terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Rival Rebolado (RJ)

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Foto: Eduardo Moraes/ Maurício Code

Isabel Chavarri


Quando o Teatro de Revista não sai do armário

O “Rival Rebolado – 2a temporada” é um espetáculo que está acontecendo no Teatro Rival, na Cinelândia, desde 15 de novembro e vai até 20 de dezembro próximo, sempre às terças. Pra quem espera ver uma atualização do gênero Teatro de Revista e principalmente pra quem já assistiu, dos mesmos realizadores, ao “Cabaret On Ice” do Buraco da Lacraia, essa é uma grande decepção. Mas pode ser interessante ir lá para curtir os shows de drag queens, duelando entre si pelo troféu de a “Rainha da Cinelândia”, concurso esse que a produção promove com candidatas sempre diferentes. E, em especial, a performance de Isabel Chavarri como Delirious Fenix. A análise a seguir diz respeito à sessão de 29 de novembro, mas vale lembrar de que, a princípio, são roteiros parcialmente diferentes toda semana. O projeto foi idealizado por Alê Youssef, Leandra Leal e por Luis Lobianco. Chayenne Furtado, Eber Inácio, Fabiano de Freitas, Iara Niixe, Isabel Chavarri, Letícia Guimarães e Sidnei Oliveira, além de Leal e de Lobianco, estão no elenco. A direção é de Freitas e de Chavarri.

Com uma dramaturgia enrijecida, o Teatro de Revista não se aproxima
O espetáculo é dividido em dois blocos. Na primeira parte, há vários números da dramaturgia principal e, na segunda, as apresentações das drags queens concorrentes entretêm. 

A noite começou bem com uma dublagem, por Luis Lobianco, da canção “Vaca Profana” (de Caetano Veloso) a partir da gravação de Gal Costa. Em uma referência à Laura de Vison (1939-2007) em “O fantasma da Ópera”, o personagem come o cérebro de Sérgio Cabral ao longo da cena, estando vestido com uma roupa que remete à obra de Romero Britto. O refrão – “vacas de divinas tetas” – talvez sirva para brincar com o fato de terem sido encontrados quadros desse pintor na casa do ex-governador, esse preso na penitenciária de Bangu recentemente por, entre outras coisas, “mamar nas tetas do governo”. A letra da música, uma ode à Espanha, país por onde o compositor passou nos anos 80, não é aproveitada de qualquer outro modo, o que reduz em parte os méritos da proposta por desperdiçá-la. A cena termina com a apresentação dos atores que fazem parte do elenco através de uma narrativa (ficcional) engraçada de cada um.

“Rival Rebolado” avança para o quadro “O mundo do carão”. Trata-se de uma novela em que os personagens têm nomes de marcas de cosméticos mais populares como Christian Grey e Avon, por exemplo. Há uma enorme “forçação de barra” nesse momento, em uma tentativa desesperada de fazer graça, o que depõe contra o trabalho. Marcações fixas e dramaturgia complicada, com vários atores interpretando vários personagens, eliminam as chances de fluidez no pior número da noite. Aquilo que era pra ser vivo fica frio, pesado e morto apesar das colaborações de Éber Inácio e de Sidnei de Oliveira, que visivelmente se esforçam positivamente.

O quadro é interrompido por outro que faz referência a uma apresentação do Oscar por dois apresentadores falando portunhol (Leandro Leal e Fabiano de Freitas). É uma oportunidade bonita de homenagear Milton Cunha, personalidade do carnaval conhecida e respeitada no país. Em cada noite de “Rival Rebolado”, alguém recebe essa honra. Antes de Cunha, foram drag Suzi Brasil e o empresário Adão Arezo. Rogéria teve a sua vez na última semana. Segue um número de dança não muito valoroso e tampouco engraçado em mais uma gesto da dramaturgia de sair da própria proposta. A novela “O mundo do carão” termina com uma referência ao clipe de “Vogue”, de Madonna.

