quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Véspera (SP)

Foto: Bob Sousa

Casamento frustrado

O texto de “Véspera” parece uma tentativa frustrada de casar o mexicano Luis Buñuel com o francês Eugène Ionesco. Surrealismo de um lado e Absurdo de outro, a jovem dramaturga Camila Appel fica no meio caminho, não resistindo ainda à tentação de “passar uma mensagem” para o espectador e entretê-lo superficialmente. Apesar das boas interpretações do elenco liderado por Cris Nicollotti e do bom entrosamento dos elementos visuais, a direção de Hudson Senna permanece de mãos atadas diante de um texto tão ruim. 

Tanto no surrealismo como no teatro do absurdo, a crítica está na forma e apenas nela. No primeiro, a estrutura parte para a esfera do sonho como uma negação sumária da realidade. No segundo, a lógica do mundo contemporâneo parece ao autor tão equívoca que, na narrativa, ela é abolida cabalmente. Em “Véspera”, há tanto referências a um como a outro, mas todas elas se perdem em meio a uma família cujas relações se abrem na noite de natal e com uma clara crítica nos diálogos à dependência à tecnologia. Além disso, muitos diálogos, como a importância do pênis do marido ou a estranheza de sentir fome antes de ir ao banheiro, mais parecem tirados de uma comédia de costumes, o que evidencia uma dramaturgia cambaleante na qual toda encenação está infelizmente apoiada. 

Hudson Senna se esforça e consegue bons resultados sobretudo nas cenas finais, quando os personagens se expõem mais puramente. Além disso, os atores Cris Nicollotti (Eva), Tadeu Di Pyetro (Paulo), Juçara Morais (Tita), Silvia Lourenço (Filha) e Rafael Maia (Dalton) conseguem positivamente driblar os diálogos ruins e oferecer trabalhos de interpretação bastante positivos. Nicollotti, a protagonista, usa bem o corpo, o gestual e a voz para construir a mãe que quer se divertir na noite de natal. Morais é forte e pontual nas suas rápidas participações. Todos têm excelente dicção e fazem ótimo uso dos tempos, garantindo bom ritmo. 

O cenário e o figurino de Márcio Vinicius auxilia o texto a ficar mais perdido do que já está, mas oferece um belo retrato da confusão em que esses personagens estão metidos. Em plena noite de natal, os satélites deixaram de funcionar e os equipamentos eletrônicos perdem a função. A luz elétrica cai e os vizinhos iniciam uma revolução/mobilização. No interior da casa, a família espera um filho que talvez virá no dia seguinte enquanto segredos são revelados. Nessa narrativa, a iluminação de Paulo César de Medeiros e a trilha sonora original de Fábio Sá têm responsabilidade ímpar e cumprem bem o seu papel, sendo pontos altos da obra como um todo ao lado das interpretações. 

"Véspera", que estreou em setembro de 2010, está em cartaz no Teatro Maison de France no Rio de Janeiro.


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Ficha Técnica 

Texto: Camila Appel 
Direção: Hudson Senna 

Elenco / Personagens: 
Cris Nicolotti / Eva 
Tadeu Di Pyetro / Pai 
Juçara Morais / Empregada 
Silvia Lourenço / Filha 
Rafa Maia / Dalton, o vizinho 

Cenário e Figurinos: Márcio Vinicius 
Iluminação: Paulo Cesar Medeiros 
Trilha Sonora Original: Fabio Sá 
Programação Visual: Amanda Vieira e Flavio Rossi 
Fotos: Bob Sousa 
Direção de Vídeo: Jackson Ono 
Produção Executiva: Paulo Ferrer 
Direção de Produção: Cristina Sato 
Realização: Jaburá produções 
Assessoria de Imprensa: JSPontes Comunicação – João Pontes e Stella Stephany 

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