Ana Fazza e Natália Garcez em cena |
Equívoco
“Fando e Lis”, que esteve em cartaz, no Poeirinha, é um equívoco. O erro não é tanto não ter atualizado o texto surrealista escrito por Fernando Arrabal em 1955, mas ter forçado um realismo psicológico que é completamente empobrecedor ao que originariamente se propôs o texto. A leitura de Vinícius Arneiro para a concepção do clássico não lhe fez perguntas, mas sugeriu respostas e, nesse sentido, fez do tédio não um motivo, mas uma consequência infelizmente. Enquanto obra de arte, o espetáculo vale como um experimento mal feito, mas que tem a nos ensinar (o que não fazer).
O lugar ermo em que Fando e Lis se encontram é um deserto sem fim e sem começo, como também são as relações entre os dois. Lis não pode andar e Fando a carrega nesse mundo sem destino visível pelo espectador. Não sabemos quantos anos têm, em que época se passa o encontro, de onde vêm e para onde vão. Fando a trata com doçura, depois a agride, depois a acaricia novamente. Três personagens surgem (como em Godot só que em contexto bastante mais onírico) e se constituem, para Fando, em um convite para sair dessa realidade nada realista. Nenhum deles são para si, mas são para Fando, porque é a Fando que nos identificamos. Diferente do Teatro do Absurdo, não há um aprisionamento trágico que envolva os personagens, porque Fando, afinal, acaba escapando. Diferente do Expressionismo, não vemos os personagens a partir de um deles, mas os vemos com ele (Fando). Nesse sentido, próximo de Artaud, estamos, leitores de Arrabal, “fervendo” em um calderão que pode nos dar um certo prazer sensorial, mas do qual ansiamos por sair. Não é isso que a direção de Arneiro dá a ver nesse espetáculo interpretado por Ana Fazza (Fando), Natália Garcez (Lis) e Leonardo Hinckel (Namur, Mitaro e Toso).
Todos os diálogos são dados em tom realista, com marcas que expressam uma investigação do ator ao sentido de cada fala. Os sons em Arrabal fazem tanto sentido quanto as palavras e, nesse contexto, buscar apenas o sentido de uns elementos da palavra, desprezando os outros, é empobrecer a obra primeira. Por outro lado, Fando é interpretado por uma atriz e os três personagens surgem construídos por um único ator, o que não só evidencia uma concepção não articulada como também estrutura um espetáculo incoerente. Repleto de situações próprias para a aplicação das leis de causa e de efeito, esse “Fando e Lis” é monótono, sem vida, frio porque não atualiza o surrealismo, nem tem força para o absurdo ou para o expressionismo ou mesmo para o pós-dramático.
Quanto aos demais elementos, difícil é avalia-los considerando a ausência de uma concepção. “Fando e Lis” deixou a desejar.
FICHA TÉCNICA:
Direção: Viniciús Arneiro
Elenco: Ana Fazza, Leo Hinckel e Natália Garcez
Iluminação: Jorge de Carvalho
Cenografia: Paula Cruz
Figurino: Flávia Costa
Trilha Sonora: Pedro Curvello
Consultoria de Movimento: Ana Paula Bouzas
Preparação Vocal: Jane Celeste Guberfain
Assistência de Direção: Flávia Naves
Arte Gráfica: Daniela Barreira
Assessoria de Imprensa: Minas de Ideias
Produção: Mariana Serrão e Joana Damazio
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