sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Herculano é o assassino (RJ)

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Foto: divulgação


Carmen Frenzel e Alexandre Barros

Problemas não resolvidos

“Herculano é o assassino” é a mais nova peça de Cynthia Reis, que dirigiu “Consertam-se imóveis” no ano passado. Escrita por Lucília de Assis, a comédia atual tem, no elenco, Alexandre Barros e Carmen Frenzel, ela com melhores oportunidades que ele no que diz respeito à dramaturgia. O texto é difícil e impõe muitos desafios à encenação como um todo. Alguns deles são vencidos, a maioria não infelizmente. A temporada do espetáculo, que está em cartaz no porão do Teatro Ipanema, na zona sul do Rio de Janeiro, vai até o dia 15 de novembro.

Mais problemas do que méritos na dramaturgia
A dramaturgia de “Herculano é o assassino” traz dois problemas grandes à montagem. O primeiro deles diz respeito aos aspectos externos ao texto, isto é, aquilo que contextualiza a obra. O segundo tem a ver com o que ela espera da assistência. Nessas duas dimensões, os desafios impostos à encenação são altos demais.

A peça começa pelo fim. Quando o público entra, sabe-se que os personagens estão mortos. Nos primeiros segundos, os intérpretes (esses também interpretando intérpretes) põem-se de pé e agradecem o público, dizendo aqueles velhos jargões do teatro: “Se gostaram, indiquem aos amigos. Se não gostaram, aos inimigos” – ou algo assim. Então, eles voltam para a situação inicial, que é a final da narrativa, e começam a história que irá contextualizar esse quadro de abertura. Com isso, a dramaturgia cria um problema sobre quem narra além da narrativa propriamente dita. Ou seja, além da piada, faz a piada sobre a piada em um processo de metalinguagem, que, mesmo que esforçada em se espalhar por outros elementos, não encontra justificativas claras nem tampouco coerência.

O segundo problema diz respeito ao que a narrativa espera do espectador. Nos sessenta minutos da peça, só tem uma única informação que o público descobre ao mesmo tempo que os personagens. Essa, que surge um pouco antes da peça terminar, redefine os momentos finais da história, mas todo o resto é uma novidade apenas para quem assiste. Lá pelas tantas, o jogo de “esconde-esconde” – que não se inverte e nem, ao menos, se equilibra – cansa.

Herculano (Alexandre Barros) e Hermínia (Carmen Frenzel) são dois irmãos gêmeos que, cansados das dificuldades da vida como professores, decidem sequestrar alguém e, com o dinheiro, ganhar sua independência. Ao longo da peça, se descobre que o parentesco entre eles, as semelhanças e diferenças, onde estão, o que fazem e quais suas motivações. Também descobrimos sobre o sequestrado e as pessoas envolvidas. Enquanto isso, dezenas de frases de efeito preenchem os diálogos, querendo ser instrumento cômico, mas prejudicando o ritmo.

Desse modo, e por tudo isso, “Herculano é o assassino” funciona bem como exercício, mas chega à forma final com mais problemas do que méritos na dramaturgia.

O esforço da direção de Cynthia Reis
A direção de Cynthia Reis, com direção de movimento de Rodrigo Condim deixa visível enorme esforço da encenação em encontrar (e possibilitar) situações de comédia para o texto de Lucília de Assis. As interpretações investem em construções melodramáticas, figurino e cenário fazem a sua parte na criação de um lugar lúdico. Essas são boas propostas, mas, no conjunto, elas expõem a pouca certeza da concepção. Em termos estéticos, enquanto alguns aspectos pautam o espetáculo “Herculano é o assassino” em um lugar realista, outros vão para o absurdo. Embora a realidade seja um elemento que participe desses dois gêneros, eles são distintos, propondo relações diversas entre o público e a obra.

A falta de articulação entre tudo o que dá a ver a peça prejudica o ritmo dela. Sem entrar “de cabeça” na proposta, em tampouco entendê-la bem, fica-se verdadeiramente nem lá e nem cá. Sessenta minutos é um limite conveniente capaz de argumentar aos valores da montagem. Eles existem!

Alexandre Barros (Herculano) e Carmen Frenzel (Hermínia) dispõem bem de diversos recursos expressivos, favorecendo-lhes as melhores oportunidades. Frenzel tem mais sucesso que Barros porque o personagem dela acaba por se mostrar com mais quebras: Hermínia começa tão algoz quanto seu irmão, mas vai se distanciando dele, evidenciando mais curvas. Já Herculano se mantém o mesmo durante toda a narrativa. Ambos intérpretes estabelecem e mantêm ótima relação com a plateia, essa sentada em três dos quatro lados do espaço cênicos e bem próxima da cena.

O cenário e o figurino de Nívea Faso para “Herculano é o assassino” apresenta os personagens com fortes sugestões do universo clown. Linhas horizontais coloridas (a la Mondrian, mas sem preenchimento) em papelão claro e com muitas caixas do mesmo material constroem lugar mais alternativo para a história. Ela se passa na residência de uma senhora idosa e rica, mas, como as outras informações da peça, essa é algo que o público vai ter que descobrir. Como já dito, a proteção de algumas informações faz parte do argumento da montagem. Por essa abordagem, o resultado é positivo. Não há destaques na iluminação de Tadeu Freire e nem na paisagem sonora de Alexandre Dacosta.

Lugar histórico
O porão do Teatro Ipanema é um lugar especial para a história do Teatro Ipanema. Foi lá que, há trinta anos, Rubens Corrêa interpretou Antonin Artaud em célebre monólogo dirigido por Ivan Albuquerque. Antes de qualquer outra coisa, “Herculano é o assassino” vale a visita a esse local.

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FICHA TÉCNICA

TEXTO – Lucília de Assis

DIREÇÃO – Cynthia Reis

ELENCO – Alexandre Barros & Carmen Frenzel

DIREÇÃO DE ARTE – Nívea Faso

ILUMINAÇÃO – Tadeu Freire

TRILHA SONORA – Alexandre Dacosta

IDEALIZAÇÃO – Alexandre Barros, Carmen Frenzel e Lucília de Assis

PRODUÇÃO – Diálogo da Arte Produções Culturais

REALIZAÇÃO: Dupla Companhia, Falantes e A Palavra Forte Produções Artísticas

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