sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Oportunidade Rara (RJ)

Lena Brito e Saulo Rodrigues brilham
em espetáculo de Hamilton Vaz Pereira

Foto: divulgação

O teatro do absurdo está com tudo

O mais interessante de “Oportunidade Rara” é que a montagem é mais uma prova de que o Teatro do Absurdo está com tudo. Ou seja, que esse gênero ainda nos diz algo, ainda tem a ver com o mundo contemporâneo, que Qorpo Santo, Ionesco, Albee (este está de fato vivo mesmo), Sartre e Beckett estão vivos e sendo atualizados. Nos últimos tempos, o Rio de Janeiro viu “Ninguémfalou que seria fácil”, de Felipe Rocha. Agora, mais recentemente, houve o sucesso “O desparecimento do elefante”, adaptação de Monique Gardenberg para os contos de Haruki Murakami. E, agora, vem esse texto assinado e dirigido por Hamilton Vaz Pereira. Algumas histórias engraçadas, outras nem tanto, a depender do gosto do público. Todas, no entanto, expressando uma direção cuidadosamente firme, boas intepretações e um delicado trabalho de produção que rebate em todos os demais elementos da estrutura da obra como um todo coeso e coerente entre si. Eis aí uma peça inteligente, com um humor refinado para um público que gosta de fugir do fácil, sem tanto esforço no difícil.
São cinco histórias. Em todas elas, personagens brasileiros se encontram em lugares diversos no mundo, exibindo naturalmente um ponto de vista sobre o país enquanto falam de si mesmos. Dos pais que precisam reaprender a conviver depois da partida do filho já adulto, passando pela madame que vai visitar um morro não pacificado com sua empregada, pelo empresário que quer transar com a esposa de seu amigo no consultório de uma agiota, por duas estilistas que precisam vender seus produtos a um rico fazendeiro mato-grossense, até chegar a uma dupla de brasileiros que ensinam Brasil em Paris, o texto apresenta situações inusitadas, nem sempre tão absurdas, mas com caminhos surpreendentes e que, por isso, refletem a falta de lógica nos acontecimentos rotineiros. Pode se concluir, talvez, que a peça sugira um povo que ainda não está acostumado com o boom do Brasil no próprio Brasil, mas sobretudo no Mundo, um lugar em que as coisas podem dar certo e que vivem um protótipo do “sonho brasileiro”. Nesse contexto, as situações criadas por Vaz Pereira são mais profundas do que aparentam (essa, aliás, é a chave do Teatro do Absurdo), indo além do riso fácil e das personagens aparentemente malucas.
No elenco também composto por Bel Kutner e Luana Martau, é Saulo Rodrigues e Lena Brito que se destacam. A criação dos tipos que essa dupla expõe deixa claro uma pesquisa de personagem que vai além da cópia de trejeitos, pela clara manifestação de ritmos, de vozes, de equilíbrios. De um modo geral, o trabalho dos quatro é bastante interessante, inclusive porque o jogo criado por Vaz Pereira, ao dirigir o espetáculo, propõe situações que não cansam o público, embora o ritmo seja, em vários momentos, um tanto quanto lento. 
Hélio Eichbauer e Antônio Medeiros, que assinam o cenário e o figurino respectivamente, expõem trabalhos excelentes. Ao mesmo tempo que despojados, no sentido de que com pouco expressam muito, são ilustrativos, criando um clima interessante e sobretudo cômico para a cena (os pavões e os figurinos negros do deserto, por exemplo). Bastante interessante é a participação musical de Iuri Brito, Thomas Jagoda, Guilherme Lírio e Pedro Fonte com composições do próprio Hamilton Vaz Pereira, em perfeito projeto de sonorização de Andrea Zeni. Ao som das canções de Vaz Pereira, o cenário é trocado, mas o universo absurdo permanece a contento, dando positivamente coerência ao gênero que trata justamente da falta dele.
O que talvez seja “rara” é a oportunidade que alguns personagens parecem querer de fugir desse mundo estranho ou, quem sabe, de adentrar nele. Na justaposição das cenas, há oportunidades tanto para entrar como para sair. Vai para o público a decisão do que fazer. Em todos os casos, de aplaudir.

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FICHA TÉCNICA

Texto, Música e Direção: HAMILTON VAZ PEREIRA
Elenco: LENA BRITO, BEL KUTNER, LUANA MARTAU E SAULO RODRIGUES
Cenário: HÉLIO EICHBAUER
Luz: JORGINHO DE CARVALHO
Vídeo: LAÍS RODRIGUES
Figurino: ANTONIO MEDEIROS
Trilha Sonora: IURI BRITO, THOMÁS JAGODA, GUILHERME LÍRIO E PEDRO FONTE.
Projeto Gráfico: LUIZ STEIN
Colaboração / Dramaturgia: MELANIE DIMANTAS
Direção de Produção: FERNANDO DO VAL
Realização: GOG E MAGOG PRODUÇÕES
Assessoria de imprensa: JSPONTES COMUNICAÇÃO – JOÃO PONTES E STELLA STEPHANY

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