domingo, 15 de julho de 2012

Bandeira de Retalhos (RJ)


Foto: Ricardo Gama

Digno de plateias cheias

            “Bandeira de Retalhos” é a nova produção do Grupo Nós do Morro, com direção geral de Guti Fraga e Fátima Domingues. Escrito na forma de roteiro cinematográfico em 1979, o texto de Sérgio Rodrigues, que também assina a direção musical, é sobre um fato verídico acontecido em 1977, quando o governo tentou expulsar parte dos moradores do Vidigal. Eles resistiram e, com o apoio da população, de setores da igreja católica e da imprensa, mudaram a demografia do Rio de Janeiro para sempre. O espetáculo acontece dez anos depois de “Noites do Vidigal”, peça que retratava o cotidiano do morro, dois Shakespeares, uma adaptação de contos de Machado de Assis, e um Gorki. É o grupo voltando seu olhar para si mesmo.
            Enquanto musical, a peça tem dois problemas: cantores e ritmo. Faltam bons cantores em “Bandeira de Retalhos”. A maioria dos atores parece fazer esforço para cantar enquanto, na plateia, o público precisa fazer força para entender muitas palavras ditas nas belas letras. A estrutura, a ordem de entrada e de saída dos números musicais está ótima e faz o público brasileiro se orgulhar de um musical tão nacional como esse, mas, infelizmente, há que se dizer que microfones parecem ser necessários apesar da proximidade entre palco e plateia que o Teatro Maria Claro Machado providencia.
            Há duas forças na dramaturgia de “Bandeira de Retalhos”, quase toda em verso, o que é bastante positivo: de um lado, parte do morro precisa ser desocupada por ordem judicial e os moradores se reúnem para tratar do problema comum. De outro, o casamento de Tiana parece ruir quando volta para o Morro do bandido Bituca. O texto não joga bem com o desafio de dosar as duas forças, deixando apenas para as cenas finais o privilégio de uma delas. Durante toda a encenação, há um intercalamento regular (e monótono) das situações: ora o foco está numa, ora noutra impreterivelmente. Além disso, quando o assunto é política, o português fica correto, com ênclises que não parecem caber na boca daqueles personagens, plurais perfeitos, um discurso sem marcas de verdade. Dessa forma, cem minutos de apresentação se tornam longos, o que é negativo.
            “Bandeira de Retalhos”, apesar das falhas apontadas, é um bom espetáculo. Os personagens são fortes, o espaço é bem explorado, o tema é propício. A direção de arte de Rui Cortez só não é perfeita porque o quadro do João Paulo II é inadequado visto que, em 1977, o papa ainda era Paulo VI. Nos detalhes, nota-se um extremo cuidado, o resultado de um trabalho de exploração das possibilidades visuais de cada composição. O figurino de Pedro Sayad e Tita Nunes segue o mesmo padrão, fortificando a mistura de cores, de texturas, de geometria, de significados. O desenho de luz de Márcia Francisco também acrescenta pontos valorosos ao espetáculo na medida em que auxilia na composição dos quadros e dosagens dos tons. Bem executada, a trilha sonora tem o seu ponto alto em “Enquanto a tristeza não vem”, em um roteiro de canções tão fortes como os personagens que as entoam.
            Priscilla Marinho (Mãe Clara), Marília Coelho (Júlia) e Edson Oliveira (Sargento) são os pontos altos do elenco protagonizado por Marcelo Melo (Neno) e Kizi Vaz (Tiana), não menos excelentes. Os destaques elogiam a força em cena, a presença, a vivacidade, a energia posta em favor da narrativa. O mesmo não se vê, porém, em João Gurgel (Tuim), Sandro Mattos (João da Lua) e em Luiz Henrique Delfino (Pernambuco).
            De um modo geral, a encenação é imponente, orgulhosa e viva, deixando um saldo bastante positivo para quem for assistir. Há ótimos usos de linguagem, a divisão em níveis é rica, a ocupação do espaço é vibrante. “Bandeira de Retalhos” merece as plateias cheias que está ganhando.

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Ficha Técnica
Direção Geral: Guti Fraga e Fátima Domingues
Texto: Sérgio Ricardo
Supervisão Dramatúrgica: Luiz Paulo Correa e Castro
Assistência de Direção: Tiago Barbosa
Direção Musical: Sergio Ricardo
Co-direção Musical: João Gurgel
Direção vocal/Canto:Tiago Barbosa
Preparação Rítmica: Wellington Soares
Direção de Movimento: Johayne Hildefonso
Iluminação: Márcia Francisco
Direção de Arte: Rui Cortez
Figurinos: Pedro Sayad e Tita Nunes
Preparação Vocal: Leila Mendes. Isabel Schumann e Roberta Bahia
Assistência de Direção de Arte: Rodrigo Abreu e Sammara Niemeyer 
Estagiária: Carolina Sugahara
Cenotécnica: Álvaro de Souza
Contra-regra: Dejaneth Idalice
Costureira da Bandeira de Retalhos: Tânia Dias
Montagem de Luz: Márcia Francisco, Arnaldo Nunes e Zezinho da Luz
Assistência de Figurino: Leonardo Brazas
Costureira dos figurinos: Claudia Ramos
Camareira: Goretth Bezerra
Operação de Som: Allan Felix de Souza
Design Gráfico: Marina Lufti
Fotos: Ricardo Gama
Vídeo de divulgação: Aléssio Slossel
Produção Executiva: Alessandra Barbosa e Bianca Fabre 
Assistência de Produção: Sandra Viola e Kiko Moraes
Assessoria Jurídica: Martins Associados Advocacia
Assessoria Contábil: LS Serviços Empresariais LTDA
Assessoria de Imprensa: Carla de Gonzales
Direção de Produção: Zezzé Silva

Elenco – ator/ personagem:
Alexandre Cipriano – SENHOR DUQUE
Alexis Abraham – DELIO DOS SANTOS/POLICIAL
Cida Costa – ANGÉLICA
Cláudio Tozer – JOÃO VELHO   
Danilo Batista – ENGENHEIRO 
Edson Oliveira – SARGENTO
Flavio Mariano – ISIDORO/POLICIAL
Francisca Damião – COSTUREIRA      
Jackie Brown – ANGELA/ POLICIAL
João Gurgel – TUIM
Kizi Vaz – TIANA    
Lorena Baesso – CONCEIÇÃO  
Luiz Henrique Delfino – PERNAMBUCO
Luzinete Barbosa –            DONA FÁTIMA
Marcelo Mello – NENO E POLICIAL
Maga Cavalcante – DONA ALZIRA/ POLICIAL/ GRÁVIDA  
Marília Coelho – JÚLIA     
Priscilla Marinho –  CLARA
Renan Monteiro – BITUCA/ MUSICO   
Rosangela Gonçalves – ANA MARIA NORONHA/ POLICIAL
Sandro Matos – JOÃO DA LUA E BENTO RUBIÃO

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