O melhor momento da noite é quando Isabel Chavarri surge dublando a canção “All about that bass” na voz de Meghan Trainor. Em uma estética burlesca, ela vem com a personagem Delirious Fenix, que faz um strip-tease lambendo uma lata de leite condensado. Éber Inácio entra dublando Tetê Espíndola na canção “Escrito nas estrelas”, com boa performance. E, assim, termina a primeira parte de “Rival Rebolado”.

A pequeníssima referência à política brasileira, um deboche da cultura pop até interessante e um ótimo número de burlesco são insuficientes para permitir uma leitura de Teatro de Revista à montagem, como sugere a divulgação. Falta muito mais ironia, muito mais crítica, muito mais leveza para dizer o mínimo. Com uma dramaturgia enrijecida, em que não há improvisações e sobram ratificações da quarta parede, a estética que marcou o teatro brasileiro o final do século XIX até a metade do XX não se aproxima. Carece-se uma leitura pontual das pesquisas de Neyde Veneziano e de Tânia Brandão sobre o tema.

O concurso de drag queens “A melhor de 4” domina a segunda parte de “Rival Rebolado”. O público presente é quem, a princípio, escolhe a vencedora entre quatro candidatas. No todo da temporada, elas vão ascendendo na disputa pelo troféu de “Rainha da Cinelândia”. Na noite do dia 29 de novembro, as candidatas foram: Sereia do Amazonas, que se apresentou com uma canção de Britney Spears; Xena Meneghel, com a canção “It`s raining man”, de The Weather Girls; Layla Riker com “I believe I can fly” na voz de Jennifer Holliday; e Babalu Vendraminy com “I`ll stand by you”. Leandra Leal, que apresentava o quadro, decidiu, em nome do público, premiar todas as quatro concorrentes de maneira que todo o grupo foi para a próxima etapa. A final do concurso acontecerá no dia 20 de dezembro. Destaca-se o figurino usado por todas as participantes e o modo especial com que cada uma delas, em especial as três últimas, cativou o público, usando bem vários referenciais da estética desse tipo de obra.

Direção mantém o Teatro de Revista dentro do armário
A direção de Fabiano de Freitas e de Isabel Chavarri deixa pouco espaço para brincadeira. O humor entra em “Rival Rebolado” de modo fixo, ensaiado e quase que inteiramente pautado nos figurinos e nos méritos das letras das canções. Assim, em alguns momentos, a peça é melhor lida como uma atualização do gênero besteirol, em outras da comédia burlesca e, na maior parte dela, como um show de drag queens. Mas, como já se disse, teatro de revista não serve como uma boa lente para o que se vê infelizmente. De posse do microfone, Leandra Leal conversa livremente com o público e com as candidatas participantes e esse é, em termos de interpretação, um dos momentos mais interessantes do espetáculo. Elogiam-se as Xena Meneghel, Layla Riker, Babalu Vendraminy, Éber Inácio, mas principalmente Isabel Chavarri pelo enorme carisma.

Quanto aos figurinos, as referências a Romero Britto, porque oferecem a peça a chance da crítica política, são ótimas, mas os pontos altos estão nos trajes usados por Leandra Leal, Isabel Chavarri e principalmente Layla Riker. Os vestidos de plástico bolha não colaboram em nada com a montagem.

“Rival Rebolado”, que parece viver uma crise de consciência estética, quer ser algo, mas não consegue se aproximar dele: o teatro de revista. Falta coragem talvez na hora de identificar a complexidade naquilo que aparentemente é superficial. Sucesso a todas as candidatas na disputa pelo troféu “Rainha da Cinelândia”. Vida longa ao seu trabalho.

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Ficha Técnica:
Idealização: Alê Youssef, Leandra Leal e Luis Lobianco
Criação e Performances: Chayenne Furtado, Eber Inácio, Fabiano de Freitas, Iara Niixe, Isabel Chavarri, Leandra Leal, Letícia Guimarães, Luis Lobianco, Sidnei Oliveira
Direção Artística: Fabiano de Freitas e Isabel Chavarri
Produção Executiva: Thamires Trianon
Assistente de Produção: Camila Santana
Fotos: Eduardo Moraes e Maurício Code (EM Fotos) e Francio de Holanda 

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