sábado, 20 de agosto de 2016

Vaga carne (RJ)

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Foto: divulgação

Grace Passô

Grace Passô em excelente monólogo

O excelente “Vaga carne” é mais um vigoroso trabalho de Grace Passô em cartaz no Rio de Janeiro. O monólogo, de um modo lindo e forte, ataca o tema da impalpabilidade, daquilo que não se pode tocar, do que é devir, do que não se atualiza sempre, mas que, quando ganha feições humanas, pode correr o risco de se afeiçoar à vida. Com uma dramaturgia exultante e não menos ótimos trabalhos de direção e de interpretação, o espetáculo fica em cartaz na Sala Multiuso do Espaço SESC Copacabana até o dia 28 de agosto.

Belíssima dramartugia
A peça começa com uma voz audível e compreensível aos ouvidos humanos da plateia e que se apresenta como tal embora pontue sua capacidade de ser muito além disso. Ela, a voz, vem de algo (ou o é) que pode penetrar seres vivos e inanimados, corpos materiais ou abstratos, desse e de outros lugares, nesse tempo bem como em domínios atemporais. Nesse contexto, a dramaturgia ganha o espectador que sai, logo de início, em busca desse personagem, tentando identificá-lo enquanto se percebe sedento. O contorno da intérprete Grace Passô surge em um contraluz, oferecendo à audiência a chance de perceber a personagem de modo mais acessível, mais humano. E, nessa aventura dela através de uma mulher, o espectador, acompanhando a narrativa, ganha a chance de se sentir homem sob outro ponto de vista.

Ao longo de “Vaga carne”, um dos aspectos mais caros à humanidade nessa visão estrangeira da personagem-narradora é a palavra. As qualidades dos sons, os meios de sua expressão, o poder que elas têm, suas funções e habilidades são pesquisadas, saboreadas, percebidas e criticadas. Se o espírito se faz carne, talvez o homem se faça vivo por meio da linguagem (essa é uma referência a Aristóteles), o que faz do silêncio um jeito diferente de estar morto. Jogando, de modo poético e não menos racional com essas ideias de presença e de comunicação, a dramaturgia trilha as sensibilidades do homem, unindo o público em torno do que lhe é comum: a vida.

Ao longo da encenação, a personagem ganha acesso ao perigo de se apaixonar pela vida. As noções de passagem de tempo e as limitações da presença física trazem questões sobre nascimento e morte, prazer e dor, juventude e envelhecimento. A dramaturgia percorre lugares difíceis a partir de significações complexas, carismáticas e potentes que se apresentam de modo muito belo. Excelente texto!

Projeto Grãos de Imagem
Grace Passô, como sempre, faz da voz um excelente instrumento cênico capaz de oferecer ao texto enormes possibilidades no espetáculo. Os silêncios, como lugares em que o som ganha força, participam desse contexto aqui envoltos a sua figura forte, marcante e definitiva no quadro estético. A atuação de Passô, em panorama criativo assinado por ela e por Kenia Dias, Nadja Naira e por Ricardo Alves Jr., apresenta imagens belas, bem articuladas e dispostas, em um todo cheio de fluidez e profundidade, a dar conta do tema difícil e nobre a que “Vaga carne” parece ter se proposto.

A luz de Nadja Naira e a trilha sonora de Ricardo Garcia se envolvem com estruturação da dramaturgia cênica de modo coeso de maneira que parece difícil separá-los mesmo que esse gesto seja simplesmente para a análise. Tudo está abrigado por uma ideia de essencialidade em que nada sobra. Excelente!

O espetáculo inaugura e integra o Projeto Grãos da Imagem, que reúne peças em torno de temas identitários. Estreou no Festival de Curitiba de 2016 e integrou também a programação do Festival TREMA! de Recife antes de vir ao Rio de Janeiro. Imperdível!

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FICHA TÉCNICA:
Concepção, atuação e dramaturgia: Grace Passô
Equipe de criação: Kenia Dias, Nadja Naira e Ricardo Alves Jr.
Luz: Nadja Naira
Técnico e operador de luz: Edimar Pinto e Lara Cunha
Trilha sonora: Ricardo Garcia
Músico e operador de som: Maurício Chiari
Figurino: Virgílio Andrade
Fotografia: Lucas Ávila
Assessoria de Imprensa: Sandra Nascimento e Duda Las Casas
Pesquisa e produção: Nina Bittencourt

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