Lu Camy (na foto), Dida Camero e Gabriel Delfino Marques brilham no elenco |
A feliz estreia de Rodrigo Padolfo na direção
É uma delícia ver “A moça da cidade”. Com pouquíssimas pretensões e muito investimento estético, a peça diverte e emociona enquanto apresenta excelentes trabalhos de interpretação, de direção, de cenário, figurino, trilha sonora, iluminação e de projeções. Ou seja, em cada parte, há qualidade que reforça o compromisso do todo em viabilizar um bom espetáculo. Em cartaz na Sala Multiuso do Espaço Sesc Copacabana, cuja programação tem sido bastante especial, “A moça da cidade” marca a estreia do premiado ator Rodrigo Pandolfo na direção. No elenco, Dida Camero, Gabriel Delfino Marques e principalmente Lu Camy brilham.
O texto, originalmente “Uma moça da cidade”, foi escrito pelo ator e dramaturgo mato-grossense Anderson Bosh (é possível ler o texto clicando aqui). Recebeu montagem em 2000 e em 2007, tendo viajado pelo país nas duas oportunidades. A montagem atual modifica diversos pontos do texto, quase produzindo uma nova dramaturgia que infelizmente não está creditada. O resultado que se vê em cena é bastante positivo.
A história de Ambrosina é contada como uma novela de rádio. O público está dentro de um estúdio em pleno anos 40 quando os técnicos e os atores entram e tomam seus lugares. Os microfones são ligados e os rádio-atores, com o texto na mão, começam o programa “Sua vida em novela”, construído a partir de histórias enviadas pelos ouvintes. “A moça da cidade” foi escrita por Ambrosina, que já tem mais de oitenta anos. Ainda muito jovem, ela sai da cidade interiorana de Paradeiro da Alegria para fazer o curso ginasial no Rio de Janeiro. Na cidade grande, se hospeda em uma pensão e, numa noite, vê um homem vestido de branco por cuja figura se apaixona. A partir de então, começa a saga de reencontrar esse homem. A tese é simples: disposta a encontrar um amor ideal e distante, a heroína não percebe que sua felicidade está bem mais próxima.
Na encenação de Rodrigo Pandolfo, a história de narrada passa a ser interpretada. O estúdio ganha cores dos cenários por onde Ambrosina passa: a pensão de Dona Rosa, o Passeio, o Cine Odeon, a festa de formatura. Dida Camero e Daniel Delfino Marques se sucedem na construção dos diversos personagens enquanto Lu Camy se concentra em Ambrosina, a protagonista. O melhor é identificar como a superficialidade do enredo se equilibra com o aparato estético que o dá a ver, resultando em um espetáculo complexo, mas nada difícil de assistir. “A moça da cidade” é um excelente espetáculo de entretenimento sobretudo.
Os três atores conseguem os melhores resultados dentro do tamanho de seus personagens. Dida Camero tira proveito de cada segundo sob o refletor para exibir uma interpretação que critica e se auto-critica, diverte e parece lhe dar divertimento também. Os L`s pronunciados na rádio-narração, o sotaque uruguaio de Rosa, o olhar sedutor da professora na formatura são pequenos detalhes permitem pensar o quanto cada detalhe foi bem pensado. Gabriel Defino Marques tem excelente construção de tipos. Os R`s e a embocadura do locutor de rádio da primeira metade do século XX, a simplicidade de Leitinho, a afetação do obstetra são marcas que, no boa medida farsesca, permitem reconhecer facilmente os personagens e oferecem um ritmo vibrante para a narrativa. Do início ao fim, a Ambrosina de Lu Camy é apaixonante em sua simplicidade tosca. O tipo nordestino enfezado, determinado, duro expõe a sensibilidade de alguém que quer, antes de tudo, ser feliz. Ambrosina enternece.
Não só a trilha sonora, mas principalmente a sonoplastia de Marcelo Alonso Neves fazem de “A moça da cidade” um espetáculo. Destaque para os momentos em que Dona Lininha lava louças e serve-se de bebida. Na elegância de sempre, Miguel Pinto Guimarães faz o cenário participar efetivamente em pequenos detalhes de forma inteligente. As linhas retas, as formas limpas, o privilégio da madeira reproduzem simbolicamente o estúdio da rádio em anos 40-50, mas que também podem ser a pensão adequadamente. Nessas mudanças de ambiente espacial e narrativo, a iluminação de Tomás Ribas e o figurino de Bruno Perlatto são meritosas. Nesse último, destaque para a forma como os figurinos de Ambrosina e de Lininha conversam.
Com direção de movimento de Victor Maia, Rodrigo Pandolfo, assistido por Victor Varandas, consegue um excelente trabalho de direção não só de atores, mas de toda produção em si. A estrutura se movimenta artisticamente em um todo articulado e nobre que diverte e encanta. Eis aqui uma ótima produção na programação de teatro carioca.
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Ficha técnica
Texto: Anderson Bosch
Direção: Rodrigo Pandolfo
Elenco: Gabriel Delfino Marques, Lu Camy e Dida Camero
Direção musical: Marcelo Alonso Neves
Trilha sonora: Rodrigo Pandolfo
Preparadora corporal: Ana Achcar
Direção de movimento e coreografias: Victor Maia
Iluminador: Tomás Ribas
Cenário: Miguel Pinto Guimarães
Figurino: Bruno Perlatto
Visagismo: Sid Andrade
Direção de vídeo: Felipe Bond
Direção de produção: Tatianna Trinxet
Há verdade em tudo que escreveu sobre a peça.
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