sexta-feira, 6 de julho de 2012

Herivelto como conheci (RJ)


Foto: divulgação

A riqueza da música brasileira em um pobre espetáculo

                “Herivelto como conheci” é um monólogo musical em que Marília Pêra interpreta a si própria em homenagem ao cantor brasileiro Herivelto Martins (1912-1992). No palco, a atriz e cantora diz trechos do livro homônimo escrito por Yaçanã Martins e Cacau Hygino, intercalando com a interpretação de algumas canções compostas pelo homenageado. Em termos de narrativa, o público tem acesso a detalhes da história de amor entre Herivelto e Lurdes Torelly, sua segunda esposa, com quem viveu quarenta anos. Dirigido por Claudio Botelho, que também assina a adaptação, o espetáculo está construído em cena por, além de Marília, os músicos Thiago Trajano (arranjos, violão e bandolim) e Márcio Castro (piano e acordeon). Em resumo, a produção oferece uma homenagem que fica muito aquém da grandeza de Herivelto e da música brasileira, decepcionando os fãs de Marília e de Botelho igualmente.
                Marília Pêra não canta as vinte e uma músicas do programa como canta “Hoje quem paga sou eu”, além de poucas outras. Os momentos em que sua voz sai “para fora”, é forte, a dicção é clara e a atriz e cantora não faz usos de “chorinhos” para mascarar tons que, segundo parece, não consegue mais alcançar, são belas exceções infelizmente. Na maioria dos números, apesar dos microfones, as palavras lhe saem confusas, seus tons parecem arranhados e a voz está prejudicada por uma embocadura de cantora lírica, o que é bastante estranho. Os textos são diálogos da atriz com um off gravado e há apenas um único momento em todo o espetáculo em que os dois músicos que acompanham a diva participam cantando, o que é uma pena. Sobram piadas repetidas (a citação da barra de cereal), comentários aleatórios e gestos largos, muitos dos quais meramente ilustrativos. A opção econômica de “Marília Pêra interpretando ela própria mais dois músicos” resulta em uma pobre e inexplicada opção para quem esperava por um grande espetáculo digno de quem o assina e do músico que o motivou. Fica ainda pior quando, em cena, vemos um vestido negro simples como figurino, uma escrivaninha e duas cadeiras antigas sobre um tapete como cenário e um desenho de iluminação bastante modesto.
                De um jeito tocante, Cláudio Botelho apresenta o espetáculo no programa, dizendo algo que merece ser reproduzido muitas vezes:
                “Em março deste ano, estava em Nova York de férias, o que na verdade quer dizer “ir ao teatro toda noite”. A temporada deste ano está excelente, mas notei uma peculiaridade que, de certa forma, dá um pouco o tom da maneira como um país pode cuidar de seus artistas e seus criadores. Em um teatro, havia uma gigantesca produção de PORGY AND BESS, dos irmãos Gershwin. Você atravessa a rua e vê, no teatro em frente: NICE WORK IF YOU CAN GET IT, também da mesma dupla de compositores e, logo na esquina, está em cartaz ANYTHING GOES, de Cole Porter. Todos vendendo uma média de mil ingressos a cada noite. Sucesso de público e de crítica. E, neste caso, os três são obras escritas nos anos 30, ou seja, não são o último grito da moda ou a última novidade da canção pop. É a tradicional e eterna canção americana e seus compositores de ouro, sendo defendidos diariamente num ambiente comercial que gera empregos, lucro, coloca artistas em evidência e, no final das contas, torna a obra tão viva quanto ela tenha sido no momento de sua criação, mais de 70 anos antes. Imediatamente pensei: por que nossos Noel Rosa, Ataulfo Alves, Braguinha, Lupicínio Rodrigues, Dolores Duran, Almirante, não têm tratamento nem por um centésimo parecido com isso? Por que não os cultivamos? Por que não vemos neles a possibilidade de um grande negócio?"
                Sua pergunta é um grito de alerta. O Brasil, que somos nós, aprendeu (aprendemos) a valorizar mais o que é de fora do que o que é seu (nosso). “Herivelto como conheci”, enquanto produção, torna-se, assim, um ótimo motivo para quebrar essa barreira como, aqui e ali, têm havido outros empenhos no mesmo objetivo. (“Emilinha e Marlente” e “Tim Maia” são ótimos exemplos disso.) Só por isso, assistir ao espetáculo torna-se um dever para com a pátria, embora produzi-lo não tenha sido, de todo, sinal do cumprimento desse dever.

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Ficha técnica:
Texto original: Cacau Hygino e Yaçanã Martins
Adaptação e Direção: Cláudio Botelho
Arranjos/ Violão / Bandolim: Thiago Trajano
Piano / Acordeom: Marcio Castro
Pesquisa Musical : Alfredo Del Penho
Fotografia: Rodrigo Lopes
Programação Visual: Roberta de Freitas
Assessoria de Imprensa: Natasha Stein
Direção de Produção Executiva: Karina Alaor
Realização: Montenegro e Raman
Apoios: Rede Globo, Porto Seguro , Chevrolet , Scherer Antiques, Snolb Antiguidades, Óbidos Antiguidades Ltda

Um comentário:

  1. Muito fraco. a atriz se equilibra em um vestido de mau gosto e com certeza feito para uma mulher de miseravelmente mais cinco quilos, que ela deve ter perdido a troco do nada. a voz, com permeios angelicais adquiridos apos seus últimos papéis na tv, impede a compreensão perfeita das palavras e dá um toque totalmente artificial, a tudo o que é dito. não recomendo a ninguém.

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