a produção, vista pela teoria, constrói um espetáculo a partir da celebração do encontro, do teatro enquanto resultado de uma relação convivial (ver Jorge Dubatti) em que pessoas se reúnem e são testemunhas e produtores de poética ao mesmo tempo em que são a poética. Os atores Cynthia Reis, Eduardo Cravo, Jarbas Albuquerque, Raquel Alvarenga e Suzana Nascimento deixam no palco coisas que gostariam que ficassem na possibilidade de seu desaparecimento. A discografia dos Beatles em fita cassete, os quadros de Van Gogh, uma câmera fotográfica Polaroid são alguns exemplos. O público é delicadamente convidado a participar e atende ao convite com carinho, deixando também suas pequenas “heranças” através de desenhos feitos no chão com giz. O público deixa a sua marca, as pessoas existem, a história acontece. Surge uma personagem cuja vida é feita de respostas ouvidas pelos atores a partir de perguntas feitas ao público, de forma que, em cada apresentação, é outro o protagonista. O momento ganha marcas visíveis de unicidade e de grande valor estético.
                Em “O que você gostaria que ficasse”, a fluidez da narrativa faz dupla com uma fluidez estética felizmente. O clima  que as cores e as formas dos objetos imprimem localizam a história em um lugar que já passou e a trilha sonora de João Thiré acompanha o significado propondo reflexões sobre o tempo. A direção de arte de Junior Santana, em que trilha, cenário, figurino e iluminação se encontram, é um exemplo de quão próximos estão os signos estéticos das conseqüências significativas de sua fruição.
                O tom de voz é cálido, a movimentação é suave, o ritmo caminha pausada e docemente. Em tudo, está o valor do ser humano, personagens de uma história que acontece todos os dias em um cenário grandioso que chamamos de universo. A ver!

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Ficha técnica:
Concepção e direção: Miguel Thiré
Elenco: Cynthia Reis, Eduardo Cravo, Jarbas Albuquerque, Raquel Alvarenga e Suzana Nascimento
Assistência de direção: Paulo Mathias Jr. e Raquel Alvarenga
Direção de arte: Junior Santana
Trilha sonora original e seleção musical: João Thiré
Iluminação: Cadu Fávero
Projeto Gráfico: Raquel Alvarenga
Fotos: Antônio Pessoa
Produção Executiva: Ana Rios e Bruna Oliveira
Assistência de produção: Beatriz Novellino
Direção de Produção: Jarbas Albuquerque
Produção Geral: Thijoana Filmes
Realização: Brecha Coletivo

sábado, 5 de maio de 2012

Super Coffin ou Sonho de uma Noite de Velório (RJ)


