sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

A última festa antes do fim do mundo (RJ)

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Foto: Eliane Freitas


Elenco em cena

Temas mofados nessa dramaturgia de Daniel Nolasco


“A última festa antes do fim do mundo” apresenta uma visão tardia dos relacionamentos contemporâneos. Dirigido por Sérgio Menezes, o espetáculo não resolve as opções pouco interessantes da dramaturgia de Daniel Nolasco à contemporaneidade. Na história, Alberto e Mário vão se casar e, sob pretexto de uma despedida de solteiro para ambos, o amargurado Kadu convida alguns amigos para uma festa privada em seu apartamento. Comparecem seu ex-namorado Cézar; Margot, a ex-esposa de Mário; e Suzana, uma transexual; além do casal e de um stripper contratado. Do início ao fim, intermináveis discussões de relacionamento revelam personagens do século XXI tentando fracassadamente reproduzir modelos de relações ultrapassadas. Apesar do bom trabalho de Amaury Lorenzo e de esforços visíveis dos demais atores em dar conta das situações propostas, o resultado geral é desanimador. A peça está em cartaz no Teatro Cândido Mendes, até 2 de fevereiro, sempre às terças.

Uma infindável discussão de relacionamento
A questão da honra se popularizou no teatro nas comédias espanholas do século XVII. Entre seus personagens, esposas fieis padeciam sob o medo de parecerem adúlteras, maridos se corrompiam de desconfiança, homens se duelavam entre si para não carregarem a mancha do orgulho ferido. Durante séculos, a Espanha se saía geralmente vitoriosa de vários embates internacionais e o império de Felipe II dominava metade da Europa, toda a costa africana, parte considerável da América, além de territórios na Ásia e na Oceania. Era bom ser espanhol naqueles tempos e o teatro se esforçava em elogiar seu povo sobre isso. Desde então, o tema atravessou o melodrama burguês, chegou às radionovelas e ao início da teledramaturgia, perdendo muito sua capacidade de responder às questões das épocas que se sucederam.

No texto original de Daniel Nolasco, o personagem Alberto (Nuno Souza Gouvêa) descobre, nas vésperas de seu casamento com Mário (Amaury Lorenzo), que está sendo traído. Incognitamente, ele conversa com seu futuro marido através de um aplicativo de relacionamentos (o Scruff) por meio do qual homens gays marcam encontros sexuais com desconhecidos. A revelação bombástica se dá no início de uma festa na casa de Kadu (Leandro Terra), que tinha outras intenções para a noite que não apenas celebrar a despedida de solteiro dos amigos. Contratado pelo anfitrião, um Stripper (Igor Cosso) interrompe seu show quando Cézar (Bruno Fagotti) o reconhece. Os dois estão “ficando” há uns meses e o segundo desconhecia a atividade profissional do primeiro. Kadu, que foi abandonado por Cézar depois de dez anos de relação, quer se vingar do ex, ferindo-o com a divulgação da vida secreta daquele que o substituiu.

Há ainda a transexual Suzana (Gustavo Rizzotti), que pretende largar tudo e ir para Brasília, onde mora um homem por cuja voz se apaixonou apesar de nunca tê-lo visto. E Margot (Helena Lourencette), ex-esposa de Mário, que bêbada joga contra ele e seu futuro marido toda a sua mágoa. Assim, “A última festa antes do fim do mundo” se resume em uma infindável discussão de relacionamento. No texto, questões como fidelidade e monogamia, tratadas superficialmente, dão lugar para uma visão de sociedade em que se ratifica uma imagem dos homossexuais como promíscuos, dos transexuais como iludidos e das mulheres como incapazes de prosseguir.

Amaury Lorenzo em destaque positivo
A direção de Sérgio Menezes, cuja única talvez alternativa seria ter levado todo o drama de Nolasco para a comédia de exageros, não resolve o mofo do texto. A semi-arena do Teatro Cândido Mendes é usada como se fosse palco à italiana em desprivilégio ao público que não está sentado à frente. No fundo do palco, há um espelho que reflete inconveniente a luz de um refletor, perturbando a visão. A direção de arte não se decide no quando a história acontece, se referindo à distante entrada do ano 2000, mas com figurinos, fatos e trilha sonora de outras épocas.

Todos os atores se empenham em construções realistas, driblando problemas na evolução dos diálogos e nas marcações em vários momentos com sucesso. Helena Lourencette (Margot) se serve dos poucos desafios de uma personagem bêbada, Gustavo Rizzotti permanece protegido pelo brilho visual de sua Suzana e Igor Cosso (Stripper), em rápida aparição, tira algum mérito de sua oportunidade mais dramática. Nuno Souza Gouvêa (Alberto) e Leandro Terra (Kadu) sofrem a falta de quebras na evolução de seus personagens, permanecendo lineares na defesa de suas figuras vitimizadas e raivosas. Bruno Fagotti (Cézar), mas principalmente Amaury Lorenzo, carismáticos e aproveitando bastante bem os tempos, se destacam positivamente nas figuras que também são as que melhor foram escritas por Nolasco.

O mundo não acabou
Alberto quer provar que não aceita ser traído, Kadu e Margot que não perdoaram o abandono e Suzana que é capaz de ser feliz no amor. Eles se utilizam de uma situação social para limparem sua imagem frente aos outros. Com questões muito mais complexas a serem refletidas acerca dos relacionamentos contemporâneos, a defesa da honra faz “A última festa antes do fim do mundo” um espetáculo que sobra na programação teatral desse novo milênio. Uma pena!

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Ficha técnica:
Texto: Daniel Nolasco
Direção: Sérgio Menezes
Supervisão: Brigitte Bentolila
Direção de arte: Elliane Freitas
Figurino: Erika Facuri
Luz e Trilha Sonora: Sérgio Menezes
Assistente de Produção: Bruno Fagotti & Michele Ferrucio
Assistente de Direção: Michele Ferrucio
Assessoria de Imprensa: Ribamar Filho
Produção Executiva: Teca Viegas
Direção de Produção: Leandro Crespo
Colaboração Cênica: Victor Maia
Design Gráfico: Alexsandro Palermo

Elenco:
Kadu – Leandro Terra
Cézar – Bruno Fagotti
Mário – Amaury Lorenzo
Alberto – Nuno Souza Gouvêa
Margot – Helena Lourencette
Suzana – Gustavo Rizotti
Stripper – Igor Cosso