sábado, 26 de janeiro de 2013

Tarja Preta (RJ)

Espetáculo é dirigido por Ivan Sugahara
Foto: divulgação

Letícia Isnard e Erico Brás fazem brilhar primeiro texto de Adriana Falcão


            Primeiro texto de Adriana Falcão para o teatro, “Tarja Preta” é um excelente espelho para o “O Belo Indiferente”, de Jean Cocteau. Em ambos, há uma mulher completamente dependente de um homem para viver. No texto surrealista escrito pelo francês à diva Edith Piaf, o homem está silencioso, sentado em uma poltrona, ouvindo, madrugada a dentro, os lamentos de sua mulher. No texto de Falcão, dirigido por Ivan Sugahara, a mulher e seu amigo estão em um fluente e divertido diálogo, falando sobre o ex-marido dela enquanto se entope de remédios, drogas e álcool, a guisa das explicações teóricas que o amigo dá. Nos dois textos, a humana necessidade de compartilhar a vida, dividir os momentos, amar e ser amado. "Tarja Preta" está em cartaz na confortável sala de espetáculos do Centro Cultural da Justiça Federal, na Cinelândia, Rio de Janeiro. 

A peça não começa bem, mas termina excelentemente. A primeira cena, em que os personagens entram bêbados, expõe uma necessidade da dramaturgia de parecer engraçada, leve e despretensiosa, que felizmente é abandonada aos poucos ao longo da narrativa. O ponto positivo da introdução é que, logo na abertura, o público conhece a personagem interpretada por Letícia Isnard e seu insistente e mantido sentimento pelo ex-marido (personagem que não aparece), então já casado com outra mulher. Ainda na introdução, a segunda cena apresenta a protagonista completamente dependente de influentes químicos para sobreviver de alguma forma feliz, justificando bem o título, o mote e a concepção do cenário de Rui Cortez. No entanto, fica-se sem saber quem é, na verdade, o personagem de Érico Brás, bem interpretado, mas mal escrito. Fruto de dois brilhantes trabalhos de interpretação e uma boa direção de Sugahara, o texto de Falcão vence com dificuldade os obstáculos, atingindo felizmente seu melhor momento na cena final. Até lá, como também acontece em Cocteau, vão-se repetições, lamentos, apelações e uma boa dose de exageros. O que não há em “O Belo Indiferente”, mas há em “Tarja Preta”, é um insistente palavrório farmacêutico que, se literariamente é um interessante jogo de palavras, no palco, é um exercício por vezes enfadonho. 

Tanto Isnard como Brás merecem aplausos por destacar, em seus personagens, diversas nuances de suas figuras, que vão desde força e rigidez até sensibilidade e delicadeza. O carisma dos intérpretes resulta em sequências engraçadas e em final sublime (para um dos personagens). A direção de arte de Rui Cortez, redundando o palavrório farmacêutico de que já se tratou, espalha caixas de remédios e se dá a ver com a repetição da textura da caixa de papelão (mesas, cadeiras e estantes são de papelão, cuja cor se repete no lençol do colchão), saindo negativamente da comédia de costumes de Falcão e de Sugahara e indo para o surrealismo de Cocteau estranhamente. O fato disso não ser um entrave para o ritmo da narrativa é mérito de Sugahara, Isnard e de Brás. 

Relacionamentos, dependência afetiva (ou emocional), diferenças entre homens e mulheres são temas já batidos por serem tantas vezes tratados. Eis aqui um ponto de vista diferencial, contemporâneo e, sobretudo, divertido e apresentado de forma inteligente. Vida longa à dramaturgia de Adriana Falcão. Aplausos a quem fez e faz dela teatro. 

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FICHA TÉCNICA

Texto Adriana Falcão
Elenco Letícia Isnard e Érico Brás
Direção e Adaptação Ivan Sugahara
Assistência de Direção Lisa E.
Figurino Bruno Perlatto
Iluminação Tomás Ribas
Trilha Sonora Ivan Sugahara
Direção de Movimento Paula Maracajá
Programação Visual Bruno Graell
Fotografia Dalton Valério
Assessoria de Imprensa Flávia Tenório
Direção de Produção Giba Ka
Produção Executiva Letícia Napole
Assistente de Produção Flávia Milioni e Jenny Mezencio
Coordenação de Produção Beto Bk
Realização Giba Ka, Ivan Sugahara e Letícia Isnard

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