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Marcos França |
Monólogo machista sobrevive graças à intepretação de Marcos França
"Chabadabadá – manual prático do macho-jurubeba" é o monólogo musical interpretado por Marcos França com músicas do Wando (1945-2012). Dirigido por Thelmo Fernandes, o texto é uma adaptação de três obras de Xico Sá: “Modos de machos e modinhas de fêmeas” (2003), “Chabadabadá” (2010) e “Os machos dançaram” (2015). Depois de temporada no Teatro II do Sesc Tijuca, o espetáculo cumpriu temporada no Teatro Ipanema no fim do último verão. Bastante desconectado de um ideal de sociedade livremente defensável no mundo contemporâneo, o espetáculo começa muito mal. Se atinge lugar melhor ao longo da encenação, é pelo enorme mérito do intérprete, da direção e da música que o circundam nesse trabalho. Pode passar batido.
Dramaturgia machista
A narrativa se passa no estúdio de uma rádio AM durante uma madrugada. Em seu programa, o radialista Francisco Reginaldo (Marcos França) conversa com os ouvintes que telefonam, dando conselhos sobre comportamento. Consideradas machistas (ou, citando Marília Moschkovich, machistas filóginos) as teses dos livros são retrógradas mesmo que, com boa vontade, fofas. Tivesse sotaque carioca e contemplasse uma defesa da Ditadura Militar, caberiam perfeitamente na boca de Jair Bolsonaro. Deus nos livre!
Na visão de mundo que a dramaturgia revela, a humanidade se divide em machos e fêmeas de um lado e os errados, aqueles causadores do males da contemporaneidade, de outro. Se essa dicotomia fez sucesso nas comédias da Idade Moderna e alguns dos seus temas facilitaram o sucesso das rádio e telenovelas latinas, hoje em dia, são difíceis de engolir. Machos podem ser fêmeas continuando como machos e o contrário: sobra a arte que abdica do seu poder na luta por um mundo mais humano (e, por isso, complexo). Se “Chabadadá” almeja representar o pensamento de alguma localidade do interior do Brasil, falta oferecer a crítica, o contraponto, expurgando o saudosismo e cumprimentando valores mais condizentes com um novo tempo que seja livre da violência.
O “macho jurubeba”, uma versão sertaneja dos cavalheiros a la Don Juan, finge que não representa um pensamento condenável: o homem não pode ser traído, não pode investir na sua aparência, é quem toma as iniciativas e domina a situação. Submissa, a fêmea precisa ser delicada, cuidar dos afazeres domésticos e manter-se bonita. Os benefícios desses comportamentos, no entanto, na história da cultura, carregam infelizmente a violência doméstica, a homofobia, a sociedade patriarcal entre outras mazelas. Por isso, celebrá-los só merece ser aplaudido se vierem acompanhados do convite à reflexão. “Chabadadá” não faz isso.
Lá pelas tantas, o comportamento de Francisco Reginaldo se contradiz. Da metade para o fim da peça, ele se apresenta mais sensível, valorizando o amor, creditando ao homem a possibilidade de chorar sem parecer efeminado, ou ser efeminado sem que isso pareça uma redução negativa de sua imagem. Desse momento em diante, o espetáculo parece se comunicar melhor com o público e assisti-lo menos agressivo. É quando os méritos se apresentam enfim.
O ótimo trabalho de Marcos França
Marcos França (Francisco Reginaldo) tem uma figura carismática e seus méritos parecem ainda maiores dada a crueza do desafio imposto pela dramaturgia. Como intérprete, nesse trabalho, sua voz surge com clareza, movimento, profundidade e indefectível afinação, todas essas características fundamentais na viabilização do personagem radialista. Suas intenções bem postas garantem a evolução da narrativa e o interesse do público nobremente.
A direção de Thelmo Fernandes propicia bom jogo entre França e André Siqueira, que está em cena, acompanhando ao vivo o protagonista com instrumentos musicais. Discretas, mas pontuais participações do cenário de Natália Lana e do desenho de luz de Aurélio de Simoni permitem que o espetáculo se mantenha equilibrado ao lado do figurino de Lana e do texto de Sá.
Em “Chabadadá”, os problemas do livro que inspirou a peça quase afogam a encenação. Tenso!
Ficha Técnica
Texto: Xico Sá
Direção: Thelmo Fernandes
Elenco: Marcos França
Direção Musical: André Siqueira
Cenário e Figurino: Natália Lana
Iluminação: Aurélio de Simoni
Programação Visual: Guilherme Fernandes
Direção de Produção: Ana Paula Abreu e Renata Blasi
Produção: Diálogo da Arte produções Culturais