segunda-feira, 31 de outubro de 2016

Abalou, um musical funk (RJ)

Curta nossa página no Facebook: www.facebook.com/criticateatral
Siga-nos no Instagram: @criticateatral
Foto: Paiva Fotografias


Elenco feminino em cena

Muitos problemas na nova montagem do Nós do Morro

“Abalou, um musical funk” é outra produção do Grupo Nós do Morro que faz parte da celebração de seus trinta anos ao lado de “Bataclã”. A peça, em uma narrativa, reinventa a história do funk, situando o Morro do Vidigal (e uma série de estereótipos ligados aos seus moradores) como protagonista da história. Com vinte e sete atores no elenco, é possível identificar alguns aspectos positivos nas atuações de alguns, mas nenhum trabalho relevante. O texto de Luís Paulo Corrêa e Castro é o pior elemento em cena e o figurino de Gorette Bezerra o melhor. A montagem ficou em cartaz no Teatro de Arena do Espaço SESC Copacabana até a última quinta-feira, dia 27 de outubro.

Barrigas enormes na dramaturgia
Na peça escrita por Luiz Paulo Corrêa e Castro, em algum lugar do fim dos anos 90, surge um compositor chamado Maestro (Dhonata Augusto), que grava fitas em que sons da natureza, música clássica e popular brasileira se misturam ao rap, resultando, em sua opinião, em algo novo e mais qualificado. O artista busca apoio do famoso produtor Big Boy (João Okame), mas ele não está interessado em inovações. As meninas do bairro, no entanto, se interessam em ouvir o trabalho, mas a maior parte delas igualmente não valoriza o material.

As meninas se dividem em dois grupos inimigos entre si. De um lado, há a evangélica Cleuséia (Clara Nery) e suas amigas. De outro, há Martinha (Camila Monteiro) e as suas, todas frequentadoras dos bailes e da praia da comunidade. Brigando por causa dos homens, elas duelam durante toda a encenação, acusando-se mutuamente de ir atrás dos MCs mais famosos. No centro da narrativa, está Tininha (Mariana Alves), o melhor papel dessa dramaturgia.

O mesmo Big Boy que dispensou Maestro como artista está apaixonado por Tininha. Ela, por sua vez, se apaixona por Maestro quando ouve sua canção, mas ele não percebe esse sentimento. Quando ela decide ajudar o amado a fim de conquistá-lo, o público reconhece o risco disso, pois, sem querer, ela pode exterminar as chances de Maestro quanto ao seu futuro profissional ao lado de Big Boy.

O conflito central, que aparece e se desenvolve de modo muito lento, se resolve de um jeito bastante empobrecido. Ricardo (Murilo Sampaio), Eládio (Flávio Mariano) e Waldemar (Alexandre Cipriano) são três fantasmas que assistem a tudo o que acontece. Com pena de Tininha, eles decidem ajudá-la na conquista de Maestro. Depois disso, rapidamente a história se termina.

Sobram barrigas enormes na narrativa que dura quase duas horas. Em vários momentos, toda a trama central cede lugar para as brigas entre os grupos de meninas, as lutas delas pelos meninos e as fugas deles em relação a elas. Enquanto isso, o público tem acesso a um emaranhado de situações que podem dar a ver um panorama geral da história do funk, mas esse sem revelar uma pesquisa realmente aprofundada. A título mais de análise do que de comparação, vale lembrar do musical “Funk Brasil – 40 anos de baile” que muito recentemente esteve em cartaz e que se dedicou brilhantemente ao mesmo tema.

Encenação ratifica preconceitos
A direção de Guti Fraga, transformando o Morro do Vidigal em elemento de linguagem, “chapa” os personagens, tornando-se todos uma coisa só. Sensualidade aflorada, voz anasalada e em volume alto, tom agressivo e comportamento hedonista são traços presentes em todas as representações sem qualquer quebra que realmente possa aproximar o contexto do real. É isso exatamente o que foi vendido pela televisão e pelo cinema ao longo das décadas.

