segunda-feira, 15 de julho de 2013

Como nossos pais (RJ)

Isio Ghelman e Pedro Neschling são pai e filho na peça
Foto: divulgação

Uma história bem contada

Talvez seja possível que o maior mérito de “Como nossos pais” seja o de vencer o desafio de não deixar o melodrama cair na comédia, no clichê, na pieguice. Não cai. As interpretações são de interessantes a boas, a história é bem escrita, os diálogos são sucintos, a direção usa positivamente de poucos recursos. Trata-se de um espetáculo sem pretensões e que agrada porque se apresenta como, além de um bom entretenimento, a sugestão de um bom tema para reflexão. Em cartaz na bela sala de espetáculos do Centro Cultural da Justiça Federal, na Cinelândia, Rio de Janeiro, a nova peça de Pedro Neschling é mais um passo em termos da consolidação desse como um bom profissional do ramo das artes cênicas.

Escrito, dirigido, produzido e protagonizado por Neschling, o espetáculo apresenta um olhar sensível para um lugar comum. O Pai (Isio Ghelman) lutou para construir um império e, no meio de sua batalha, fez um filho de quem não se aproximou. Esse Filho (Neschling) se tornou um homem e, adulto, assumiu compromissos nas empresas do pai, convivendo com ele quase como dois colegas. Então, o Filho de uma antiga Empregada (Fabrício Santiago) aparece na história, pedindo emprego. E o tem. No ponto alto de sua vida como empresário, o Pai descobre que pode ser útil na vida de alguém, mas o conflito está em esse alguém não ser seu próprio filho, mas um “qualquer”. O campo é lugar propício para a discussão sobre os preconceitos, a importância de laços familiares, a relação entre homens e negócios, o liberalismo moralista. O caminho seguido pela dramaturgia e pela direção não cai no clichê, nem emociona, fixando-se firmemente na difícil, porque muito delicada, reflexão. 

Com uma trama melodramática, a história é contada cenicamente através do neorrealismo. As interpretações mostram uma ótima condução do tempo na movimentação pelo espaço e no uso da oratória. As palavras são poucas, mas as intenções dão conta dos não ditos que enchem de valor o texto de Neschling e também ele próprio e seus atores e colegas. Ghelman, Neschling e Santiago usam bem das marcas de tensão para reforçar os diálogos de conflito. Vitória Frate, que interpretada a namorada do personagem de Neschling, oferece um bom contraponto e sugere uma possibilidade de reviravolta na narrativa de forma pontual e, por isso, positiva.

Traço marcante na produção, o cenário de Flávio Graff tem os méritos de 1) preencher o palco; e 2) deixar os personagens como que flutuando, uma vez que não vemos seus pés. Blocos de papel branco iluminados interiormente, não causam a sensação de metrópole (felizmente), mas situam essas figuras em uma espécie de lugar distante, o que é essencial na relação da peça e de sua fruição. Essa última tem meios adequados para atender, assim, o convite da primeira de fazer a catarse, purgar seus males na história alheia e levar para algo para pensar.

“Como nossos pais” é mais uma história bem contada do que propriamente uma grande história. Os aplausos vão para todos.

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FICHA TÉCNICA
Escrito e dirigido por Pedro Neschling
Elenco (em ordem alfabética) Fabrício Santiago, Isio Ghelman, Pedro Neschling e Vitória Frate
Direção de Arte e Figurino Flávio Graff
Luz Adriana Ortiz
Diretor Assistente Paulo Mathias Jr.
Direção de Movimento Toni Rodrigues
Trilha Sonora Pedro Neschling
Projeto Gráfico Cubículo – Fábio Arruda e Rodrigo Bleque
Fotografia Marcelo Faustini
Assistente de Direção de Arte e Figurino Júlia Deccache
Direção de Produção Miçairi Guimarães
Produção Executiva Mariana Serrão
Produzido por Lucélia Santos, Pedro Neschling e Miçairi Guimarães
Realização Nesch Produções e Nhock Produções

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