Claudia Mello e Denise Fraga em cena |
Espetáculo cheio de méritos
Última peça que teve texto e direção de Fauzi Arap, “Chorinho” é o espetáculo cuja produção celebra os 50 anos de Denise Fraga. A peça, que está em cartaz no Teatro dos Quatro, no Shopping da Gávea, zona sul do Rio de Janeiro, narra o encontro que se dá e uma praça pública entre uma moradora de rua e uma senhora solitária de classe média. Em cena, o choque entre valores, entre visões de mundo e entre possibilidades na vida, e a graça do inusitado que uma boa história pode revelar. Ao lado de Denise Fraga, Claudia Mello também apresenta ótimo trabalho de interpretação.
Escrito em 2007, quando essa dramaturgia ganhou o prêmio APCA de Melhor Texto, essa montagem de “Chorinho” foi produzida em 2012 sob a direção de Fauzi Arap (1938-2013) e de Marcos Loureiro. A peça conta a história de uma mulher (Claudia Mello) que, como de costume, vai a uma praça pública conversar com as flores, mas, um dia, é abordada por uma moradora de rua (Denise Fraga) que sempre a vê passar sem nunca receber um cumprimento cordial. Logo na abertura, está em pauta a existência dos “fantasmas sociais”, aquelas pessoas que transitam pelo caminho, mas cujas faces não são reconhecidas. A situação reflete a desumanidade das relações sociais, essas cada vez mais pragmáticas. O diálogo inicial evolui na medida em que avança pelo tempo. O encontro se repete e a motivação deixa de ser casual como foi o primeiro. Entre as duas, uma relação começa a nascer. Para longe de um clichê melancólico e cafona, o desenvolvimento e o final enternecem o espectador que sai do teatro refletindo sobre o que viu. Excelente.
Denise Fraga tem o mérito de não investir no bufão, talvez, consciente de que esse registro levaria o espetáculo para outros caminhos que não o para qual ele nasceu. Essa “mendiga” fala bem, se movimenta com relativa leveza, sustenta uma figura não tão desagradável. Nesse sentido, a concepção consegue fazer bem a mínima e necessária referência ao morador de rua, mas ainda mantendo o público próximo o suficiente para fruir o mais importante: a relação entre as duas personagens. Claudia Mello é digna dos elogios que recebe desde 2007, apresentando, no mesmo sentido que Fraga, a mulher de classe média que sabe ser discreta, mas por vezes antipática e intolerável. Nesse meio de caminho entre as referências e o que importa para o sucesso da narrativa, os dois trabalhos de interpretação se encontram bem e garantem uma história contada com elogiável fluidez.
Mal utilizada muitas vezes, a palavra “despojada” quase sempre quer dizer “simplório e sem a presença de um conceito”. “Chorinho”, cujo cenário não tem assinatura, é composto apenas por um banco de praça. A ausência de todo o resto é uma informação: de um lado, essa praça pode ser qualquer lugar. De outro, o encontro entre essas duas personagens é o que preenche o vazio de ambas existências. O figurino de Cássio Brasil, em que se incluem os objetos usados pela personagem de Denise, marca a passagem do tempo além de bem apresentar os personagens. O espetáculo tem ainda bom desenho de luz de Marcos Loureiro e Nadja Naira e boa trilha sonora de Aline Meyer, ambos em adequada articulação com o desenrolar das cenas.
Celebrando também os trinta anos de trajetória artística da atriz Denise Fraga, “Chorinho” é cheia de méritos.
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FICHA TÉCNICA
Texto: Fauzi Arap
Elenco: Denise Fraga e Cláudia Mello
Direção: Marcos Loureiro e Fauzi Arap
Iluminação: Marcos Loureiro e Nadja Naira
Trilha Sonora: Aline Meyer
Figurinos: Cássio Brasil
Visagismo: Simone Batata
Fotos: João Caldas
Direção de Produção: José Maria
Realização: NIA Teatro
Assessoria de imprensa: Barata Comunicação
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