quinta-feira, 12 de abril de 2018

Um dia como os outros (RJ)

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Foto: divulgação 

Analu Prestes, Bianca Byington e Flávio Pardal


Uma ótima comédia inteligente
A comédia “Um dia como os outros”, que fez enorme sucesso nos palcos cariocas em 2011, fez nova temporada durante o mês de março no teatro do Espaço Cultural Sérgio Porto, no Humaitá, zona sul do Rio de Janeiro. Dirigida por Byington e por Leonardo Netto, o espetáculo é a primeira versão brasileira de texto original francês escrito por Agnès Jaoui e por Jean-Pierre Bacri em 1994. Na história, a família Ménard se encontra toda semana no bistrô do falecido pai, mas, dessa vez, os conflitos internos de seus integrantes parecem estar em vias de explodir. O resultado é uma comédia hilariante que é metáfora para as relações humanas, se tornando, além de ótimo entretenimento, também objeto de reflexão. No elenco, estão Analu Prestes, Flávio Pardal, Leandro Castilho, Márcio Vito, Silvia Buarque além de Byington em ótimos e muito elogiados trabalhos. Valeu a pena assistir e torce-se para que esse retorno se estenda para todo o país. 

Um texto internacionalmente reconhecido
“Un air de famille” fez enorme sucesso em Paris quando estreou em setembro de 1994. Seus autores, Agnès Jaoui e por Jean-Pierre Bacri, parceiros desde 1987, estavam no elenco na montagem dirigida por Stéphan Meldegg. Dois anos depois, Cédric Klapisch levou o roteiro para o cinema, vencendo vários prêmios, inclusive os César de Melhor Roteiro. No Brasil, a versão cinematográfica ganhou nome de “Odeio te amar”, mas não foi lançada comercialmente. No ano passado, Jaoui dirigiu e atuou em nova montagem que segue cumprindo apresentações internacionais. 

Na história, está-se em uma sexta-feira como qualquer outra, já no fim do expediente, dentro do antiquado bistrô “Au Pére tranquillle”, nome que faz referência a um filme francês dos anos 40 sobre família. O estabelecimento, que ainda conserva um ar de meio de século XX, pertenceu ao patriarca da família Ménard, que já faleceu há alguns anos quando a peça começa. Nesse dia, comemora-se o aniversário de Yollande, a esposa de Philippe Ménard, mas também a aparição dele em um programa de televisão, oportunidade em que ele tenta falar bem da empresa onde trabalha e conseguir, assim, maior reconhecimento de seu chefe. 

O bistrô é dirigido por Henri Ménard, o filho mais velho, que é casado com Arlette. De maneira incomum, ela está atrasada para o rotineiro encontro familiar do marido, o que obriga os Ménard a esperar por ela, despediçando o tédio em acender as fogueiras individuais. Assiste a tudo o funcionário Denis, esse cada vez mais íntimo de Betty Ménard, a única filha da família. Para o público, fica óbvio a dramaturgia é oportunidade para os autores tratarem dos fantasmas individuais, fazendo os personagens confrontarem-se consigo através dos reflexos com seus opostos e/ou pares. 

Uma das questões é reconhecimento, pois os Ménard reagem bastante mal ao comportamento do funcionário Denis, mas têm reações adversas no convívio com o chefe de Philippe (que é também chefe de Betty). Outro ponto de vista é o estado civil. Betty, que já passou dos trinta mas conserva um espírito adolescente bem arraigado, não é bem vista pela Mãe, que mal sabe que outro de seus filhos está prestes a ficar solteiro também. De pauta em pauta, a peça – de um ato e de uma cena só – vai deixando ver uma luta interna em que os egos duelam pela sobrevivência e em que Denis e principalmente Yollande são os juízes. 

Em 2011, quando a versão brasileira estreou, a montagem recebeu várias críticas positivas. Ela fazia, juntamente com a produção de “Cozinhas e dependências” dos mesmos autores, parte do projeto “Duas Peças, apresentando-se ambas em conjunto. Analu Prestes (Mãe) ganhou o Prêmio APTR de Melhor Atriz Coadjuvante, Bianca Byington (Yollande) venceu o Prêmio Arte Qualidade Brasil de Melhor Atriz de Comédia e o espetáculo ainda levou o Prêmio Shell de Melhor Cenário e o Questão de Crítica de Melhor Elenco. Tudo isso além de várias outras indicações. A tradução, bastante qualificada, é assinada por Angela Leite Lopes, Bárbara Duvivier e Bianca Byington. 

Excelente conjunto de atuações
A encenação dirigida por Byington e por Leonardo Netto, assistidos por Pedro Pedruzzi, tem o maior mérito de sugerir o quadro como um tabuleiro onde as peças vão se mexer. Não há trocas de cenário – um bar realista sem assinatura, mas provavelmente da dupla de diretores – e nem de figurinos. Ou seja, a entrada e a saída dos atores são o único recurso, além do texto e das interpretações, capaz de dar movimento à narrativa. Sem marcações muito complicadas, todo o jogo parece ficar ao cargo da interpretação, o que, sem dúvida, é um opção corajosa da direção em favor da viabilização de sua concepção estética. 

Silvia Buarque e Leandro Castilho
O excelente ritmo do espetáculo, além de se apoiar no ótimo texto, está pautado na alta qualidade dos trabalhos de interpretação. No elenco, todos – sem exceção – apresentam ótimos trabalhos em todos os aspectos: voz, corpo, pausas, expressões faciais, movimentação. Tudo é claro, cheio de inteligência, com segundos níveis passíveis de interpretações múltiplas. Há verdade, há graça, há carisma, há energia em todo o conjunto. 

“Um dia como os outros” também conta com a colaboração dos figurinos de Emília Duncan, do desenho de luz de Paulo César de Medeiros e com a trilha sonora de Leonardo Netto. Com destaque para os primeiros, todos esses elementos participam ativamente dos méritos do todo, concedendo ao quadro ótimos respiros onde pode o espectador se apoiar na hora solitária de fruir a profundidade dessa comédia inteligente. 

Eis mais um ótimo espetáculo que Maria Siman produziu e produz na programação cultural brasileira. 

*

Ficha Técnica:

Autores: Agnés Jaoui e Jean-Pierre Bacri.

Direção: Bianca Byington e Leonardo Netto.

Direção de Produção: Maria Siman.

Elenco: Analu Prestes, Bianca Byington, Flávio Pardal, Leandro Castilho, Marcio Vito/Alexandre Dantas e Silvia Buarque.

Tradução: Angela Leite Lopes, Barbara Duvivier e Bianca Byington.

Iluminação: Paulo Cesar Medeiros.

Figurino: Emília Duncan.

Trilha Sonora: Leonardo Netto.

Realização: Bianca Byington e Maria Siman

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