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Cia. Cortejo |
Com ótimas interpretações, espetáculo apresenta visão pessimista do luto
Terceiro espetáculo da Cia Cortejo, “Alice mandou um beijo” apresenta personagens interessantes e belas imagens, mas um enredo tão exaustivo que acaba por esvaziar as boas propostas. Ao longo de oitenta minutos, a história se apresenta em episódios, mas todos eles ganham tamanha importância que não se conseguem revelar qual é o eixo principal da narrativa. No todo, a peça é um comentário sobre a ausência com belas imagens sensoriais, mas que perde oportunidades de se comunicar com mais efetividade. Bruna Portella, José Eduardo Arcuri, Luan Vieira, Tairone Vale e Vivian Sobrino têm ótimas atuações dirigidas por Rodrigo Portella que também assina o texto. A produção está em cartaz na Sala Mezanino do Espaço SESC Copacabana até 13 de março.
O aspecto pessimista da dramaturgia
Poucos dias antes do Ano Novo, Alice, a filha mais nova do Sr. Araújo (Jose Eduardo Arcuri), faleceu depois de meses doente. Além do pai, sobraram, na velha casa da família, seu marido Osvaldo (Tairone Vale), sua irmã mais velha Oneide (Vivian Sobrino), a mais nova Jandira (Bruna Portella), e Robério (Luan Vieira), o filho dessa última. A partir desse fato, “Alice mandou um beijo” pode ser vista a partir de seis episódios cujos títulos bem poderiam ser: “Limpar o guarda-roupa”, “A mala”, “Osvaldo”, “À venda?”, “O aniversário” e “O Ano Novo”. Eles compreendem um ano de luto da família pela ausência (talvez) de sua membro mais nobre.
De modo muito positivo, o texto de Rodrigo Portella deixa ver um comentário sobre o vazio deixado por Alice. Em todos os episódios, um determinado fato surge capaz de reorientar em alguma medida a vida dos personagens, mas esse vai à falência antes que termine e outro tome o seu lugar na narrativa. O ritmo se perde nesse excesso de constância, tornando o espetáculo menos interessante a cada novo momento apesar dos esforços da encenação. De modo similar, desde a dramaturgia, quatro dos cinco personagens querem manter a situação na qual sempre viveram embora essa esteja em aparente derrocada. Jandira quer manter-se no cuidado do pai doente e do filho autista. Osvaldo quer continuar morando na casa da família de sua esposa falecida. Inacessíveis, Araújo e Robério não vislumbram formas de sair de seus mundos particulares. A única exceção é Oneide.
Apesar da dramaturgia, principalmente a cênica, dar protagonismo para Jandira, é Oneide a única personagem que olha para fora. Ela é a menos tocada pela ausência da irmã falecida, a mais disposta a encontrar um meio de ressignificar a existência e a mais capaz de resolver os próprios problemas. A força de Portella sobre Jandira define a posição pessimista de “Alice mandou um beijo” na qual não há salvação para os personagens embora o tempo ofereça a eles algum alívio.
O tempo é o elemento mais importante da narrativa de Portella, outro sinal que marca a visão do espetáculo sobre o tema tratado. As cenas estão unidas umas às outras em articulação invisível, deixando para leves sinais nos diálogos a responsabilidade de expressar que um ano está passando. Chronos atravessa os acontecimentos, imperioso sobre as individualidades, devorando seus filhos, aqui completamente subservientes (com exceção de Oneide). É ele quem une e desune os personagens sem conferir-lhes mérito por isso. Eis o posicionamento da peça: só o tempo cura as feridas, pois os feridos não têm essa chance.
Espetáculo explora experiências sensoriais
Na direção de Rodrigo Portella, o maior mérito é a qualidade das interpretações de todo o elenco. Bruna Portella, Jose Eduardo Arcuri, Luan Vieira, Tairone Vale e Vivian Sobrino apresentam ótimos trabalhos, oferecendo segundos e terceiros níveis para os mais óbvios. A movimentação, no cenário que não tem paredes nem outras divisões, é equilibrada, comedida, conferindo à encenação o que o texto não faz: hierarquia. Em outras palavras, o público sabe o que ver, onde olhar, em qual ponto a peça quer ser assistida em primeiro plano. Sem exceção, todos os intérpretes fazem potente uso das oportunidades, marcando suas presenças no conjunto de maneira excelente.
Portella oferece ainda imagens sensorialmente potentes: a audição, através da trilha sonora do codiretor Leo Marvet; a visão, da cena em que balões invadem o palco; e o tato, dos banhos de água fria. São boas tentativas da peça de alcançar o público, valorosas principalmente depois da falência do insólito apego à metáfora da zebra. “Alice mandou um beijo” oferece boas colaborações do desenho de luz de Renato Machado, do cenário de Raymundo Pesine e do figurino de Danielle Geammal, mas sem grandes destaques.
Como bem apontou o crítico Renato Mello, do site Botequim Cultural, “Alice mandou um beijo” conversa com dois espetáculos interessantes de 2015: “Inútil a chuva”, da Armazém Companhia de Teatro; e “Consertam-se imóveis”, de Cynthia Reis. Há também “Nômades”, de Márcio Abreu e de Patrick Pessoa, de 2014. O tema da ausência merece mesmo boas reflexões como essa.
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Ficha técnica
Autor e diretor: Rodrigo Portella
Codireção e Trilha Sonora: Leo Marvet
Elenco: Cia Cortejo / Bruna Portella, Jose Eduardo Arcuri, Luan Vieira, Tairone
Vale e Vivian Sobrino
Iluminação: Renato Machado
Figurinos: Daniele Geammal
Cenografia: Raymundo Pesine
Projeto Gráfico: Raul Taborda
Fotos de Divulgação: Renato Mangolin
Assessoria de Imprensa: Ney Motta
Produção: Cia Cortejo
Realização: Sesc Rio