Foto: divulgação

Teatro popular de qualidade

                “Super Coffin ou Sonho de uma Noite de Velório” está há 13 anos no repertório de OsCiclomáticos Companhia de Teatro, grupo que, neste ano, assumiu a gestão do Teatro Municipal Ziembinski, no bairro Tijuca, zona norte do Rio de Janeiro. Escrito por Odir Ramos da Costa, o texto consiste em uma farsa bem aos moldes de Moliére, Martins Pena e Ariano Suassuna. Os personagens se apresentam com marcas bastante fortes que os distanciam uns dos outros pela oposição, reconhecendo-se, assim, no contexto da trama que evolui de forma clara e ágil. Na história, Benvindo Seja da Silva é o dono da representação brasileira da multinacional Super Coffin, uma empresa do ramo funerário que, então, completa 25 anos no Brasil. Quis o destino que, na mesma data, a funerária estivesse na iminência de vender o seu 50.000º caixão, um número simbólico. Para comemorar o feito, Benvindo contrata um publicitário (Azevedo) para criar e executar uma campanha a fim de estimular as vendas. Apesar de irresistíveis promoções, ocorre que o 50.000º defunto não surge, obrigando Benvindo a questionar as propagandas que têm sido veiculadas a respeito da sua empresa. Enquanto isso, na fábrica de caixões, um antigo funcionário falece, mas deixa como último pedido não ser enterrado em um caixão da Super Coffin. Valores morais e religiosos entram em jogo na decisão da viúva: ser fiel à vontade do marido ou vender-se às promessas do patrão.
                Dirigido por Renato Neves, a comédia tem um ritmo rápido, que providencia à narrativa a agilidade que ela requer. Construídos superficialmente, os personagens são apresentados ao público pela ratificação de marcas, facilitando a identificação e possibilitando a auto-referenciação ao longo da peça. O cunho popular, que caracteriza o gênero em sua raiz, está exposto nas piadas de cunho sexual, na crítica ao fanatismo religioso, na malandragem, na corrupção e no deboche. O palco está quase o tempo inteiro limpo de forma que a movimentação acontece a contento. De um modo geral, as interpretações garantem um discurso fluído, com boas dicções, corpos ágeis e olhares irônicos capazes de transformar cenas simples em grandes momentos cômicos. Talvez o maior valor da direção seja o fato de manter constante o surgimento de “surpresas”, vencendo o desafio da monotonia de forma bastante criativa. Há, no entanto, alguns problemas. Um deles é a divisão do foco. Em várias cenas, a atenção está dividida em duas ou três partes, de forma que o texto está sendo dito em um lado do palco e, em outros dois, outras situações estão concorrendo com ela de forma gratuita e, por isso, negativa. Outra questão é a sustentabilidade do ápice. Em determinado momento da história, há uma cena que se repete três vezes, cada uma, de forma diferente. A forma como a sequência acontece dá a ver a sua eleição como o ponto alto da peça, de forma que tudo o que vem depois dela constitui o desfecho. “Super Coffin” é um espetáculo tradicional e que apresenta, como já se disse, uma estrutura aristotélica. Logo, espera-se que as resoluções aconteçam rapidamente, encerrando a fruição no momento alto. Infelizmente não é o que acontece. As cenas finais são longas, havendo um epílogo maior ainda. Como não poderia deixar de ser, o ritmo cai vertiginosamente.
                O elenco é composto por um grupo afinado e criativo. Fabio Alavez (Benvindo), Getúlio Nascimento (Basofia) e Júlio César Ferreira (Macadame) são as melhores participações, porque apresentam interpretações vivas com marcas fortes de espontaneidade. Sem dizerem uma só palavra, Fernanda Dias, Juliana Santos, Carla Meireles (Coffin Girls) e, sobretudo, Mauro Carvalho (a Secretária) se tornam essenciais na narração pela forma pontual com que ampliam as potencialidades cômicas da produção. É difícil de se compreender o que diz Nívea Nascimento (a Crente Nanete) na primeira metade do espetáculo, assim como há que se observar que o ritmo cai nas cenas em que atua Fabíola Rodrigues (Dona Emerenciana), talvez, em função da voz escolhida. Há um excesso de histrionismo no trabalho de interpretação de Ribamar Ribeiro (Azevedo) que é igualmente prejudicial.
                Os aspectos visuais de “Super Coffin ou Sonho de uma Noite de Velório” são positivos dentro da função que executam. O ponto alto do cenário de André Vital está na presença da estátua de São Jorge sempre iluminada a contrastar com a forte presença da personagem evangélica. Os figurinos, também assinados por Vital, são ricos, elevando o resultado estético da produção, sobretudo quando, na segunda parte da peça, exploram-se variações do roxo, cor litúrgica da penitência e, simbolicamente, da espiritualidade. A opção pela discomusic, na trilha sonora, é coerente com a concepção do espetáculo que localiza a história nos anos 70, mas oferece um grave problema à fruição da peça: o volume da operação é desreguladamente altíssimo.
                Em cartaz no Teatro Municipal Ziembinski, “Super Coffin ou Sonho de uma Noite de Velório” acontece em paralelo à exposição “Os Ciclomáticos Companhia de Teatro 16 anos de Vivência”. O grupo, pelo espetáculo e por chegar nesta etapa de sua história, merece aplausos.

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Ficha técnica:
Autor: Odir Ramos da Costa
Direção: Renato Neves

Elenco:
Fabio Alavez - Senhor Benvindo
Mauro Carvalho - Secretaria
Ribamar Ribeiro - Azevedo
Fabiola Rodrigues - Dona Emerenciana
Getulio Nascimento - Basofia
Julio Cesar Ferreira - Macadame
Nívea Nascimento - Nanete
Carla Meirelles - Coffin Girl 
Juliana Santos - Coffin Girl
Fernanda Dias - Coffin Girl

Cenografia, Figurinos e Maquiagem: André Vital
Sonoplastia: Renato Neves
Iluminação: Mauro Carvalho
Produção: Ribamar Ribeiro
Realização: Os Ciclomáticos Companhia de Teatro

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Eclipse (MG)


