quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Alguém acaba de morrer de lá fora (RJ)

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Foto: divulgação

Ágatha Castanheda, Tamires Rodrigues, Hugo Moura, Gabriela Chalub e Marcos Bruno Cunha

Formal demais, montagem faz comédia de Jô Bilac falecer


A comédia "Alguém acaba de morrer de lá fora", escrita por Jô Bilac em 2006, marca a estreia de Paulo Verlings como diretor. A narrativa parte do encontro de quatro personagens em um café: um garçom e três clientes. A morte de alguém do lado de fora do estabelecimento estrutura o que acontece dentro dele. Em momentos distintos, o espectador se vê diante de uma história mais ou menos diferente a partir de uma possível identidade de quem morreu. O jogo é muito interessante, deixando ver uma reflexão sobre o valor da vida humana. Formal demais e com uma encenação ainda mais enrijecida, no entanto, ele aparece em montagem difícil. O texto, que já recebeu duas produções anteriores por aqui, vem dessa vez interpretada por Ágata Castanheda, Gabriela Chalub, Hugo Moura, Marcos Bruno Cunha e Tamires Rodrigues. Todos eles apresentam trabalhos muito ruins porque absolutamente presos em marcas sem vida. A peça fica em cartaz até dia 20 de novembro no Espaço da Cia. Armazém, na Fundição Progresso, na Lapa, zona central do Rio de Janeiro.

10 anos de carreira de Jô Bilac
No Café 12:45, Cláudio (Marcos Bruno Cunha), Laura (Ágata Castanheda) e Marcela (Tamires Rodrigues e Gabriela Chalub) estão esperando alguém. Eles não se conhecem, mas de algum modo se identificam por serem todos mal recebidos por Dodô (Hugo Moura), o garçom do lugar. Cláudio marcou um primeiro encontro com uma mulher que ele não conhece, usando uma rosa vermelha para se identificar. A princípio, ele pensa que essa pessoa é Laura, mas ela está à espera de alguém que usa muletas. Já Marcela está aguardando sua irmã gêmea.

Dodô não espera qualquer pessoa. E o modo como ele deixa isso claro aos clientes na hora de atendê-los causa, no grupo, certa indignação que os une. De repente, ouve-se o barulho de um acidente do lado de fora e Dodô traz a notícia: alguém acaba de morrer atropelado e não é possível, naquele momento, identificar a vítima.

Nessa dramaturgia de Jô Bilac, que em conteúdo lembra "All that fall", de Samuel Beckett, o momento em que aconteceu a tragédia do lado de fora do Café congela no ar. Por três vezes mais além da primeira, a história voltará a esse ponto e o espectador terá a oportunidade de perceber de maneiras diferentes os personagens.

O texto de "Alguém acaba de morrer lá fora" foi escrito por Jô Bilac em 2006, ano considerado por ele como o de sua estreia como dramaturgo por causa da encenação (dirigida por ele mesmo) de "Bruxarias urbanas". Sua primeira peça foi "Sangue na caixa de areia", escrita três anos antes. Até agora, somando seus textos maiores a esquetes que se tornaram espetáculos ao lado do trabalho de outros autores e a dramaturgias organizadas a partir de coletâneas de cenas originais suas, tem-se um total de 31 (trinta e um!) textos encenados seus. Essa peça em específico foi produzida pela primeira vez em 2012 em montagem dirigida por Pedro Neschling e em 2014 em outra dirigida por Iara Roccha.

Jogo pelo jogo
Os méritos da direção de Paulo Verlings nessa montagem de "Alguém acaba de morrer lá fora" se concentram em dois aspectos: o uso do palco e o modo como a personagem Marcela acontece na cena. Quanto ao primeiro, cabe elogiar o jeito como a direção reconstrói a circularidade do texto no espetáculo. Ao longo da peça, a cena gira, oferecendo ao público quatro pontos diferentes de percepção. Quanto ao segundo, a personagem Marcela é interpretada ao mesmo tempo por duas atrizes, o que cria uma abordagem humana ao conflito que ela vivenciará na narrativa, além de ótimas possibilidade de jogo na defesa do ritmo do espetáculo.

