segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Os Saltimbancos Trapalhões (RJ)

Foto: divulgação
Renato Aragão em um dos momentos mais belos do espetáculo


Viva o Ceará!


“Os Saltimbancos Trapalhões” é o musical mais bonito da dupla Charles Möeller e Claudio Botelho desde “O Mágico de Oz”. No entanto, sem desmérito algum, seu maior brilho pertence a Renato Aragão, o protagonista e o homenageado. Realizador de 47 filmes, com mais de 50 anos dedicados à televisão, Didi é a alma da produção que está em cartaz na Grande Sala da Cidade das Artes, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Com um elenco numeroso, um cenário belíssimo e com arranjos musicais que estendem a comemoração dos 70 anos de Chico Buarque, a peça pode até pecar por um excesso de açúcar na dramaturgia e por interpretações sem tanto brilho, mas, mesmo assim, é um espetáculo que vale a pena ser visto.


Atrás da repetição do sucesso estrondoso do filme “O Trapalhão nas Minas do Rei Salomão”, lançado em 1977, Renato Aragão se uniu novamente ao diretor croata Josib Bogoslaw Tanko para a 7a produção em conjunto. Lançado em 1981, o filme “Os Saltimbancos Trapalhões”, o 18o filme do Didi, confirmou as expectativas, sendo ainda hoje a 8a maior bilheteria do cinema brasileiro.



No roteiro, a história começa com a chegada do carro de Didi, Dedé, Mussum (1941-1994) e de Zacarias (1934-1990) ao resto da equipe do Circo Bartholo, que acabou de iniciar acampamento em nova praça. Quem assiste ao filme imediatamente reconhece a penúria em que vivem esses personagens ao vê-los correndo atrás de um rebanho de ovelhas na cena de abertura. Para eles, que se rebelarão e fundarão sua própria companhia, tudo pode virar comida. Enquanto isso, o gordo Barão Bartholo (Paulo Fortes), dono do circo e pai da bailarina Karina (Lucinha Lins), se farta às custas dos seus funcionários. De um modo muito simples, o filme logo anuncia as bases de sua trama: o pobre Didi acredita que poderá conquistar o coração da bela Karina, mas ela está apaixonada pelo acrobata recém chegado Frank Severino (Mario Cardoso), o galã da história. Nesse sentido, em sua genialidade, “Os Saltimbancos Trapalhões” é uma história de amor, mas também de política. Sua origem remonta o conto “Os Músicos de Bremen”, dos Irmãos Grimm, que deu origem ao musical “Os Saltimbancos”, dos italianos Sergio Bardotti e Luis Enríquez, com versões de Chico Buarque, em que um Burro, uma Gata, um Cachorro e uma Galinha se unem em um grupo artístico, expulsam os barões e passam a viver independente dos homens.

O texto de Charles Möeller para essa montagem alarga a história. A peça “Os Saltimbancos Trapalhões” começa com uma sequência negativamente complicada em que, em uma época distante, um arqueólogo alemão encontra o conto dos Irmãos Grimm. Décadas depois, a descoberta, passando de mão em mão, chega a um cego que, enfim, entrega-a para Didi que, por sua vez, leva-o para o grupo que resolve montar, a partir do conto, um musical como parte das atrações do Circo do Barão. Esse musical dentro do circo, no entanto, faz muito sucesso e o grupo resolve se desvincular do Barão (Roberto Guilherme), contra suas injustiças. Em paralelo, há a história da falsa cartomante Zorastra (Ada Chaseliov) que obriga a neta Ana (Livian Aragão) a se vestir como um homem para que, através de um casamento promissor da/o jovem, possa sair da vida circense. Na maior parte das cenas, os diálogos são longos e explicativos, dando conta de um enredo que se tornou complicado pela má adaptação. Felizmente, os investimentos de Charles Möeller, na criação dos números de dança e de canto, são igualmente grandiosos. São por esses momentos que o público realmente espera e não há decepção ainda que possa ser apontado o substancial excesso de cores em detrimento da miséria em que vivem esses personagens. Os quadros “Hollywood”, “Todos juntos” e “Piruetas” enchem os olhos como no bom espetáculo musical americano, sendo a cena de “Meu caro barão” um dos grandes destaques.

