quinta-feira, 18 de abril de 2013

Por que será que as amamos tanto...? (RJ)

Tuca Andrada estreia na direção
Foto: divulgação

Uma peça sobre os homens

“Por que será que as amamos tanto...?” é mais uma excelente oportunidade para quem gosta de teatro exercitar o ponto de vista e separar um texto muito ruim de uma direção muito boa. Não acredito em acepções preconceituosas do tipo “o diretor Tuca Andrada ajuda a dramaturgia de Daniel Datola”, porque literatura tem os seus instrumentos de linguagem que são diferentes do teatro. Julgar um a partir do outro é um erro grosseiro. No caso desse espetáculo, recém estreado no aconchegante Teatro Cândido Mendes, em Ipanema, zona sul do Rio de Janeiro, os diálogos do escritor argentino ainda inédito no Brasil chegam pelas mãos de Andrada, que estreia na função de diretor. No palco, os atores Marco Miranda (Leo) e Wesley Aguiar (Joca) abrem a temporada ainda bastante inseguros, enrijecidos, presos às partituras de movimento, o que é, por ora, negativo. Os indicadores, no entanto, são positivos: o teatro é  uma arte viva afinal. Com o tempo, a união Datola + Andrada + Miranda + Aguiar tem tudo para oferecer uma produção “mais azeitada” de forma que, pela temática de forte cunho popular, poderá fazer o público gargalhar, o que ainda não acontece infelizmente. 

Em cena, há uma dissertação (e não uma narração!) sobre as mulheres do ponto de vista machista, generalista e simplório por parte de dois homens casados. (Eis aí as marcas de arte popular de que se falou no parágrafo anterior. Esteja longe dos leitores qualquer preconceito sobre esse gênero teatral, tão difícil, tão rico e tão valoroso como qualquer outro, frisa-se). O problema da dramaturgia está em ficar no exato meio do caminho entre a poesia (e ironia) de, por exemplo, duas canções de “My fair lady”: “I`m an ordinary man” e “A hymn to him”, em que os homens ressaltam a sua superioridade diante do sexo feminino, e, no extremo oposto, de peças como “Diálogo dos Pênis”, coberto de piadas do tipo stand up comedy, despretensiosas e leves (do ponto de vista formal). Ou seja, “Por que será que as amamos tanto...?” parece não saber se quer ser uma narrativa tradicional, com frases ricamente construídas (cheias de próclises, ênclises e tempos verbais raros na linguagem oral) e personagens profundos, apesar da ausência total de conflito externo, ou se quer ser uma comédia de mesa de bar, dissertando acerca do panorama triste em que vivem os homens, esses em posições submissas diante de suas esposas. Cinquenta minutos depois de ter começado, sabe-se exatamente o mesmo que se sabia no décimo minuto e a revelação final surge sem ser verdadeiramente um ápice. 

Assistida por Leila Moreno, a direção de Tuca Andrada é firme, criativa e responsável por dar curvas a esse diálogo absolutamente linear. A fuga do realismo, com partituras bem desenhadas, manifesta a intenção de aproximar esses personagens do gênero farsa, justificando (e diminuindo as consequências negativas) a superficialidade das falas no não-desenvolvimento dos assuntos. Em vários momentos, o resultado é positivo, sobretudo na narração da cena da festa de casamento da qual Leo e sua esposa participaram como convidados, o melhor momento de toda a encenação. Ainda destacando positivamente o trabalho da direção, observa-se que o espaço é bem usado, vários níveis são explorados e há base para o jogo que, com o desenrolar dos finais de semana desta e das futuras temporadas, há de ser jogado (ou melhor jogado). 

Marco Miranda e Wesley Aguiar, embora não joguem entre si, têm alguns bons momentos em suas interpretações. Leo (Miranda) usa bem os tempos e as intenções, embora sem tanta desenvoltura na relação espacial. Sem boa respiração e naturalidade, Joca (Aguiar) usa bem os movimentos, criando boas situações. Cenário (Jayro Botelho e Tuca Andrada), iluminação (Fabiano Carneiro), figurinos (Ana Roza) e direção musical (Marcelo Alonso Neves) utilizam as oportunidades que têm para compor o quadro, imprimindo possíveis outros níveis de fruição, mantendo-se discretas em suas funções. Neves e Carneiro participam na criação de momentos específicos, Botelho e Andrada deixam a arena livre para o ritmo correr tão solto quanto possível e Roza estabelece diferenças entre Léo e Joca. Enquanto quadro, o resultado é positivo. 

Ao lado de tantas produções que tratam ora do universo feminino, ora dos relacionamentos contemporâneos, “Por que será que as amamos tanto...? tem seus méritos principalmente por ser possível identificar nela boas intenções. Caberá, talvez ao futuro, o sucesso ainda não visto. 

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FICHA TÉCNICA
Texto: Daniel Datola
Tradução e adaptação: Mônica Mayer
Direção: Tuca Andrada
Elenco: Marco Miranda e Wesley Aguiar
Assistente de direção: Leila Maria Moreno
Direção musical: Marcelo Alonso Neves
Iluminação: Fabiano Carneiro
Cenário: Tuca Andrada e Jairo Botelho
Figurinos: Ana Roza
Produção executiva: Edmar Caetano
Projeto gráfico: Mais Programação Visual (Humberto Costa)
Realização: Iluminata Produções Artísticas Ltda.

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