No entanto, o trabalho de Verlings sofre com um conjunto de interpretações tão ruim. Ágata Castanheda (Laura), Gabriela Chalub (Marcela), Hugo Moura (Dodô), Marcos Bruno Cunha (Cláudio) e Tamires Rodrigues (Marcela) apresentam, ao longo de toda a encenação, um roteiro de expressões corporais e faciais que não deixa ver qualquer reação. Em outras palavras, é como se os intérpretes não se ouvissem entre si, preocupados apenas em executar as marcas e dizer o texto pontualmente. Em uma comédia cuja narrativa é sobre o valor do ser humano e que é estruturada sobre personagens solitários, essa opção estética não tem justificativa clara. 

Outro fator negativo do todo da encenação diz respeito ao ritmo. O excesso de regularidade com que os atores viabilizam a história elimina a curva dramática que a justaposição dos atos no texto de Jô Bilac revela. A dramaturgia, que de antemão é bastante formal, fica assim ainda mais hermética e, portanto, inanimada. O conteúdo desaparece e, lá pelas tantas, só se vê a estrutura.

O hermetismo que transparece pelas interpretações dos atores também se vê nos figurinos que eles usam. Assinadas por Flávio Souza, as roupas expressam mais uma gramática do que propriamente uma linguagem, auxiliando a produção no seu negativo processo de enrijecimento. "Alguém acaba de morrer lá fora" tem bom cenário de Mina Quental (Ateliê da Glória), iluminação de Thiago e de Fernanda Mantovani e trilha sonora de Marcello H., mas tudo isso sem destaque.

O aniversário de dez anos de carreira de Jô Bilac merece ser melhor comemorado.


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| Ficha Técnica |
Texto: Jô Bilac
Direção: Paulo Verlings
Assistente: Elizabeth Monteiro
Elenco: Ágata Castanheda, Gabriela Chalub, Hugo Moura, Marcos Bruno Cunha e Tamires Rodrigues
Figurino: Flávio Souza
Iluminação: Thiago Mantovani e Fernanda Mantovani
Cenário: Mina Quintal I Ateliê na Glória
Direção Musical: Marcello H
Fotografia artística e Projeto Gráfico: Daniel Barboza
Maquiagem e cabelo para foto de divulgação: Josef Chasilew
Direção de Produção: Sol Miranda
Produção Executiva: Aliny Ulbricht
Realização: Cia Coletivo Encontro e Grupo Emú Produções
Assistente de cenografia: Éllen Rambo
Cenotécnica: Adriano Farias I TS 18 Produções
Preparação Corporal: Rafaela Amado
Assessoria de Imprensa: Duetto Comunicação

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Lista de peças encenadas com texto de Jô Bilac (em ordem alfabética)

1. 2 p/ viagem (com Miguel Thiré e Mateus Solano)

2. A dona do fusca laranja

3. Alguém acaba de morrer lá fora

4. Amanda

5. Arara vermelha (parte componente de "5 x comédia")

6. Beije minha lápide

7. Bette Davis e a máquina de Coca-cola (com Renata Mizhari)

8. Bruxarias urbanas

9. Cachorro!

10. Conselho de classe

11. Cucaracha

12. Delírio e vertigem

13. Desesperadas

14. Enterro dos ossos

15. Flor carnívora

16. Fluxorama

17. Infância, tiros e plumas

18. Kama-Sutra secreto (parte componente da peça "Fatal")

19. Limpe todo o sangue antes que manche o carpete

20. Mamutes

21. Matador de santas

22. Nada menos que muito

23. Nuvens de Iceberg

24. O gato branco

25. Paraíso zona sul

26. Petit monstre

27. Popcorn - Qualquer semelhança não é mera coincidência

28. Rebu

29. Sangue na caixa de areia

30. Savana glacial

31. Serpente verde sabor maçã (parceria com Larissa Câmara)

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