Foto: Paula Kossatz
Méritos e Desméritos
“Rebeldes
– sobre A Raiva” é o novo espetáculo dirigido por Rodrigo Nogueira. A partir do
texto dramático escrito em 1997 pela israelense de Edna Mazya (1949), a
produção surge com doze atores no elenco e conta a história de Mikaela, uma
apresentadora de televisão que, depois de assistir ao enterro de um amigo,
resolve visitar com o filho os túmulos de seus familiares. Diante do túmulo da
mãe, ela encontra um senhor já de idade avançada que conheceu os seus pais,
encontro esse que vira chave para que várias lembranças do passado de ambos
venham à tona. Na verdade, Mikaela está diante daquele que foi o amante de sua
mãe por vinte anos. Dividindo a narrativa em três planos temporais, a saber
1945, 1967 e 1997, o espectador conhece os diferentes personagens participantes
da história, evoluindo na profundidade do conflito que parte de questões da
ordem dos personagens até chegar às questões da ordem da relação entre eles. As
memórias que surgem a partir da conversa deixam ver os diferentes pontos de
vista sobre os mesmos fatos que cada um deles têm. Visto por Mikaela, um beijo
entre Martha (a mãe) e Shaul (o amante) faz com que, entre mãe e filha, haja um
afastamento definitivo. Trinta anos depois, é hora de conhecer as
circunstâncias em que esse beijo aconteceu. Em “The Rebels”, Mazyo aproxima
Martha e Mikaela, mãe e filha, ambas com fortes posicionamentos políticos que
se misturam aos conflitos de suas vidas afetivas, deixando ver a força dos
relacionamentos de sangue, a volta às origens. A dupla de diretores da versão
teatral, Rodrigo Nogueira e Fabrício Belsoff, faz força em apagar a proximidade
entre as duas personagens protagonistas, privilegiando negativamente as
questões superficiais do texto: os posicionamentos políticos adversos, as
situações históricas nos diferentes momentos da história, a raiva como um
elemento comum no universo de cada figura. O que é apenas ponto de partida em
Mazyo, em “Rebeldes – sobre A Raiva” é ponto de chegada. Quem perde é o público
que tem, diante de si, um espetáculo cansativo, lento, de difícil fruição
apesar de alguns trabalhos de interpretação bastante interessantes.
O
fato do posicionamento político em relação à guerra ser apenas marca da
construção do personagem e não ser o vetor fundamental que faz girar a
narrativa se comprova no personagem Yali, filho de Mikaela, que odeia a
Inglaterra simplesmente porque lá nasceram as Spice Girls. No mesmo sentido,
Alma, irmã de Mikaela, não tem qualquer relação com a política, sofrendo um
acidente por conta da embriaguez e não em um conflito internacional. A opção da
direção em privilegiar a guerra tem conseqüências fundamentais no ritmo da
narrativa: as cenas cujos diálogos não foram escritos dentro desse tema ficam
sem sentido, pesadas, como se estivessem deslocadas, enquanto que as cenas de
ação, e só há duas (o assassinato do Tenente Williams e o embarque para a
África do Sul), correm vertiginosas. O vibrante jogo de palavras nas conversas
entre Mikaela e Yali, entre Martha e o Tenente Williams ou entre Martha, Alma e
Yoel (o marido) se equilibram com as soluções clichês das curvas da narrativa
(a forma como Martha saiu da vida de Shaul e o convite final de Mikaela para
Shaul).
Paulo
Verlings (o jovem marido Yoel) e Joana Lerner (a jovem cunhada Alma) brilham no
elenco que também traz os bons trabalhos de Johnny Massaro (Yali) e de Marcela
Muniz (Alma). Verlings e Lerner trazem vida à narrativa, apresentando força,
agilidade, graça, presença cênica, com carisma, focos bem dirigidos, pausas bem
distribuídas e entonações complexas. Por outro lado, João Velho (Tenente
Williams) apresenta uma interpretação afrouxada, baseada unicamente no sotaque
que só lembra o britânico nas frases ditas em inglês, e Rogério Fróes (Shaul)
uma voz cujo volume é negativamente baixo demais, fazendo o ritmo de suas cenas
quase parar também pela dicção não cuidadosa e um corpo quase sem expressão.
Tão positivos quanto são os figurinos de Angèle Fróes, porque leves e
adequados, discretos e pontuais, é negativa a concepção do cenário de Hilton
Barredo. Os 12 túmulos brancos no chão de grama verde formam um belo quadro de
abertura para a peça, mas que se constitui um grande problema para o resto da
narrativa cênica, uma vez que as trocas acontecem de forma expressiva demais em
função do peso (físico e visual) que cada objeto parece ter. Infelizmente, complementado
ainda por projeções em vídeo, o resultado visual que as mudanças resultam acaba
por não compensar em grandes momentos estéticos da obra.
No
limite invisível entre o que é texto original (Mazyo), o que é texto adaptado
(Nogueira) e o que é direção (Nogueira/Belsoff), fica difícil saber de quem são
os méritos e os desméritos da produção em cartaz no Teatro Arena Sesc
Copacabana. O importante é saber que, em igual peso, há os dois.
*
Ficha técnica:
Texto: Edna Mazya / Adaptação e
Direção: Rodrigo Nogueira / Co-Direção: Fabrício Belsoff / Elenco: Rogério
Fróes, Bruno Gradim, Marina Vianna, Laila Zaid, Marcella Muniz, Joana
Lerner,Paloma Riani, Keruse Bongiolo, Johnny Massaro, João
Velho, Antonio Karnewale, Paulo Verlings /Cenário e Vídeo-projeção:
Hilton Berredo / Figurino: Angèle Fróes / Iluminação: Paulo César
Medeiros / Direção Musical: Rodrigo Marçal (Cabelo) / Preparação
Corporal: Marcia Rubin /Pesquisa e Edição de Imagens: Juliano Gomes / Design
Gráfico: Dávila Pontes / Produção: Lúdico Produções / Realização:
SESC Rio / Assessoria de Imprensa: JSPontes Comunicação – João Pontes e
Stella Stephany
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