Com 35 pessoas em cena, “Os Saltimbancos Trapalhões” conta com as contribuições um tanto quanto apagadas de Giselle Prattes (Karina), de Livian Aragão (Ana/João) e de Nicola Lama (Assis Satã), mas com os bons trabalhos de João Gabriel Vasconcellos (Frank Severino) e de Ada Chaseliov (Zorastra). Depois das participações afetivas de Roberto Guilherme, Tadeu Mello, Dedé Santana e, claro, de Renato Aragão, o grande destaque é de Adriana Garambone (Tigrana) que dá vida para várias cenas da peça em excelentes momentos de interpretação. Os artistas circenses que integram o conjunto também, em geral, ajudam a elevar os níveis de beleza dos quadros da montagem, construindo um todo vibrante que compõe a obra de forma potente e com bom ritmo principalmente na evolução das coreografias criativas e bastante meritosas de Alonso Barros.

Com direção musical de Claudio Botelho e desenho de som de Marcelo Claret, a produção apresenta altíssima qualidade musical não só no que diz respeito aos arranjos de Marcelo Castro, mas também pela afinação do elenco. Além disso, com um visual positivamente lúdico de Beto Carramanhos, o espetáculo tem um dos cenários (Rogério Falcão) mais belos da programação teatral carioca, acompanhado de um vibrante desenho de figurinos (Luciana Buarque) e de iluminação (Paulo César de Medeiros), essa última conseguindo a façanha de reduzir e de aumentar o palco da Cidade das Artes conforme se desenrola a narrativa.

Com uma carreira até aqui gloriosa, Charles Möeller e Claudio Botelho têm provado que sabem render homenagens como poucos. É bonito ver como o grande espetáculo “Os Saltimbancos Trapalhões” se suspende para respeitar o ritmo de Renato Aragão, a simplicidade de seu personagem Didi, suas piadas ingênuas e sua terna emoção. Os valores estéticos da produção como um todo são muitos, mas o público sabe que eles são apenas um brinde. Ao lado de Roberto Guilherme e de Dedé, é Didi o grande e verdadeiro espetáculo. Viva o Ceará!


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FICHA TECNICA

CHARLES MÖELLER
Texto

CHICO BUARQUE, LUIS BACALOV, SERGIO BARDOTTI
Música e Letras

MARCELO CASTRO
Arranjos e Regência

ALONSO BARROS
Coreografia

ROGÉRIO FALCÃO
Cenário

LUCIANA BUARQUE
Figurinos

MARCELO CLARET
Design de Som

PAULO CESAR MEDEIROS
Iluminação

BETO CARRAMANHOS
Visagismo

MARCELA ALTBERG
Casting

EDSON BREGOLATO
Direção de Produção

EDSON MENDONÇA/ ALESSANDRA AZEVEDO
Produção Executiva

TINA SALLES
Coordenação Artística

CLAUDIO BOTELHO
Direção Musical

CHARLES MÖELLER
Direção

ELENCO
Renato Aragão, Dedé Santana, Adriana Garambone, Giselle Prattes, Roberto Guilherme, João Gabriel Vasconcellos, Tadeu Mello, Ada Chaseliov, Nicola Lama, Livian Aragão, Nicolas Prattes, Diego Luri, Cristiana Pompeo, Marcel Octavio, Andrei Lamberg, Augusto Arcanjo, Camilla Marotti, Gabi Porto, Lais Lenci, Zago Mirabelli, Erika Henriques, Jessica Gardolin, Jonatan Karp, Kostya Biriuk, Olavo Rocha, Pauline Hachette, Rafael Abreu e Yulia Suslova.

MÚSICOS
Marcelo Castro, Anderson Pequeno, Marcio Romano, Matheus Moraes, Omar Cavalheiro, Whatson Cardozo, Zaida Valentim

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