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Joana Lerner à frente |
Muito para ser aplaudido
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FICHA TÉCNICA
Direção/pesquisadora - Diana Herzog
Produção criativa/pesquisadora - Valéria Martins
Atrizes/pesquisadoras - Joana Lerner, Lilia Wodraschka Priscila Assum, Natasha Melman e Renata Ravani
Direção de Movimento/pesquisadora - Duda Maia
Iluminação - Luiz André Alvim
Cenário e Figurino - Elisa Faulhaber
Assistência de direção/pesquisadores - Maíra Kestenberg
Produção Executiva: Cida de Souza
“Nora” é o ótimo espetáculo atualmente em cartaz na Sede das Cias. Ele é dirigido por Diana Herzog, sendo o seu trabalho de conclusão na graduação em Estética e Teoria do Teatro na Unirio. A peça consiste em um documentário sobre temas ligados ao feminismo – conceitos de masculino e de feminino, relações sociais e identidade, família: filiação e maternidade – partindo de “Casa de Bonecas”, célebre texto do norueguês Henrik Ibsen, passando pela polêmica de seu lançamento até chegar à reverberação desses assuntos no hoje e em nossa cidade. Com excelentes usos das possibilidades cênicas e apresentando uma séria reflexão acerca de temática tão nobre, a produção vale a pena ser vista. Joana Lerner, Lilia Wodraschka, Natasha Melman, Priscila Assum e Renata Ravani estão no elenco em ótimos trabalhos. A produção fica em cartaz até o dia 23 de outubro, próximo domingo, no teatro que fica na Escadaria do Selarón, na Lapa, zona central do Rio de Janeiro.
A enorme qualidade dessa dramaturgia de Diana Herzog
A peça começa com uma cena de recepção do público em que Eleonora (Natasha Melman) acolhe a audiência, servindo-lhe um delicioso café com bolo. Ela fala sobre o quanto sua personalidade foi talhada para agradar aos outros: concordata, afetuosa, bonita, sensível, discreta, otimista, alegre. Aos poucos, porém, sua fala vai revelando o que está por trás disso. Como todo mundo, há também nela alguém que quer ser agradada, que tem seus próprios pontos de vista, seus sonhos, suas tristezas e desesperanças, posicionamentos, ideologias e crenças. É do vislumbre desse conflito interno que o público é levado para entrar pelo palco da Sede das Cias pelos fundos. Esse movimento talvez seja um convite da encenação para observar sob outros aspectos o texto “Casa de Bonecas”, bem como modos como essa obra se relaciona com o hoje.
Henrik Ibsen (1828-1906) escreveu “Casa de Bonecas”, em 1879, quando já estava no auge de sua carreira como dramaturgo. Fervilhava naqueles cantos da Europa a luta das mulheres pelo voto, por legislação trabalhista igualitária, por mais respeito. Na estética, o realismo já tinha construído suas paredes contra o romantismo, levando para a arte reflexões sobre a sociedade que não visavam ao idealismo, mas à transformação. A peça, sobretudo pelo modo como a narrativa termina, causou enorme furor na ocasião.
Na história, a personagem Nora é casada com o bancário Torvald Preston com quem tem dois filhos. No passado, para ajudar o marido pagando suas despesas em uma viagem, ela falsificou a assinatura de seu pai, que recentemente havia falecido, a fim de obter, com um agiota, um empréstimo, esse pago em longas prestações. Quando a narrativa começa, Torvald, que não sabe do referido empréstimo, se torna patrão do tal agiota e que quer demiti-lo. O problema é que o malfeitor sabe que a senhora Preston falsificou uma assinatura e, por causa disso, começa a ameaçá-la a fim de obrigá-la a interceder por ele junto ao marido.
Quando o segredo de Nova vem à tona, o mundo desaba. Torvald, extremamente controlador e orgulhoso de sua lisura profissional, vê sua ascensão profissional em risco. Mas a crise em que ele se vê envolvido é oportunidade para Ibsen de expor todo o jogo de poder e de manipulação que ele exerce em casa. Como em uma espécie de epifania, Nora reconhece a realidade do seu casamento e de sua vida. E decide, diante disso, ir embora a fim de (re)tomar as rédeas de sua própria vida onde (e quando) já poderá ser uma mulher de verdade e não mais uma boneca.
