domingo, 17 de novembro de 2013

Al final de la noche (Equador) (3o OFF-Rio, Multifestival de Teatro de Três Rios)

Verônica Falconi, em cena, como a velha que
vem cobrar da nova a vida e a juventude
Foto: divulgação

Teatro lírico

“Al final de la noche” é um espetáculo lírico (oposição à epopeia, à drama e à performance) do grupo equatoriano Contra el viento. A partir do tema da circularidade do universo feminino, a peça celebra a capacidade das descendentes de Eva de recomeçar, de encontrar no hoje um motivo para, apesar dos desafios, enfrentar o dia seguinte, adiando o fim. Coberto de signos e, mais ainda, de seus usos potentes, não temos, no palco do 3o OFF-Rio, Multifestival de Teatro de Três Rios, uma narrativa, mas uma poesia cênica à mulher e a tudo o que ela representa, mesmo quando atualizada em homens.

Escrito por Patrício “Pato” Vallejo Aristizabal e interpretado por Verônica Falconi, o espetáculo parte de uma figura feminina que habita a margem, o limite, o lugar desconfortável que não é o centro. Lá essa personagem lírica convive com uma duvidosa imagem de deus, com uma trágica realidade cheia de vícios e prazeres e com o terrível julgamento moral. Nessa concretização cênica, os sons, as cores, as texturas, os movimentos, os gestos, as pausas, os silêncios, as luzes e as escuridões valem tanto quanto o significado das palavras, ditas em espanhol. Sem hierarquização sígnica que advenha da peça, a produção foge de uma concepção burguesa de espetáculo e empurra para o espectador a responsabilidade por dar sentido ao todo. “Ao final de la noche” será aquilo que o espectador decidir que é.

São meritosos os usos de signos que sejam mais acessíveis ao espectador devido a sua recorrência: o pó que se esvai com o tempo, o cutelo afiado, a moldura que apresenta, o cabelo branco e a velha, a sensualidade a a mulher jovem, a boneca. Os movimentos de Falconi podem ser lidos como expressão da colheita da maçã que a expulsou do paraíso, da sensualidade temerosa, do uso de drogas e da prostituição. Embora haja muito de ilegível, há o que é passível de ser lido pelo público em geral, reforçando a disposição da produção em trazer várias camadas de fruição. Valem a perfeição dos gestos mínimos e a potência dos usos dos signos, assegurando um ritmo que ora sustenta a tensão, ora a expõe. Esse jogo, fazendo jus ao gênero textual, pode bem ser comparado às rimas na poesia literária. Nisso ressalta-se a boa dramaturgia, tanto literária quanto cênica, de Pato.

De novo, mas agora em específico, é bastante elogioso o trabalho de interpretação de Verônica Falconi: excelentes usos da potência vocal e corporal, em um ritmo preciso de tensão e distensão que pontua as mudanças mais significativas. Considerando a importância dela em tornar teatral todo o emaranhado de palavras teatrais (objetos, gestos, entonações, etc) de que a peça se utiliza para se dar a ver, é possível avaliar sua participação como excelente haja vista a sua função fundamental. “Al final de la noche” surpreende os corações mais abnegados das plateias mais entregues ao teatro contemplativo. Por assegurar o valor desse quinhão, deve receber aplausos.

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Ficha técnica:
Texto e direção: Patricio Vallejo Aristizabal
Interpretação: Verônica Falconi

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