segunda-feira, 18 de março de 2013

Até o sol nascer (RJ)

Letícia Birkheuer estreia como atriz de teatro
no Solar de Botafogo
Foto: divulgação

Dramaturgo e diretor não se entendem

O mais interessante na análise de “Até o sol nascer” é reparar que, embora tenha sido escrito e dirigido pela mesma pessoa, nota-se no resultado final uma discrepância negativa. O Lucianno Maza que escreveu o texto, em 2007, não parece ser o mesmo Lucianno Maza que dirigiu o espetáculo, agora, em cartaz no Solar de Botafogo. O texto realista foi prejudicado ao receber uma encenação contemporânea: na medida em que o ritmo ficou pesado, as interpretações passaram a ter mais responsabilidades. Em se tratando da estreante Letícia Birkheuer e do pouco experiente Giuliano Candiago, a produção deixa a desejar ainda que tenha alguns méritos. 

Uma modelo decadente, a personagem Glória Heinroth (Birkheuer) chama para o seu flat um michê. No meio da madrugada, John (Candiago) e sua cliente conversam após o sexo (profissional), evidenciando as distâncias e as proximidades entre as duas figuras enquanto esperam o sol nascer. John cobra para ficar, Glória paga para ter companhia. Ele é pobre e tem sonhos de uma vida melhor. Ela é rica e está desiludida da vida. Ambos guardam em si relações paralelas, mas opostas, em relação ao sucesso e ao amor. 

Apesar de estar coberto de clichês e de ter final bastante previsível (inclusive pelo título, que pré-anuncia quando a narrativa terminará), os diálogos do dramaturgo Maza estão bem construídos: há perguntas no lugar de respostas, o jogo é próximo do real além da narrativa, as falas deixam visíveis traços da personalidade dos personagens sem descrições óbvias nem apresentações rasteiras. O problema essencial da narrativa cênica está na encenação. 

O realismo precisa correr solto para ser o que é. No momento em que o público precisa “imaginar” um flat onde há escuridão e ripas brancas (uma delas no centro do palco, atrapalhando a visibilidade do público), uma estante onde há uma passarela, uma capa de revista onde há alvura, garrafas, copos e taças onde há objetos brancos, gasta-se um tempo e uma energia que deveriam estar unicamente dispostas à história. Além disso, a movimentação, tanto a gestual quanto a proxêmica, é marcada demais, composta de partituras quase coreografadas, o que também afasta o leitor do essencial: a narrativa. Utilizando uma metáfora, quanto mais informação houver na “fotografia”, mais pixels haverá e mais tempo ela demorará para fazer download. Dentro desse panorama, o quadro de Maza é pesado e cansativo e, por isso, prejudicial. 

Considerando as relativas inexperiências de Birkeuer e de Candiago, é possível encontrar bons trabalhos de interpretação. O trabalho da atriz carece, sobretudo, de maior estudo de voz que lhe faça despertar para as potencialidades dos diversos níveis de entonação possíveis e para as belezas dos tempos, das pausas, dos silêncios na viabilização de um discurso realista. Candiago, que oferece um resultado mais meritoso que a colega, carece de maior desenvoltura corporal que lhe dê mais segurança e liberdade na movimentação. 

É bastante interessante o trabalho de iluminação de Renato Machado que, apesar de não realista, é coerente com a proposta do diretor, que é o que se analisa aqui. O bom uso dos focos dá movimento  à história que os outros quesitos não fazem. Igualmente positivo é o figurino de Lenny Niemeyer que valoriza Birkeuer e que define Candiago, cada um em seus personagens. 

“Até o sol nascer” tem como principal mérito o de ser uma produção bem intencionada, no sentido de arregimentar os seus elementos de forma coesa, apesar de equivocada. Dramaturgo e diretor têm concepções opostas, o que é prejudicial, mas é possível identificar, em ambos trabalhos, o cuidado no que diz respeito aos detalhes. Dá-se, assim, as boas vindas a quem está começando já com expresso respeito ao ofício teatral. 

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Ficha Técnica:

Texto e direção: Lucianno Maza
Elenco: Giuliano Candiago e Leticia Birkheuer
Assistente de direção: Caesar Moura
Direção de movimento: Stela Guz
Arquitetura Cênica: Fernando Alexim
Figurino: Lenny Niemeyer
Iluminação: Renato Machado
Trilha sonora: Rodrigo Marçal
Preparação vocal: Jane Celeste
Make-up e fotografia: Fernando Torquatto
Programação Visual: Duddu Rodrigues
Assessoria de imprensa: Kassu Produções
Assistentes de produção: Ailime Cortat e Jenny Mezencio
Produção executiva: Leticia Napole
Direção de produção: Deborah Aguiar
Coordenação de produção: Giuliano Candiago

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