O texto recebeu críticas furiosas e muita gente, incluindo o próprio autor, se empenhou em modificar o seu final. “Nora”, recontextualizando a discussão proposta, deixa claro que o tempo e o espaço ainda não resolveram a questão. Mulheres entrevistadas em diferentes bairros do Rio de Janeiro mostram, em seus discursos, que 1) continuam sendo agredidas física e psicologicamente por homens, principalmente aqueles que delas são mais próximos; 2) que a sociedade, da qual elas também fazem parte, ainda não está estruturada a partir de relações igualitárias entre homens e mulheres, mas para o domínio dos primeiros e o subjugo das segundas; e 3) feminino e maternidade são dois temas indissociáveis para a maioria das pessoas. Ao longo da peça, a dramaturgia de Diana Herzog reflete sobre esses aspectos.
A agressão física e psicológica das mulheres pelos homens e a questão da igualdade de gêneros encontraram lugares claros na dramaturgia. “Nora” trata da narrativa e de análises de “Casa de Bonecas” de Ibsen. Há também a participação das vozes (reproduzidas ou originais) das mulheres entrevistadas e o debate acerca desses dois pontos com a contribuição particular das realizadoras do espetáculo (na criação e na encenação). No entanto, o terceiro aspecto – a relação entre feminino e maternidade – permanece um problema. Ficam as perguntas: se Ibsen tivesse matado os filhos de Nora e de Torvald antes da cena final, ou se eles não existissem na peça, sua partida seria tão agressivamente criticada? Onde está, ainda hoje, o ponto sensível da abordagem: na esposa que abandona o marido ou na mãe que abandona os filhos (no contexto europeu do fim do século XIX)?
Essas reflexões mostram a profundidade do texto original, mas também a coragem de Diana Herzog de enfrentá-lo, como também níveis diversos do seu entorno. Porque tudo é muito qualificado, Herzog está de parabéns!
A enorme qualidade dessa direção de Diana Herzog
O modo como a direção de Diana Herzog, assistida por Maíra Kestenberg dá a ver o espetáculo é vibrante. Cada cena acontece no palco vazio sob modos sempre surpreendentes, levando a reflexão para adiante em um nobre percurso cênico-investigativo. O conjunto das intérpretes dialoga com o público introduzindo quadros criativos, que se desenvolvem cheios de potências e avançam pelo tema com habilidade. O ritmo excelente faz os sessenta minutos voarem apesar da dureza da temática e da seriedade da reflexão proposta.
Lilia Wodraschka, Natasha Melman, Renata Ravani, Priscila Assum e Joana Lerner, com destaque para essas duas últimas, apresentam ótimas atuações. No conjunto e em cada parte, o grupo mantém relações dentro das narrativas que compõem o espetáculo e também o diálogo delas com o público na discussão mais direta. Fazem isso através de elogiável mobilização de seus recursos expressivos, tanto corporais quanto vocais, esses postos à disposição de Herzog em proposta tão suscetível (porque mergulhada) no diálogo com a plateia. Duda Maia assina a direção de movimento.
Há pouca participação de cenário e figurino (Elisa Faulhaber) e quase nenhuma colaboração da luz (Luiz André Alvim), mas, nessa escassez visivelmente conceitual de elementos outros, há valores a serem positivamente observados pelo público.
“Nora”, além dos méritos sociais que sua temática traz, tem o valor de evidenciar a qualidade das jovens encenadoras que academia oferece à classe teatral profissional carioca. Há aqui muito a ser aplaudido!
FICHA TÉCNICA
Direção/pesquisadora - Diana Herzog
Produção criativa/pesquisadora - Valéria Martins
Atrizes/pesquisadoras - Joana Lerner, Lilia Wodraschka Priscila Assum, Natasha Melman e Renata Ravani
Direção de Movimento/pesquisadora - Duda Maia
Iluminação - Luiz André Alvim
Cenário e Figurino - Elisa Faulhaber
Assistência de direção/pesquisadores - Maíra Kestenberg
Produção Executiva: Cida de Souza
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