terça-feira, 14 de julho de 2015

Neurótica (RJ)

Foto: Guilherme Maia




Flávia Reis

Flávia Reis diverte em espetáculo solo sobre as neuroses contemporâneas

“Neurótica” é um monólogo em que Flávia Reis interpreta várias personagens, todas elas responsáveis por oferecer novos pontos de vista do assunto que dá título a essa comédia. Com bom roteiro escrito pela atriz em parceria com Henrique Tavares e com boa direção de Marcio Trigo, a peça começa com uma psicóloga falando sobre a neurose no comportamento da mulher contemporânea, seu histórico, características e suas consequências no dia a dia. Em destaque, está o excelente videografismo da dupla Rico e Renato Vilarouca e o ótimo cenário de Mina Quentão. Flávia Reis apresenta habilidade na construção de tipos e na manutenção do ritmo dentro de cada cena. O espetáculo, devido ao sucesso, permanecerá em temporada no Teatro Carlos Gomes, na praça Tiradentes, até o dia 19 de julho.

O roteiro de Flávia Reis e de Henrique Tavares apresenta bem os personagens, mas poucos estão abrigados por uma situação dramática que lhes sustente sobretudo mais para o fim de cada um. A Mulher que reclama com o guarda do estacionamento do shopping porque não encontra seu carro é uma exceção positiva. Sem depender tanto de auto-afirmações, essa situação informa sobre o universo da personagem tanto quanto aquilo que ela diz sobre si própria. Bem diferente, mas muito interessante também, a Senhora de Copacabana que reclama sobre a situação que o mundo vive atualmente parece ser mais engraçada pelo modo como ela mostra se relacionar com as regras do politicamente correto do que por ela em si. A Promotora de eventos, a Conectada e a Elegante se perdem no esforço dramatúrgico de fazer rir com pouco que as ampare. O final, com referência ao grande espetáculo musical, essa dramaturgia revela os aspectos mais fracos da intérprete negativamente. No geral, a ordem dos quadros de “Neurótica” atinge bom nível logo no início e positivamente se estabiliza com o passar do tempo. As voltas ao quadro inicial é um ótimo recurso em favor disso.

A direção de Márcio Trigo propõe um uso do palco relativamente rico para essa narrativa, explorando ambientes, níveis e relações com o público diversas. O modo como a atriz e o ator convidado (Flávio Souza substituindo Anderson Cunha) se relacionam, no entanto, não é equilibrada. Em algumas passagens, a coadjuvância (o papel que a participação tem na constituição das cenas) apresenta marcas de mera figuração um tanto claras demais, perdendo a oportunidade de valorizar a obra como poderia. O cenário de Mina Quental embeleza o quadro com vivacidade bem articulada com o videografismo de Rico e de Renato Vilarouca, esse último aspecto bastante meritoso em sua colaboração com o ritmo da encenação. O figurino de Flávio Souza, as músicas de Guilherme Miranda e o desenho de luz de Aurélio de Simoni também têm boas participações.

No que diz respeito à interpretação, Flávia Reis tem excelente timing de comédia. A Vanda da Van, personagem que aparece antes do início da peça; a Psicóloga, que protagoniza a narrativa; além das já citadas Senhora de Copacabana e Mulher do Estacionamento, são momentos em que a habilidade de Reis em usar bem as entonações e as pausas para criar oportunidades de comédia é tão boa quanto seu talento em dar a ver tipos interessantes. O mais importante: Flávia Reis tem carisma e segura bem a plateia, o que provavelmente é uma das justificativas do sucesso da temporada.

Além dos méritos formais, “Neurótica” vale a pena ser visto porque sugere uma reflexão sobre as neuroses vividas pelo homem na contemporaneidade. O amplo acesso à informação, as interferências da vida pública na particular e vice-versa e a facilidade das comunicações virtuais são algumas das questões que perpassam o dia a dia nesse início de século XXI. Divertir-se enquanto se reflete sobre questões mais sérias é uma ótima pedida.

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Ficha técnica:
Idealização e atuação: Flávia Reis
Direção: Márcio Trigo
Texto: Henrique Tavares e Flávia Reis
Participação: Anderson Cunha
Direção Musical e Trilha Sonora Original: Guilherme Miranda
Iluminação: Aurélio de Simoni
Sonorização: Vinicius Geria
Cenário: Mina Quental
Coreografia: Andrea Jabor
Figurinos: Flávio Souza
Assessoria de Imprensa: Nano Ribeiro
Design Gráfico: Hannah23
Videografismo: Rico Vilarouca e Renato Vilarouca
Realização: Rainha Produções Artísticas

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