sábado, 8 de junho de 2013

Cruel (SP)

Maria Manoella e Reynaldo Gianecchini em
bons trabalhos de interpretação
Foto: João Caldas

Bonito, mas nada além


“Cruel” é uma adaptação de “Os Credores”, do dramaturgo sueco August Strindberg (1849-1912) escrita em 1888, que, agora é levada à cena sob a direção de Elias Andreato. Considerado o pai do teatro expressionista, sendo algumas de suas obras lidas a partir do gênero realista-naturalista, como é o caso aqui, na obra sem adaptação eis o jogo como principal elemento que faz girar a roda narrativa. Dispensada por Andreato, a leitura tradicional faz falta. Em cartaz no Teatro Leblon, a atual montagem é previsível, monótona, tediosa infelizmente. São destaques positivos o cenário e o figurino de Fábio Namatame. 

O que em Strindberb é um hotel, em Andreato é uma espécie de estúdio onde Adolfo pintava seus quadros e, agora, passa a se dedicar à escultura. Nesse lugar, irão se encontrar os três personagens: Adolfo (Erik Marmo), Gustavo (Reynaldo Gianecchini) e Tekla (Maria Manoella), sendo o primeiro o atual marido, o segundo o ex-marido e o terceiro a atual esposa. Escolhido por Strindberg, o hotel servia como um lugar neutro. O estúdio de pintura pertence a um dos personagens, sendo, portanto, uma marca inadequada de melodrama, que Andreato manifesta em sua leitura: nessa concepção, Adolfo é a vítima. (Não há vítimas ou malfeitores no teatro realista-naturalista justamente porque esse gênero exclui qualquer possibilidade de moralismo.) 

Na primeira cena, quando começa jogo de esconde-esconde de Strindberg, se descobre que Gustavo e Adolfo se conheceram há uma semana. O primeiro sabe que o segundo é atual marido de sua ex-esposa, mas o segundo não tem essa informação. Na segunda cena, com a chegada de Tekla, Adolfo está escondido, mas ela não tem essa informação. Na terceira e última cena, é Gustavo está escondido mas, de novo, Tekla não sabe disso. Como numa espécie de bisavô dos reality shows que todo verão passam na TV, a) os personagens estão presos; b) os personagens não têm as mesmas informações que o público; e c) os personagens agem por instinto, tentando até traçar estratégias racionais, mas sendo traídos pelas próprias emoções, o que levanta o ibope. Negativamente, a concepção que é dada a ver tem um vilão (Gianecchini), uma vítima (Marmo) e uma heroína (Manoella). Gustavo vem infernizar a vida de de Adolfo, como uma serpente, enchendo de dúvidas a cabeça de Adolfo, aqui visto como ingênuo. A conclusão final de Gustavo, a de que Tekla é uma mulher capaz de amar dois homens ao mesmo tempo, dá à personagem uma ascensão que ela não quis ter. No últimos momentos, temos o desfecho romântico de Adolfo, que, em Strindberg, é apenas um cansaço do personagem em continuar nesse jogo ou, quem sabe, uma forma que ele encontra de vencê-lo. Nada disso se vê na montagem de Andreato, vinda ao palco sem profundidade, de forma superficial, sem ironia, sem ardilosidade, sem jogos com possíveis vencedores e perdedores e, principalmente, sem algo que desafie o espectador a ver como tudo vai terminar. 

Erik Marmo está em péssimo trabalho de interpretação. O texto parece não lhe caber na boca, as entonações e as ações são superficiais, psicológicas, frias demais ou românticas demais. Reynaldo Gianecchini preserva as boas pausas e, dentro da concepção, deixa claro, desde o início, que é o vilão da história, o que é comportado em relação a Andreato. Porque forte em cena, auxiliada pelo belo figurino de Namatame, Manoella domina as cenas, porque é quem melhor usa de artifícios para vencer nos diálogos. Dentro da concepção da direção, os três intérpretes viabilizam um espetáculo frio, mas que é coerente com o que Andreato se propôs. (Vale lembrar que o teatro está em Andreato e não em Strindberg!) 

Apesar de pertencer a Adolfo, o estúdio de pintura é frio e, por isso, positivo. Ilustrativos, os figurinos apontam de forma positiva para a história que está sendo narrada, sem lhe causar entraves, mas agregando bons valores a estrutura geral da produção. No mesmo bom sentido, agem a trilha sonora original de Daniel Maia e a iluminação de Wagner Freire. Como um todo, os elementos estéticos (a direção de arte é de Laura Andreato) funcionam como criadores de um espaço para a situação ser exposta cenicamente. 

Com produção de Selma Morente e de Célia Forte, eis aí um espetáculo bonito, mas nada além. 

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FICHA TÉCNICA:
"Cruel", de August Strindberg
Direção e Adaptação: ELIAS ANDREATO
Elenco: REYNALDO GIANECCHINI, MARIA MANOELLA e ERIK MARMO
Cenário e Figurino: FÁBIO NAMATAME
Iluminação: WAGNER FREIRE
Trilha Sonora Composta: DANIEL MAIA
Direção de Arte: LAURA ANDREATO
Assistente de direção: ALINE MEYER
Preparação corporal: VIVIEN BUCKUP
Preparação vocal: EDI MONTECCHI
Programação visual: VICKA SUAREZ
Operador de som: ROBERTO SILVA
Operador de luz: HÉLIO MALVINO
Direção de cena: LÚCIA MARTINUSSO
Administração: MARCELA EPPRECHT
Produção executiva: GABRIEL BORTOLINI
Produção: Bianca de Felippes – Gávea Filmes
Coordenação de produção: EGBERTO SIMÕES
Realização: MORENTE FORTE PRODUÇÕES
Produção: SELMA MORENTE E CÉLIA FORTE

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