Foto: divulgação

 Uma produção rara

                “Eclipse” é o novo espetáculo do célebre grupo teatral mineiro Galpão, a segunda produção resultante do projeto “Viagem a Tchékhov”, que também desencadeou o espetáculo “Tio Vânia (Aos que vierem depois de nós)”, ambos em 2011. Dirigido por russo Jurij Alschitz, a dramaturgia é resultante da análise de 150 contos do dramaturgo Antón Tchékhov (1860-1904) e se constitui em um espetáculo adramático, estando, assim, no “meio do caminho” entre os Diálogos de Platão, que ocupa um dos extremos, e as peças de Samuel Beckett, que estão em outra ponta. Algumas marcas justificam essa leitura: a ausência de personagens, a negação do tempo e a indefinição do espaço. (Nesse sentido, a produção se afasta do teatro do absurdo em que há personagens, tempo e espaço bem definidos, embora constantemente autosubstituídos sem lógica aparente na constituição do próprio drama.) Em cena, figuras dialogam sem que seja possível identificar alguma curva dramática, norma, autorreferenciação ou coerência. O espectador deve se preparar para um tempo alargado, convite aberto para a monotonia e a sonolência nesse contexto de reflexões filosóficas, abstrações apuradas e significados aparentemente sem significantes.
                O caráter da arte, a constituição dos valores, a importância da fé, a humanização do ser humano são assuntos na pauta das figuras que pairam entre um eclipse solar. Algumas histórias são contadas, um ovo de gaivota aparece, vem a neve: de forma divergente, os acontecimentos surgem, as palavras são trocadas, o bom teatro aparece nesse raro e apurado tipo de obra. Em termos estéticos, o Grupo Galpão, que assina espetáculos conhecidos mundialmente como “Romeu e Julieta” e “Na Rua da Amargura”, entre vários outros de seu repertório constituído há 30 anos, não decepciona. Chico Pelúcio, Inês Peixoto, Julio Maciel, Lydia Del Picchia e Simone Ordones apresentam discursos verbais com excelentes oratórias, desenhando visualmente movimentações que contribuem para o todo positivamente: marcas limpas, ritmo regular, foco organizado de forma harmônica. Cenário e figurino, também assinados por Alschitz, utilizam o preto e o amarelo e as cores da bandeira russa (branco, azul e vermelho), tons bastante significativos para o autor russo celebrado. A iluminação de Chico Pelúcio e de Bruno Cerezoli é responsável por boa parte dos momentos mais belos da encenação, dividindo o pódio com as projeções em vídeo de André Amparo, Chico de Paula e Bruno Cardieri.
                Oferecendo mais uma obra de qualidade ao teatro brasileiro, o Grupo Galpão providencia ao seu público o resultado de um trabalho sério de pesquisa em linguagem teatral, além de um sólido conhecimento acerca da obra de um dos dramaturgos universais mais importantes.

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Ficha técnica:

Elenco: Chico Pelúcio, Inês Peixoto, Julio Maciel, Lydia Del Picchia e Simone Ordones
Direção, Dramaturgia, Cenografia, Figurino e Treinamento: Jurij Alschitz
Assistência de Direção e Preparação Vocal: Olga Lapina
Assistência de Direção e Pesquisa de Figurino: Diego Bagagal
Direção Musical e Arranjos: Ernani Maletta
Iluminação: Chico Pelúcio e Bruno Cerezoli
Vídeo Projeção: André Amparo, Chico de Paula e Bruno Cardieri
Sonoplastia: Ricardo Garcia
Caracterização: Mona Magalhães
Coreografia: Jomar Mesquita
Tradução: Eloquent Words
Revisão de textos: Eduardo Moreira e Arildo de Barros
Assistência de Cenografia: Amanda Gomes
Cenotécnica: Helvécio Izabel
Construção de Adereços: Tião Vieira e Glauber Apicela
Fotos: Guto Muniz, Miguel Aun e Bianca Aun
Projeto Gráfico: Laura Bastos
Assessoria de Comunicação: Beatriz França
Estagiários de Comunicação: João Luis Santos e Jussara Vieira
Assistência de Produção: Evandro Villela
Produção Executiva: Anna Paula Paiva e Beatriz Radicchi
Coordenação de Produção: Gilma Oliveira
Apoio Institucional: Instituto Unimed-BH
Patrocínio: Petrobras 

