terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Nefelibato (RJ)

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Foto: Renata Maria


Luiz Machado

A poesia fica pobre quando precisa de justificativa

“Nefelibato” é o monólogo em que Luiz Machado celebra seus 20 anos de carreira como ator. A peça foi escrita por Regiana Antonini e dirigida por Fernando Philbert com supervisão de Amir Haddad. O ótimo trabalho de interpretação, a direção pontual e a visualidade interessante não são o suficiente para dar conta dos inúmeros problemas de dramaturgia infelizmente. A peça está em cartaz, na Sala Rogério Cardoso, na Casa de Cultura Laura Alvim, até o dia 18 de dezembro.

Inúmeros problemas nessa dramaturgia de Regiana Antonini
O texto tem uma contradição muito fácil de identificar e que lhe prejudica muito. Anderson é um morador de rua que se orgulha da vida que leva, porque nela está livre das muitas prisões do mundo do dinheiro. Ao começar a contar sua história, porém, vê-se o quanto ele está amargurado. Em 1990, ele era um homem bem estabelecido que herdou uma agência de turismo. O Plano Collor, lançado um dia após a posse do primeiro presidente eleito pelo voto direto no país depois de 29 anos, entre outras coisas, aprisionou o dinheiro da população nos bancos. O fato levou o país ao caos, multiplicando o sentimento de instabilidade para níveis inimagináveis. Na peça de Antonini, Anderson foi uma das vítimas desse acontecimento que o levou à bancarrota (como, na vida real, a muitas pessoas). 

A tragédia de Anderson é contada por ele com muita dor. Por causa disso, no espectador, ficam perguntas como: se ele está feliz vivendo na rua, qual o problema de ter perdido todo o seu dinheiro? Collor é o algoz ou o salvador de sua alma? Afinal de contas, sua falência lhe fez bem ou mal? E, por fim, se tudo está bem com Anderson, o que move a história? Apenas uma descrição do estado de sua alma?

Sem resolver os problemas que a própria dramaturgia apresenta para si e sem oferecer qualquer chance de curva dramática ao personagem que seja capaz de fazer a história atravessar o tempo da narrativa, o texto falece raquítico. Sobram frases belas, mas sem contexto, reflexões desamparadas de movimentos e lamentações sem fim que acabam por interpor inúmeros desafios à encenação.

Fernando Philbert e Luiz Machado de mãos atadas
A direção de Fernando Philbert não consegue vencer os desafios da dramaturgia. Preso em um mar de lixo e sucata, o contexto da encenação pode fazer referência a “Grey Gardens”, mas ela para no visual dessa e não avança para sua poética infelizmente. Um pensamento lúcido invade as falas mais emotivas de maneira que a peça não vai nem lá, nem fica bem cá, pesando o ritmo. Comportado ao texto, Philbert está de mãos amarradas e Luiz Machado patina no pântano onde ele se jogou para comemorar o aniversário de sua carreira.

Luiz Machado exibe ótimo repertório de expressões, mas não há uma concepção que bem amarre o conjunto de seu trabalho em um todo coerente em termos de sentido. O personagem não faz das contradições uma marca de complexidade de sua alma, o que seria interessante. Ao contrário, a lógica invade a loucura para dar-lhe razão, tornando-a um defeito e não uma beleza. Por causa disso, o trabalho do ator pode ser bem avaliado como elemento em separado, mas não traz efeito significativo à abordagem na plenitude da obra.

O cenário e o figurino de Teca Fichinski apenas oferecem lugar para a narrativa surgir, perdidos pela falta de direcionamento do projeto estético. A iluminação de Vilmor Olos meramente dá a ver o contexto provavelmente pelos mesmos motivos.

Feliz aniversário!
“Nefelibato”, cujo título remete à “pessoa que anda nas nuvens”, se perde nas justificativas. A poesia fica muito pobre quando precisa de motivo para acontecer. Que a carreira de Luiz Machado tenha vida longa e que muitos novos aniversários aconteçam!

*

Ficha técnica:

Texto: Regiana Antonini

Interpretação: Luiz Machado

Supervisão artística: Amir Haddad

Direção: Fernando Philbert

Cenografia e figurino: Teca Fichinski

Iluminação: Vilmar Olos

Direção de movimento: Marina Salomon

Preparação vocal: Edi Montechi

Assistência de direção: Alexandre David

Assessoria de imprensa: Christovam de Chevalier

Design gráfico: Claudio Sales

Direção de produção: Joaquim Vidal



Realização: LM Produções Artísticas e Melhor a Doi2

Um comentário:

  1. Estranhei o título, pois a palavra nefelibata não flexiona...é comum de dois gêneros. Mas se o texto justifica a escolha, justamente para estranhar, menos mal.

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