quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

"S'imbora, o musical" (RJ)

Foto: divulgação

Ícaro Silva

O melhor musical biográfico
“S’imbora, o musical – A história de Wilson Simonal” é o melhor musical biográfico de todas essas produções do gênero realizadas nos últimos anos no Rio de Janeiro. Escrito por Nelson Motta e por Patrícia Andrade, o texto apresenta um personagem, celebrando fatos reais como méritos de uma história que é bem contada. A direção de Pedro Brício articula de forma coesa o quadro em que a narrativa se dá, atravessando o tempo com ótimo ritmo. Brilhantemente interpretado por Ícaro Silva, Wilson Simonal (1938-2000), cuja trajetória é um dos melhores momentos da música popular brasileira, merece os vastos elogios que essa produção, em cartaz no Teatro Carlos Gomes, tem lhe oferecido. 

         A história começa com dois investigadores (Paulo Trajano e Kadu Veiga) dos porões da ditatura aguardando notícias sobre a procura de Wilson Simonal (Ícaro Silva). Segundo consta, abalado pelo desarranjo em suas finanças, o cantor brasileiro mais famoso naquele começo dos anos 70, havia mandado torturar seu contador. Dessa cena inicial tensa e obscura, surge o colorido vibrante de Carlos Imperial (Thelmo Fernandes) quando a história de Simonal tem um dos seus inícios. Os autores Nelson Motta e Patrícia Andrade, com bastante sensibilidade, estruturam brilhantemente a subida do personagem negro, pobre, muito talentoso e dono de um carisma arrebatador que foi considerado o maior astro da música popular brasileira. O protagonista se apresenta na narrativa ao lado das referências do mundo real, mas sem depender delas. Na primeira parte, o público está diante de um Simonal relativamente linear cujo sorriso ilumina as dificuldades de seu caminho para a fama, alçando sonhos improváveis para um garoto do subúrbio carioca. Eis que, já no segundo ato, vem a primeira quebra. E, depois, um golpe derradeiro, quando a cena da ditadura tem seu fim. Simonal perde o sorriso e o gosto amargo ainda paira na boca quando vem a cena final, essa de extremo bom gosto, seguida do epílogo que traz de volta a apoteose que o público deve ao cantor. Envolvemente, tem-se aqui uma belíssima narrativa!

         Thelmo Fernandes narra a história através da interpretação do personagem Carlos Imperial, uma figura célebre da cultura carioca contemporânea. É ele quem, com muita graça, conduz a narrativa, aproximando a plateia do palco deliciosamente. Victor Maia, principalmente como Eduardo Araújo, faz ótimas participações ao longo do espetáculo, com êxito nas interpretações além das de canto e dança pelos quais ele já é bem conhecido. Paulo Trajano, Kadu Veiga, Gabriela Carneiro da Cunha (Tereza Pugliese) e principalmente Ariane Souza (Imperialete) garantem destaques positivos em um conjunto de trabalhos sem aspectos negativos, no que o mérito da direção de Pedro Brício, assistido por Gustavo Wabner, é bastante visível. No entanto, dentre todos, é do protagonista o maior aplauso. Ícaro Silva interpreta Simonal de forma excelente. Além de dar o seu tom para as marcas do personagem, nesse trabalho, o ator também contextualiza a figura na narrativa, apresentando o protagonista com toda a alegria possível na primeira parte para, em seguida, dar a ver mais terrivelmente a consequência visual da sua queda. Tendo já assinado ótimas participações em musicais como “Rock’n’Rio” e “Elis”, Ícaro Silva brilha.

          “S’imbora”, produzido por Luiz Oscar Niemeyer, traz ao Brasil o gostinho de Broadway. A produção evidencia positivo empenho nos grandes cenários (Helio Eichbauer) que entram e saem na hora certa, nos figurinos (Marilia Carneiro) com detalhes bem cuidados, no desenho de luz (Tomás Ribas) complexo e com operação pontual, nas coreografias (Renato Vieira) relativamente desenhadas e principalmente na orquestra que dá a ver arranjos (Alexandre Elias) coesos e coerentes. Participa do espetáculo um repertório popular facilmente identificável que é interpretado de forma original. Viva!

         Nelson Motta, Patrícia Andrade e Pedro Brício se utilizam das mazelas de Wilson Simonal para trazê-lo para mais próximo do público ao invés de sacralizar o homenageado como infelizmente tem acontecido nas biografias musicais. Talvez seja porque os autores e o diretor entendam que a grande produção não é sinônimo de sucesso se não trouxer em si também a boa narrativa de uma boa história. Ou porque sabem que o público não investirá sua atenção em uma boa história se não se encontrar nela. E esse grande Wilson Simonal, tão grandemente visto através do talentoso Ícaro Silva, é também cada um de nós em nossos erros e em nossos sonhos. Trabalhou, trabalhou!


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 FICHA TÉCNICA
Texto de Nelson Motta e Patrícia Andrade
Direção Geral: Pedro Brício
Direção Musical: Alexandre Elias
Cenário: Hélio Eichbauer
Figurino: Marília Carneiro
Coreografias: Renato Vieira
Produção Geral: Luiz Oscar Niemeyer
Direção de Produção: Joana Motta
Patrocínio: Cielo
Apoio Cultural: Bolt e Taesa
Realização: Planmusic

 Elenco:
Ícaro Silva (Simonal)
Thelmo Fernandes (Carlos Imperial)
Gabriela Carneiro da Cunha (Tereza)
Gabriel Staufer (Miele/Walter Clark/ Guinsburg)
Kadu Veiga (Marcos Moran/Boscoli)
Victor Maia (Roberto Carlos/ Eduardo Araujo/ Cesar Camargo)
Marino Rocha (Jô/Boni)
Marina Palha (Elis/Jane Burkin)
Jorge Neto (Pelé/Simoninha/Zé Ary/ Jair)
Paulo Trajano (Delegado/Zagallo/ Flavio Cavalcanti)
Cássia Raquel (Sarah Vaughan)
Dennis Pinheiro (Sabá e Carlos Alberto Torres)
Lívia Guerra ( Marly Tavares / imperialete)
Natasha Jascalevich (Brigite Bardot/ Laurinha Figueiredo)
Kotoe Karasawa (apresentadora da Record)
Ariane Souza (imperialete)
e JP Rufino e JD d´Aleluia (Simonal criança)

 Banda:
Alexandre Elias: guitarra
Kim Pereira: bateria
Denize Rodrigues: sax
Romulo Duarte: baixo
Vinicius Lugon: trompete
Antonio Neves: trombone
Reginaldo Vargas: percussão
Fernanda Torres: pianista

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