Até que a sogra nos separe (RJ)


foto: divulgação

Bom teatro em espetáculo ruim

                “Atéque a sogra nos separe” é uma comédia romântica dessas muitas que se vê na televisão todos os dias, atendendo a um mercado próprio, movimentando a economia, preenchendo os espaços. Tem o seu valor e, como uma obra de arte, merece respeito e admiração. Escrita, dirigida e interpretada por Anderson Oliveira, tem como seu principal ponto positivo a despretensão e pouco deve ser cobrado de quem promete pouco. Uma comédia romântica é um gênero como qualquer outro a guisa dos gostos pessoais de cada um. Quem não gosta do gênero não vá ver uma peça dele. Aqui gosta-se de teatro seja em qual atualização for.
                Estamos dentro do realismo, mais especificamente, fruindo uma de suas muitas variações. Os acordos com o real além da narrativa precisam ser bem amarrados, a peça precisa garantir altíssimos graus de verossimilhanças para que as quebras desses acordos sejam manifestadamente opções estéticas relevantes ao desenvolver da história. A coerência interna é importante, porque é ela quem pode garantir o ritmo rápido que a dramaturgia necessita. Acreditando no visual, o espectador vai prestar a atenção na história. (Não é à toa que José de Alencar gastou quinze páginas descrevendo o rio Paquequer antes de apresentar Peri. Não é por nada que as emissoras de TV investem pesado em cidades cenográficas, direção de arte perfeita e alta tecnologia em qualidade de imagem.) Nesse contexto, o cenário de Luciano Heiras é o pior de todos os equívocos de “Até que a sogra nos separe”. Composto de três mini palcos, a ambientação não garante, em um só centímetro, a adequada relação com o real além da peça. Quando as cortinas se abrem e se vêem painéis grandiosos em madeira bruta, sem pintura, com pregos aparecendo, canos de metal à mostra e samambaias de plástico, encontram-se muito mais motivos para ir embora do que para ficar e assistir à história que será contada ali. No closet, há duas ou três peças de roupas. Na sala, um fundo vermelho de gosto duvidoso e uma mesa auxiliar com uma tolha igualmente vermelha. Na sala de jantar, um fundo laranja, mesa e cadeiras em madeira pesada. Os três ambientes estão separados entre si, a trinta centímetros do chão, de forma que os atores pulam de um estrado a outro, usando ainda a parte externa sem qualquer relação com a história. Nesse contexto visual complicado, fica difícil analisar com eficiência os figurinos, porque sua paleta de cores e variedade de texturas se misturam negativamente com a ambientação de forma infeliz. O mesmo se diz da iluminação.
                Vencendo o desafio de atravessar o grandioso cenário, é possível identificar a história escrita em parceria com Maria Clara Horta e os personagens. Um casal, Carlos Alberto e Bia, encontra-se em crise na iminência da separação. Inicia um flashback, partindo do primeiro encontro no corredor da faculdade (o velho e batido clichê: os dois se esbarram, livros caem.) quando se descobre que ela estuda teatro e ele biologia (Outra falha da direção de arte, Carlos Alberto está com um livro de teatro nas mãos e não faz menção alguma sobre isso. Em outro momento, ele tira o significado de uma palavra em português de um dicionário de inglês) e são, dentro do contexto, opostos que se atraem - ela fuma, bebe, não come carboidratos, é artista. Ele usa óculos, não tem vícios e é filho de uma dona de restaurante italiano. A história avança evidenciando as diferenças entre os dois que não o impedem de seguir adiante no relacionamento no melhor jeito “Eduardo e Mônica” de ser. Desafio após desafio, os dois seguem juntos e a dramaturgia, valorosa nesse aspecto, enche a escalada de momentos fortes: o vestido do casamento escolhido pela mãe de Carlos Alberto e a visita de Maurício, o irmão de Bia, são algumas passagens interessantes. Então, quarenta minutos após a peça ter começado, entra Gioconda, a mãe do marido, a sogra da esposa. A pergunta é: será que eles vão vencer mais esse problema? Com situações bem marcadas, um texto fácil e diálogos superficiais, a dramaturgia atende ao gênero e satisfaz quem acertadamente não esperou por conversas requintadas, frases com segundas intenções e piadas ácidas. O humor de “Até que a sogra nos separe” é rasteiro e isso, deus nos livre do preconceito, não é ruim: palavrões, escracho e malandragem sempre fizeram rir e devem ter respeitado o seu lugar na arte popular. O final é bastante interessante, providenciando à narrativa um novo desafio ainda maior, o que é positivo.
                A direção oferece um olhar equilibrado por sobre a construção dos personagens. Gioconda (Anderson Oliveira, a sogra), Maurício e Juan (André Sobral, respectivamente, o cunhado e o namorado) partiram de estereótipos e conseguem o riso do público com facilidade, estando em Oliveira os melhores momentos da peça pela sua presença vibrante. (Eles são as “quebras” dos acordos com o real de que se falou acima.) Já os protagonistas Bia (Fernanda Zau) e Carlos Alberto (Daniel Müller) são mais próximos do real além da narrativa, com mais marcas de profundidade e, por isso, os responsáveis pela dramaticidade. De um modo geral, todas as interpretações estão adequadas, agregando aspectos positivos à obra.
                A ideia mais sublime de teatro é a de que A interpreta B diante de C. Se o teatro aqui não aparece na sua melhor possibilidade, o grande culpado é um elemento visual, o que faz pensar sobre a distância entre o conceito de teatro e o conceito de espetáculo. “Até que a sogra nos separe” pode não ser um grande espetáculo, mas, sem dúvida, oferece um teatro que pode e deve ser aplaudido.

