segunda-feira, 18 de julho de 2016

O figurante (RJ)

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Foto: divulgação

Pedro Henrique Müller

Na paixão pela forma, bom espetáculo perde oportunidades

“O figurante” é o quinto espetáculo da companhia carioca Teatro Voador Não Identificado, vindo depois de “Ponto Fraco” (2011), “Shuffle” (2012), “Tempo real” (2013) e de “O Processo” (2014). Como nos anteriores, há uma paixão de seus realizadores pela investigação através da cena de reflexões sobre o agora. Diferente dos demais, nesse espetáculo, a proposta de jogo que se realiza (e se define) no ato da encenação quase inteiramente cede lugar para um roteiro de texto e de ações ensaiadas previamente e que, como no teatro tradicional, se apresenta para o público. A narrativa gira em torno do universo dos figurantes: o tipo de participação cênica menos privilegiada na hierarquia da função nas produções que envolvem atores. O monólogo, com texto de Luiz Antonio Ribeiro e direção de Leandro Romano, foi defendido, em belo trabalho, por Pedro Henrique Müller. A temporada na Sala Multiuso do Espaço SESC Copacabana encerrou ontem, dia 17 de julho.

A valorosa intenção de humanizar a função de Figurante
A função de Figurante é uma marca de realidade. Ao invés de usar imagens paradas, as produções usam seres humanos para compor o fundo do quadro em cujo primeiro plano a ação principal acontece. Elas fazem isso quando querem oferecer à fruição um argumento em favor da “verdade” da narrativa como se dissesse: “Isto é algo que realmente acontece!” Em outras palavras, os Figurantes servem para aproximar o contexto narrativo do universo de quem lhe assiste, podendo o primeiro ser desde um passado documental até uma história de ficção científica, passando por algo contemporâneo. Por sua função figurativa – daí o nome “Figurante” –, seu envolvimento com a encenação é quase como o do cenário ou o do figurino: compor.

O mérito de “O figurante” é justamente humanizar essa função, ou melhor, lembrar de que, embora sua função seja ilustrativa, quem a desempenha é um ser humano. E é preciso sempre valorizar a vida humana. No texto escrito por Luiz Antonio Ribeiro, um ator é chamado para participar de um teste de vídeo para um comercial, mas sua participação nele acaba sendo como figurante. Em jogo, estão as expectativas dele e o modo como elas podem ser usadas sordidamente pelo mercado. Ou seja, de início, são exatamente as mesmas intenções do célebre musical “A chorus line”, um dos maiores sucessos da história da Broadway, mas sem seu brilho, nem força.

O problema é que, lá pelas tantas, o monólogo abandona suas melhores intenções por outras mais autorreferentes e interessantes por outros motivos que não os inicialmente anunciados. O personagem, recebe um convite para participar de um espetáculo teatral sobre a função de figurante. Essa peça dentro da peça e a peça a que se assiste se confundem e a dramaturgia se perde apaixonada pelos efeitos estéticos dessa confusão. O Figurante que dá nome à obra perde espaço para o desejo dela de se vincular com o agora da encenação em um intenso jogo de palavras que nem sempre tem articulação plenamente clara. De um modo estranho, o Figurante passa a ser secundário em um monólogo que parecia ter quisto valorizá-lo.

O 5º espetáculo da Teatro Voador Não Identificado
É interessante o modo como a ideia de tratar da invisibilidade do Figurante sobrevive pelos esforços da direção de Leandro Romano. Com a ajuda de posters que reproduzem, de forma parada, imagens do ator Pedro Henrique Müller, o quadro resiste ao hermetismo da dramaturgia. Por sua vez, Müller é carismático e faz de sua interpretação um meio envolvente pelo qual o público pode se manter interessado no espetáculo para além da riqueza original de seu personagem. A veia cômica do intérprete, bem desenvolvida e com ótimas oportunidades aqui, garante o sucesso e pode explicar a continuidade dos méritos ao longo da transformação do contexto inicial da narrativa.

O cenário de Elsa Romero e de Ianara Elisa, como já foi dito, colabora bastante bem com a manutenção dos méritos da produção por fornecer a ela reflexões pertinentes. A luz de Lara Cunha, o figurino de Marina Dalgalarrondo e principalmente a trilha sonora de Felipe Ventura e de Gabriel Vaz, pela pontualidade de sua operação principalmente, garantem o bom ritmo que é outro dos valores do espetáculo.

Em “O Figurante”, a estrutura da encenação é menos pautada no jogo e corre, diferente do que se deu nos outros espetáculos da Teatro Voador Não Identificado, menos riscos. Ainda que perca oportunidades de oferecer olhar mais delicado a quem desempenha essa função-título tão desvalorizada, a peça merece aplausos por seu impulso inicial em fazê-lo. Parabéns.

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FICHA TÉCNICA
Direção: Leandro Romano
Dramaturgia: Luiz Antonio Ribeiro
Elenco: Pedro Henrique Müller
Concepção: Leandro Romano, Luiz Antonio Ribeiro e Pedro Henrique Müller
Cenografia: Elsa Romero e Ianara Elisa
Iluminação: Lara Cunha
Figurino: Marina Dalgalarrondo
Trilha sonora original: Felipe Ventura e Gabriel Vaz
Dramaturgia da cena 14: Daniele Avila Small
Criação da cena 20: Pedro Henrique Müller e Teatro Inominável (Andrêas Gatto, Diogo Liberano, Márcio Machado e Thaís Barros)
Edição de som: LC Varella
Vozes em off: José Mayer e Pedro Henrique Müller
Assistência de direção: Luiz Antonio Ribeiro
Design gráfico: Marcello Talone
Fotografia e edição de imagem: Nan Giard
Filmagem: Clarissa Appelt e Zhai Sichen
Cenotécnica: Fátima de Souza
Costura: Nice Tramontin e Selma Maria da Silva
Direção de produção: Leandro Romano
Produção executiva: Renata Magalhães
Realização: Sesc e Teatro Voador Não Identificado

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