Além disso, Fraga, assistido por Sabrina Isnard, não aproveita as chances para estruturar qualquer tipo de antagonismo que pudesse valorizar Tininha, a protagonista. A única coisa que age contra ela, na narrativa da peça, é o fato de que Maestro está muito mais preocupado com sua carreira e, por isso, não nota o que ela sente por ele. Ou seja, se lido como um melodrama, “Abalou, um musical funk” recebe avaliações negativas. Se lido como de outro gênero ou estilo, o resultado é ainda pior.

Há 27 atores em cena, mas nenhum com grande destaque em sua interpretação. Aqueles que mais chamam a atenção são beneficiados pelo modo como, através de ótimo carisma, conquistam o público com suas presenças mais fortes. Esses são: Camila Monteiro (Martinha), Deivison Santos (Lagartão), Mariana Alves (Tininha) e principalmente Clara Nery (Cleuséia), Marília Coelho (Severina) e João Okame (Big Boy). Nesses três últimos, de modo positivo, é possível identificar ótimos usos das intenções nos diálogos.

O figurino de Gorette Bezerra promove um colorido interessante que fica ainda melhor pela enorme variedade de texturas. No entanto, é mais uma perda de oportunidade do espetáculo de se definir no tempo, pois, apesar do diálogo fazer algumas referências ao fim dos anos 90, há dados que confundem as últimas décadas também no vestuário e no visagismo (Angélica Ribeiro). O cenário de Fernando Mello da Costa, em que várias telas compõem, em um jogo de frente e verso, paisagens múltiplas, é bonito nos primeiros minutos, mas tem sua força diminuída gradativamente ao longo da sessão pela poluição visual do todo. Mantendo os atores sempre virados para frente, a direção de movimento de Johayne Hildefonso perde a chance de conseguir melhores resultados. No entanto, as coreografias, considerados o número de atores do elenco e o tamanho do palco, merece elogios. Quanto à direção musical de João Gurgel e de Júnior & Leonardo, a situação é bem problemática. Com exceção de João Okame, nenhum intérprete tem voz ou afinação para interpretar as canções de repertório ou as originais que fazem parte da narrativa. Destaca-se o terrível desarranjo de “Carinhoso” na apresentação que aqui se analisa.

Sem brilho
Sem ser uma oportunidade qualificada para tratar a história do funk, nem tampouco uma história bem contada, “Abalou”, que teve algum destaque em 1997 em sua primeira montagem, agora não retoma o seu brilho infelizmente. É uma pena.

*

FICHA TÉCNICA
Texto: Luís Paulo Corrêa e Castro
Direção: Guti Fraga
Assistente de Direção: Sabrina Isnard
Elenco: Alexandre Cipriano, Alice Coelho, Bruno Borges, Camila Monteiro, Clara Nery, Danilo Martins, Danilo Martins, Deivison Santos, Dhonata Augusto, Flavio Mariano, Iohanna Carvalho, João Gago, Leilane Pinheiro, Mariana Alves, Marília Coelho, Murilo Sampaio, Nathalia Altenbernd, Ramon Francisco, Sonia Magalhães, Taiana Bastos, Thais Dutra, Thiago Vicente e Vandinho Ribeiro.
Cenografia: Fernando Mello da Costa
Iluminação: Márcia Francisco
Figurinos: Gorette Bezerra
Direção Musical e músicas originais: João Gurgel e Júnior & Leonardo
Direção de Movimento e Coreografias: Johayne Hildefonso
Preparação Corporal: Vanessa Soares
Técnica Vocal: Isabel Schumann
Instrutora de canto: Letícia Vasconcellos
Operação de som: Danilo Martins
Operação de luz: Lívia Ataíde
Visagismo: Angélica Ribeiro
Camareiras: Cláudia Ramos
Costureira: Cláudia Ramos
Assistentes de Produção: Tatiana Delfina e Kiko de Moraes
Produção Executiva: Márcio Lopes
Direção de Produção: Dani Carvalho

Um comentário:

  1. Claudinha obrigada pelo seu bom senso

    http://lulacerda.ig.com.br/teatro-por-claudia-chaves-30-anos-de-nos-do-morro/

    ResponderExcluir

Bem-vindo!