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Ficha técnica:
Texto: Anderson Oliveira e Maria Clara Horta
Direção: Anderson Oliveira
Elenco: Anderson Oliveira, Fernanda Zau, Daniel Müller, André Sobral
Cenário: Luciano Heiras
Gerente de Produção e Designer: Domingos Santana
Ass. de Produção: Fabrício Neri e Ronize Carrilho
Diretor de Produção: Leandro Barbalho
Assessoria de Imprensa: Fábio Amaral - Minas de Idéias
Operador de Som: Marcos Ribas
Operador de Luz: Anderson Schinaider
Produção e Realização: BKL PRODUÇÕES E R&A PRODUÇÕES

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Traição (RJ)


Foto: Guga Melgar

Uma pérola

                “Traição” (Betrayal) foi escrito em 1978, recebendo o prêmio Laurence Olivier de melhor texto no ano seguinte. Faz parte da última fase do escritor inglês Harold Pinter (1939-2008), talvez, um dos melhores dramaturgos da segunda metade do século XX. O tom trágico visto a partir da ótica da contemporaneidade é a marca da civilidade dos personagens que discutem os seus relacionamentos, os seus acordos, as suas opiniões em lugares públicos ou privados, mas sempre muito bem vestidos, tomando bons vinhos e com um humor tácito e ácido. Não é o destino divino (tragédia grega) que os aprisiona, tão pouco o tempo e a necessidade de conquistar (Beckett), mas os privilégios da burguesia: casas bem decoradas, empregos fascinantes, viagens incríveis. Tudo isso é moeda de troca em mesas de restaurantes quando amigos se encontram, quando mulheres exibem seus maridos, quando amantes brincam de ser irresponsáveis, não os sendo realmente. Nesse Pinter, não há loucura, mas uma racionalidade ardilosa que vira doce não pelo tempo, nem pela circunstância, mas pela força necessária de sua existência. E é, por representar cenicamente todo esse movimento de tensões tão bem engendrado que Ary Coslov e Leonardo Franco colecionaram prêmios valiosos pela sua montagem de “Traição”, em 2008, felizmente (com ênfase no “felizmente”) ainda em cartaz no Solar de Botafogo nesse outono de 2012. A produção, nos segundo iniciais, quando ainda ninguém falou, mas a luz já cresce vagarosamente sobre Emma (Vanessa Lóes), manda uma mensagem clara ao espectador: este vinho é caro e é para ser degustado com delicadeza, atenção e respeito.
                Harold Pinter está no exato oposto de Woody Allen, outro importante dramaturgo da segunda metade do século que também discute as relações sob a égide da civilidade aprisionante. A diferença é que, em Allen, está nas palavras o jogo essencial da narrativa enquanto, em Pinter, a beleza está no silêncio. Ao dirigir “Traição”, Coslov não constrói tempos mortos, mas torna as pausas um vibrante vetor onde as tensões se aguçam e se acalmam, onde o baile realmente acontece. Quando há a fala, o texto serve como um limiar em que o ritmo ou mudará ou permanecerá o mesmo, mas marcadamente será sinal de que há algo no passado que não voltará mais, a última frase não será repetida. Daí que a oratória de Leonardo Franco (Robert), de Vanessa Lóes (Emma) e de Pablo Padilha (Jerry) não pode ser considerada apenas pelo seu conceito clássico que previa o ritmo e a perfeição como as sílabas saem da boca, mas como joga o corpo, os olhares, a respiração nesse campo de sutil expressão. Mortal para grande parte das peças, o ritmo lento aqui é uma exigência, assim como um pré-requisito. Franco, Lóes e Padilha estão excelentes porque cultivam os detalhes de suas representações nesse clima, ao mesmo tempo, científico e amoroso.
