O cenário com andaimes de "Ratos no sótão" |
A coragem de investigar o teatro expressionista
“Ratos no sótão” é mais interessante por manifestar cenicamente a briga entre os diferentes afetos que compõem a mente do protagonista, do que propriamente por falar de um homem em crise consigo próprio. A partir de texto escrito por Denise Maia Xavier, o espetáculo dirigido por essa e por Maria Elisa Amorin é melhor lido pelo gênero expressionista, aquele que dá conta de um olhar do homem por sobre o mundo bastante corrompido pelas suas emoções. Sem ter sido convidado, um senhor de meia idade se encontra dentro de sua mente e, sem ser exatamente o causador ou a vítima dos problemas que sofre, precisa resolver a confusão. A produção é do GATVC, de Três Rios, segundo fontes, um dos grupos de teatro amador mais antigos em atividade do Brasil. A peça, que estreou em setembro último, abriu o segundo dia do 3o OFF-Rio, Multifestival de Teatro de Três Rios.
A montagem merece elogios por construir bem a situação dramática. Estafado de tanto trabalho, o Homem é pego de surpresa ao receber o pedido de demissão de um funcionário que ele mesmo queria demitir. O momento de impotência é a porta de entrada e o convite para viajar por dentro de si mesmo, vendo esse mundo interior de forma corrompida, caótica, torta. Esclarecido, porém, para o espectador qual é o universo onde o drama irá ocorrer, inicia um mau período de estagnação na narrativa. Interpretado por Wesley Altino, o personagem permanece na mesma crise durante todo o tempo a seguir da peça com igual potência, sem que haja resoluções ou mesmo suas pistas. A partir daí o olhar da audiência se ocupa em identificar os afetos manifestados pelos demais atores. A Culpa, o Medo, a Decisão, a Consciência, o Ego, a Confiança e vários outros são os personagens que vão se mostrando aos poucos e suas falas são praticamente tudo o que o público tem para desvendar as identidades que povoam o interior do protagonista. Alguns de forma dramaturgicamente mais privilegiada, outros menos, o jogo de reconhecimento é jogado pelo espectador que se esquece de quem conta a história, aquele cujo mundo é expresso na peça (a palavra Expressionismo vem daí). Linear, o ritmo cai vertiginosa e fatalmente, o que é uma pena considerada a forma interessante como se dá o movimento da encenação no palco e o cenário com andaimes que expressa com retas diagonais uma rede intricada de relações, além do figurino e da maquiagem a reforçar o clima soturno, mórbido, tenso da estética da produção.
Considerando a pouca experiência do elenco no ofício de atuar, a escolha por construções superficiais é positiva porque com mais chances de acerto. (O personagem do Homem é o único que poderia ter mais complexidade, mas essa possibilidade não lhe foi ofertada pelo texto dramatúrgico em questão, portanto isso não pode do ator ser cobrado.) São destaques as interpretações de Lucas Steiner, de Dinho Kojiro e de Fábio Ghaspar, além de Altino, cujas presenças cênicas são tão fortes como parece ter querido a concepção da dupla de diretoras. É bastante negativo o trabalho de Caroline Gama, com uma retórica sem força, péssima dicção, gestos inexpressivos e olhares perdidos.
Amador é um gênero de produção e não cênico-narrativo. Assim como o teatro profissional e o teatro estudantil, deve ser cobrado de quem o viabiliza a mesma responsabilidade para com a beleza artística (no sentido hegeliano). “Ratos no sótão”, a primeira incursão do grupo no teatro adulto em décadas, apresenta boas intenções e algumas concretizações positivas a serem valorizadas. Avante!
Ficha técnica:
Texto: Denise Maia Xavier
Direção: Denise Maia Xavier e Maria Elisa Amorim
Elenco: Alexandre Braga Alves, Bruno Lucas Carvalho, Caroline Gama, Denise Maia Xavier, Diego Fonseca, Dinho Kojiro, Fábio Ghaspar, Iago Almeida, Luana Caren, Larissa da Silva, Lucas Steinert, Rouse Meire Santana, Thaiane Magiole e Wesley Altino
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Bem-vindo!