quinta-feira, 30 de julho de 2015

Paparazzi (RJ)

Foto: divulgação

Karla Concá tem o melhor trabalho do elenco


Matéi Visniec mal dirigido e com muitos problemas nas interpretações

Estreia mal “Paparazzi”, espetáculo resultante da turma de atores profissionais da Casa de Artes Laranjeiras – FACULDADE CAL, que, em nova montagem, iniciou ontem temporada no Centro Cultural do Banco do Brasil. O maior problema dessa versão é a direção de Adriana Maia que não expressa qualquer reflexão plausível nem sobre o texto, nem sobre a encenação. No elenco, Malu Valle, Xando Graça, Alexandre Varella, Lipy Adler e Rafael Queiroz dão a ver boas tentativas de trabalho interpretativo ao lado de Leonardo Vieira, Isa Lobato e de Alexandre David em péssimas participações. De toda a produção, o único destaque positivo é o trabalho de Karla Concá principalmente quando é A Dona. Tendo estreado em maio desse ano com outras pessoas no elenco, essa produção é uma oportunidade desperdiçada de se conferir um espetáculo do romeno Matéi Visniec. Uma pena!

Essa é a primeira montagem de “Paparazzi ou A crônica de um Amanhecer Abortado” no Brasil. Escrito há vinte anos e produzido pela primeira vez em 1997, em Provença, na França, o texto foi publicado em 2012 pela editora É Realizações. A dramaturgia parte da explosão do sol para analisar os mais diversos tipos de reações da humanidade diante do acontecimento. Ao longo da madrugada em que o fato acontece, um Paparazzo (Leonardo Vieira) está fotografando os movimentos de uma mulher que dá uma festa em sua casa, enviando notícias para seu Chefe (Xando Graça). Esses personagens, como vários outros que aparecem ao longo da narrativa, surgem no texto tais quais os anônimos do cinema neorrealista italiano: são tijolos de uma construção social cuja decrepitude o autor quer revelar. De todos os que aparecem, apenas uma personagem realmente se estarrece com a morte do sol: a Cega (Malu Valle) que, de qualquer modo, não poderia vê-lo. Ao seu redor, a longa noite fictícia é campo onde ficam mais vivas a animalidade, a embriaguez, a fúria, os egos, a loucura, mas os personagens, diferente da audiência, não sabem disso. Essa é uma reflexão que Matéi Visniec divide somente com o público. Nesse sentido, “Paparazzi” é melhor lido sob inspiração do Teatro do Absurdo, do qual Eugène Ionesco (1909-1994) e Samuel Beckett (1906-1989) são grandes referências. Dada uma falta de lógica no mundo, os personagens vivem alheios aos acontecimentos, abandonados em suas existências. Infelizmente, não foi em direção a esse quadro que Adriana Maia fez caminhar a sua encenação.

Em entrevista, Adriana Maia cogita o surrealismo e o realismo mágico como seu modo de ler a obra de Visniec, mas nem um, nem outro, assim como nem o Absurdo aparecem nessa sua versão de “Paparazzi”. Para o surrealismo, falta o ponto de vista onírico para as emoções em sua encenação. Para o mágico, falta (em todos os sentidos) a verossimilhança a partir da qual o fantástico conseguiria surgir. Apenas na interpretação de Karla Concá (A Dona), veem-se positivamente marcas de abandono, de vazio ou de ascendência clownesca que podem sugerir o Absurdo. Por outro lado, Leonardo Vieira (Paparazzo 1) e Isa Lobato (A Descalça) empregam enorme força em expressar o que não existe enquanto Alexandre David (Mendigo) sustenta todos os seus personagens nos figurinos e em tentativas de interações com a plateia  pobremente. Nas demais interpretações, há fortes doses de realismo, todas elas desamparadas da dramaturgia porque “Paparazzi” não é uma comédia de costumes. O ritmo do espetáculo é bastante ruim, a justaposição das cenas não evidencia um pensamento anterior a elas, os elementos não se articulam. Além disso, a opção por usar atores em cena interpretando aquilo que, no original, são apenas vozes impede a dramaturgia de valorizar o obscuro (as faces desses personagens pertencem ao público por um motivo estético que parece não ter sido investigado por Adriana Maia).

Em um palco transversal (um corredor que atravessa o público) que se une a dois outros nas extremidades, a peça se apresenta através de uma confusão estética prejudicial. No cenário de Mina Quental, papelão forra o chão e alguns móveis de todo o espaço cênico sob luzes incandescentes, mas, em direção oposta, o figurino de Adriano Ferreira é bastante realista. Além disso, há objetos simbólicos, como a garrafa de champagne como fonte; referenciais, como uma versão em miniatura de uma cabine telefônica inglesa para todo um telefone em si; e outros realistas, como as máquinas fotográficas, as bebidas e o aparelho telefônico usado pela Cega (Malu Valle), resultando em uma barafunda visual que nada acrescenta.

No Brasil, já estiveram em cartaz desse autor as peças “A História do Comunismo Contada aos Doentes Mentais”, dirigida por André Abujamra e Miguel Hernandez; “A Volta para Casa”, por Regina Duarte; “2 x Matei”, por Gilberto Gawronski; “Espelho para Cegos”, dirigida por Márcio Meirelles; entre outras. Essa montagem de “Paparazzi ou A crônica de um Amanhecer Abortado” deixa muito a desejar.

*

Ficha Técnica

Direção: Adriana Maia

Texto: Matéi Visniec

Tradução: Alexandre David

Elenco: Alexandre David, Alexandre Varella, Isa Lobato, Karla Concá, Leonardo Vieira, Lipy Adler, Malu Valle, Rafael Queiroz e Xando Graça

Direção Musical: Alexandre Elias

Direção Vocal Interpretativa: Glorinha Beuttenmüller

Direção de Movimento: Luciana Bicalho

Cenário: Mina Quental

Figurinos: Adriano Ferreira

Direção de Produção: Adriana Maia e Leonardo Vieira

Produtor Executivo: Gustavo Henrique

Assistente de Direção, Diretor de Palco e Operador de luz: João Maia

Consultoria de Produção: Dadá Maia

Coro Sonoplasta: Alexandre Menezes, Calu Silveira, Camila Monteiro e Lucas Asseituno

Iluminação: Anderson Ratto

Apoio institucional: Instituto CAL de Arte e Cultura

Fotografias: Isa Lobato e Alvaro Victor

Assessoria de Imprensa: Duetto Comunicação

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Bem-vindo!