                Em “Traição”, (que virou filme em 1983, sob direção de David Jones) há várias relações em choque: Robert e Emma são casados. Robert e Jerry são melhores amigos. Emma e Jerry são amantes. Jerry é casado com outra pessoa. Robert tem outras amantes. Emma, talvez, também tenha. Personagens ricos e relações em choque são elementos que constroem um excelente texto. A maestria de Pinter vai além: a narrativa aqui é reversa. A primeira cena acontece, em 1977, quando tem fim o relacionamento de Emma e de Jerry. A última cena é bem antes disso. Mais do que ao leitor do texto, ao espectador da peça está dado o desafio: reconhecer nos personagens o que eles sabem naquele momento de suas vidas em relação ao outro, os não-ditos, as estruturas profundas. É Leonardo Franco, na excelência de seu trabalho como ator, quem providencia os momentos de êxtase: a ironia, os segredos, a viagem solitária, a opção. Nem vítima, nem algoz, ele é a versão pós-moderna da Winnie beckettiniana.
                Os signos estético-visuais estão exatamente regidos pela mesma ordem, o que argumenta em favor do preciosismo dessa montagem. Marcos Flaksman assina com genialidade o cenário, apresentando no fundo do palco nichos de onde são retirados os móveis que compõem cada cena. Três questões são fundamentais nessa rápida análise do cenário: a beleza dos móveis, que são vivos pela gastura do tempo ou pela sua despretensiosa leveza; o tempo que é destinado em retirá-los do lugar, colocá-los em cena e, depois, guardá-los novamente em lugar sempre visível; e, por fim, o fato de poderem ser lidos como gavetas, mais uma expressão cênica da racionalidade do texto de Pinter: cada coisa tem o seu lugar, cada um é algo diante do outro, a sociedade se organiza de forma funcional. Os figurinos de Rô Nascimento e a iluminação de Aurélio de Simoni agem bem em duas frentes: informar (sabemos o ano, a classe social, onde está o foco) e embalar, propondo contradições (o casaco pesado que afoga a leveza, a escuridão que ilumina mais do que a luz – sobretudo em uma das cenas de Franco.). Na trilha sonora, ouve-se, em sua maioria, Eric Clapton, a voz de uma era, mais uma marca coerente que ratifica o discurso do momento que não voltará.
                                Minutos antes da peça começar, um anúncio sonoro divulga outros espetáculos em cartaz. Um deles, apenas pelo título, se mostra como uma comédia romântica que trata sobre relacionamentos entre homem e mulher. Depois de Harold Pinter, a representação teatral desse tipo de embate ficou mais difícil ser tão nobre, tão perspicaz, tão essencial. Por tudo o que se disse, “Traição”, o texto e a peça, são pérolas.

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Ficha técnica:

Texto: Harold Pinter
Tradução: Isio Ghelman
Diretor: Ary Coslov
Assistente de Direção: Marcelo Aquino
2º Assistente de Direção: Marcela Andrade

Elenco:
Vanessa Lóes
Pablo Padilha
Leonardo Franco
Cleiton Echeveste

Cenário: Marcos Flaksman
Assistente: Andréa Renck
Estagiária: Priscila Mealli
Cenotécnico: Jober Torres
Figurinos: Rô Nascimento
Assistente: Fernanda Fabrizzi
Iluminação: Aurélio de Simoni
Visagismo: Marina Beltrão
Videomaker: Paulo Severo
Operador de Luz e de Som: Rúbia dos Reis Vieira
Programação Visual: Conecta Design e Mayra Pereira
Assessoria de Imprensa: Adriana Sanglard e George Patiño
Produção Executiva: Maria Maria Griffith
Direção de Produção: Leonardo Franco
Realização: Centro Cultural Solar de Botafogo e Arcos Produções Artísticas